A fragilidade do governo federal pós-votação do Código Florestal fez ressurgir no Congresso Nacional uma força que ultrapassa as colorações partidárias. Nem governo, nem oposição, o que contou pontos decisivos para a aprovação da lei ambiental e para a substituição do kit anti-homofobia foram as forças de articulação das bancadas ruralista e evangélica. Com as alas suprapartidárias fortalecidas, dizem especialistas, podemos esperar um Congresso conservador para temas como o confisco de terras utilizadas para trabalho escravo, a descriminalização do aborto, além dos pontos mais polêmicos discutidos pela reforma política, como a cota para mulheres no parlamento.
Na fila da Câmara e do Senado para votação, diversos temas entram em conflito direto com as posições mais conservadoras do Congresso. Outros têm brechas abertas para aprovação, segundo as próprias bancadas consideradas conservadoras, como a criminalização da homofobia e a criação da Comissão da Verdade, para apurar violações de direitos humanos durante o regime militar (1964-1985). Já para a descriminalização de drogas leves, quaisquer alterações que flexibilizem a interrupção da gravidez e ampliações do direito de adoção para casais homossexuais, o caminho é tortuoso. “A fragilidade momentânea do governo revelou um poder que as bancadas tinham perdido em função das amarras impostas pela fidelidade partidária. Por isso, conseguiram segurar temas conservadores, como o kit anti-homofobia”, opina Antônio Queiroz, analista político do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar.
Para os cientistas políticos, outro motivo imediato da força conservadora é o fato de o próprio governo ter decidido pautar temas polêmicos no início do mandato. Em grande parte, eles foram evitados pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no ano passado, como a criação da Comissão da Verdade. “Até órgãos internacionais já criticam o Brasil por não ter feito isso. Lula saiu pela tangente, para evitar um embate final. Ele evitou os temas polêmicas e tudo isso caiu no colo da Dilma”, explica o cientista político David Fleischer, da Universidade de Brasília.
Bancadas maiores
Tido como pulso da força conservadora no Congresso, bancadas como a ruralista e a evangélica cresceram em relação à legislatura passada. Entre 2007 e 2010, quando contavam com 117 e 43 parlamentares, respectivamente, as duas bancadas conseguiram travar temas como a PEC do trabalho escravo, a profissionalização da prostituição e alteraram substancialmente projetos como o próprio Código Florestal e a nova Lei de Adoção.
Desde a posse dos novos deputados e senadores, em fevereiro, as duas bancadas ficaram ainda mais fortes e hoje somam 186 parlamentares. Para a presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, Manuela D’Ávila (PCdoB-RS), mesmo com o avanço dessas bancadas, o Congresso não pode ser considerado conservador. “Não estamos consolidados entre conservadores e liberais como os norte-americanos. Temos deputados de esquerda com opiniões conservadoras, como a interrupção de gravidez de anencéfalos. São grupos que se organizam em torno de temas de direitos individuais. Acabam sendo conservadores em relação a um tema ou outro, mas não como um todo”, afirma Manuela.
Principal foco de polêmica da última semana, os projetos que visam a ampliar os direitos dos homossexuais não encontram tanta resistência no Congresso. A questão é estabelecer um diálogo que inclua todas as posições, afirma o presidente da Frente Parlamentar Evangélica, o deputado federal João Campos (PSDB-GO). “Não somos contrários à criminalização da homofobia, por exemplo, mas contra o texto atual. Ele fere direitos constitucionais, de livre expressão, e isso tem consequência sobre a inviolabilidade da crença, do pensamento. A partir dele, a polícia poderia fazer apreensões de símbolos religiosos sob o argumento de que seriam homofóbicos, como a Bíblia”, aponta Campos.
FONTE: CORREIO BRAZILIENSE
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