Entrevista especial com Valdenir Munduruku
“Queríamos que o ministro Gilberto Carvalho viesse aqui
no canteiro para entregarmos nas mãos dele as nossas reivindicações,
para que ele nos respondesse diretamente quais ações são possíveis e
quais não são, mas infelizmente parece que o diálogo com ele não será
possível”, diz liderança munduruku.
Confira a entrevista.
Foto: www.xinguvivo.org.br |
“Esse mandato de reintegração de posse é baseado em informações que
não são verdadeiras, ou seja, de que estamos impedindo os trabalhadores
de sair e de entrar no canteiro de obras, dizendo que estamos depredando
o patrimônio da empresa. Ficou provado, nesses dias de diálogos, que
isso não é verdadeiro”. A declaração é de Valdenir Munduruku, liderança indígena da Aldeia Teles Pires,
na entrevista a seguir, concedida por telefone, após os indígenas terem
recebido a notícia de que o Tribunal Regional Federal da 1a Região – TRF1 deferiu, na noite do dia 08-05-2013, a reintegração de posse do canteiro de obras da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, na região de Altamira, no Pará.
De acordo com Valdenir Munduruku, a liminar judicial
foi recebida com “surpresa” horas depois de eles terem enviado um
documento ao governo brasileiro, solicitando tempo para responder à
carta recebida na tarde de ontem (08-05-2013). “Ficamos surpresos com a
decisão, porque até o momento estávamos negociando e dialogando com o governo”, disse Valdenir Munduruku, à IHU On-Line, por telefone.
Há uma semana, 160 indígenas de seis etnias ocuparam o canteiro de obras da Usina Hidrelétrica de Belo Monte e reivindicaram a presença do ministro Gilberto Carvalho para negociar seus direitos. Sem possibilidade de negociação, Valdenir Munduruku
lamenta: “Essa decisão do governo federal, de não atender a nossa
reivindicação e enviar a reintegração de posse, mostra mais uma vez que
não há interesse em resolver os problemas da questão indígena. Nós vamos
continuar essa luta, porque somos impactados por essas obras e temos de
lutar pelos nossos direitos”.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Como os indígenas que estão acampados nos
canteiros de obra de Belo Monte receberam a notícia de que a Justiça
determinou a reintegração de posse do canteiro de obra de Belo Monte?
Foto: www.telmadmonteiro.blogspot.com.br |
Valdenir Munduruku – Ficamos surpresos com a
decisão, porque até o momento estávamos negociando e dialogando com o
governo. Recebemos uma carta do governo na tarde de ontem (-05-2013), e
pedimos um tempo para respondê-la, mas ontem à noite recebemos a notícia
da reintegração de posse. Ainda estamos acampados no canteiro de obras,
de forma pacífica, aguardando o oficial de justiça apresentar o
mandato.
IHU On-Line – Qual era o conteúdo da carta enviada pelo governo federal?
Valdenir Munduruku – A carta dizia que o governo
estava disposto a dialogar, agendar uma reunião com as comunidades e
realizar consultas prévias, desde que nós desocupássemos o canteiro de
obras. Ficou muito claro que se tratava de uma carta que não respondia
às nossas reivindicações.
IHU On-Line – Como o Ministério Público Federal se manifestou diante do mandato de reintegração de posse do canteiro?
Valdenir Munduruku – O Ministério
Público está tentando reverter a situação, até porque esse mandato de
reintegração de posse é baseado em informações que não são verdadeiras,
ou seja, de que estamos impedindo os trabalhadores de sair e de entrar
no canteiro de obras, dizendo que estamos depredando o patrimônio da
empresa. Ficou provado, nesses dias de diálogos, que isso não é
verdadeiro. Ficamos acampados por sete dias de forma pacífica. Queríamos
que o ministro Gilberto Carvalho
viesse aqui no canteiro para entregarmos nas mãos dele as nossas
reivindicações, para que ele nos respondesse diretamente quais ações são
possíveis e quais não são, mas infelizmente parece que o diálogo com
ele não será possível. Resta-nos aguardar para ver o que irá acontecer
daqui em diante.
IHU On-Line – Como os trabalhadores dos canteiros de obra reagiram às ocupações?
Valdenir Munduruku – Os trabalhadores apoiam
totalmente a nossa luta, porque eles entendem o nosso sofrimento e os
nossos direitos. Vários deles deram depoimentos favoráveis à nossa
causa. Eles também já realizaram algumas manifestações reivindicando
seus direitos que não estão sendo cumpridos. Estamos tendo um
relacionamento bom com os trabalhadores e em nenhum momento houve
conflito entre nós.
IHU On-Line – Segundo notícias da imprensa, foi autorizado o
uso de força policial para retirar os indígenas dos acampamentos caso
haja resistência. Como a polícia tem atuado durante essa semana de
manifestações?
Valdenir Munduruku – Os policiais da Força Nacional
de Segurança e da Polícia Militar estão aqui na região, e nesse momento
vários deles estão no canteiro de obras. Porém, não houve nenhum
conflito.
IHU On-Line – Que novas ações pretendem realizar a partir de agora, diante do mandato de reintegração de posse do canteiro?
Valdenir Munduruku – Num primeiro momento iremos aguardar a ordem judicial de reintegração de posse e, assim que a recebermos, vamos sair do canteiro e ver novas maneiras de lutar pelos nossos direitos.
IHU On-Line – Qual seu sentimento diante de mais uma tentativa de diálogo frustrada com o governo brasileiro?
Valdenir Munduruku – Eu sinto muito por o governo
brasileiro demonstrar que não tem interesse em respeitar os direitos
indígenas. Nós estamos aqui acampados reivindicando nada mais do que os
nossos direitos. Não estamos aqui para pedir barco, motor, carro.
Estamos reivindicando aquilo que é nosso, que está na lei. Essa decisão
do governo federal, de não atender a nossa reivindicação e enviar a
reintegração de posse, mostra mais uma vez que não há interesse em
resolver os problemas da questão indígena.
Nós vamos continuar essa luta, porque somos impactados por essas obras e
temos de lutar pelos nossos direitos, para mostrar para a sociedade que
nem tudo acontece como o governo diz, quando fala que os direitos
indígenas estão sendo respeitados, e para fazer ver que e as comunidades
não estão sendo bem atendidas.
IHU On-Line – Como está o projeto hidrelétrico do complexo Teles Pires? Houve alguma negociação com vocês?
Valdenir Munduruku – Os técnicos estão realizando os estudos, mas não nos consultaram. A Força Nacional
está lá para garantir a segurança dos pesquisadores, invadindo o nosso
território. Isso nos deixa muito revoltados. Já vimos que o governo é
capaz de tudo quando quer realizar os seus empreendimentos e, se
precisar, manda matar, como aconteceu na aldeia em que eu vivo, a aldeia
Teles Pires, na ocasião da Operação Eldorado, quando um indígena foi assassinado. Nós não confiamos na Força Nacional
nem na Polícia Federal. Claro que existem pessoas boas e sinceras, mas
tantos outros não querem saber o que vai acontecer; querem apenas
cumprir as ordens do governo.
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