Estudo de funcionários mostra que há remunerações de até R$ 32 mil por mês. Os servidores valem-se de exceções à regra para obterem vencimentos que ultrapassam o teto do funcionalismo, hoje em R$ 26.723
Parte dos servidores do Judiciário engrossa o corpo de políticos, autoridades e funcionários públicos que ganham mais que o teto constitucional, hoje fixado em R$ 26.723,13. Estudos elaborados exatamente por funcionários públicos da Justiça e do Ministério Público encontraram 512 servidores ganhando mais que o subsídio dos ministros do Supremo Tribunal Federal. Os servidores fazem parte do Superior Tribunal de Justiça, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos tribunais regionais federais da 2ª, 3ª e 4ª Região.
No tribunal de Justiça do DF, por exemplo, um analista judiciário ganhou R$ 32.612 em dezembro passado, já descontados os valores referentes a 13º, férias e auxílios. Outros cinco funcionários ganharam cerca de R$ 31 mil naquele mês. Ao contrário do que aconteceu com a auditoria do Tribunal de Contas da União sobre os supersalários do Senado, ao qual o Congresso em Foco teve acesso, desta vez não constam das informações os nomes dos servidores que ganham acima do teto constitucional. No STJ, onde magistrados também ganham acima do teto baseados em normas do Conselho Nacional de Justiça, um assessor chefe ganhou R$ 28.666, em dezembro. Outros quatros assessores receberam mais que o teto, dois deles R$ 28.396, segundo levantamentos da Comissão Pró-Subsídio (CPS) analisados pelo Congresso em Foco. (veja exemplos na lista abaixo)
A Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário e do Ministério Público da União (Fenajufe) não comenta os dados da comissão, por não considerá-los oficiais. A fonte usada pela CPS foram os portais da transparência dos tribunais. Apesar disso, a Feanjufe admite que existem servidores do Judiciário ganhando acima do teto, “menos de 0,5%” dos 120 mil funcionários da categoria, o significa até 600 servidores com renda superior a R$ 26.723.
Os dados da CPS foram apresentados em audiência pública na Câmara no mês passado, na Comissão de Finanças e Tributação, que analisa o projeto de lei 6613/09, que aumenta os salários dos funcionários do Judiciário da União. Na quarta-feira (21), o ministro do Supremo Gilmar Mendes criticou os supersalários do Legislativo e lembrou que os colaboradores do Judiciário precisam de aumento para equipararem seus rendimentos aos colegas dos outros Poderes.
Mendes se reuniu com o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), que ganha pelo menos R$ 62 mil por mês. “Se são tantos os servidores (do Legislativo) que estão ultrapassando o teto (do funcionalismo), há algo de errado nesse contexto”, disse Mendes, de acordo com a Agência Estado. O ministro defendeu que o governo federal, os congressistas e o STF retomem o diálogo para fazer a “equalização salarial” entre as carreiras dos três poderes.
Salários defasados
Para o sindicato da categoria, essa distorção, que atinge 0,5% do total, acaba prejudicando a luta por melhorias salariais. O coordenador da Fenajufe e do Sindicato dos Servidores do Judiciário do MP no Distrito Federal, Cledo Vieira, disse ao Congresso em Foco que 99,5% da categoria está com salários defasados há cinco anos. A afirmação confere com as teses dos representantes da CPS. Um dos coordenadores da comissão, o servidor Rodrigo Walladares, defende que haja um aumento por subsídio para resolver o problema da categoria, ideia para a qual os sindicatos não demonstram entusiasmo. Hoje, o pagamento dos funcionários é formado pelo vencimento básico e uma série de “penduricalhos”.
Cledo Veira destacou que os tribunais pagam supersalários a uma minoria no Judiciário por causa de decisões judiciais. “Por força de decisão judicial é que se permite que aquele servidor receba acima do teto. No caso do Judiciário, menos de 0,5% dos quase 120 mil servidores podem estar nessa situação. Pois a regra é o teto”, disse o coordenador da Fenajufe em mensagem ao site.
Uma outra causa para os megassalários pode ser as funções de chefia em número acima do normal. Levantamento da CPS mostra que, dos 88 mil funcionários na ativa, 64 mil têm cargos em comissão. O valor representa 73% do pessoal em atividade. Na quarta-feira, Gilmar Mendes reconheceu o excesso de cargos comissionados nos tribunais, segundo a Folha.com. Outra causa podem ser as incorporações de funções comissionadas. No ano passado, elas somaram R$ 406 milhões apenas no orçamento de pessoal da Justiça Federal, segundo o Siafi (sistema que registra gastos do governo). O valor representou 8% dos R$ 5,2 bilhões usados para pagar funcionários ativos e aposentados.
Tanto os cargos em comissão como as incorporações entram no cálculo do teto. Entretanto, oCongresso em Foco já localizou magistrados, como em Minas Gerais, que obtiveram decisões judiciais para excluir parte dessas verbas do abatimento por estourarem os R$ 26.723.
Os sindicatos não aprovam o pagamento de supersalários. “Procuramos um salário digno e compatível com a responsabilidade e com as atribuições de todos os servidores”, afirmou Vieira.
Exemplos do grupo de servidores com supersalários
Tribunal | Cargo | Remuneração paradigma | Vantagens pessoais | Cargo em comissão | Auxílios | Salário Bruto | Salário Bruto (sem auxílios) | Acima do teto |
TJDF | Analista Judiciário SC15 (C15) | 11.017,78 | 14.865,61 | 6.729,14 | 670,00 | 33.282,53 | 32.612,53 | 5.889,40 |
TRF-3 | Diretor Secretaria | 11.087,37 | 10.888,38 | 6.729,14 | 910,00 | 29.614,89 | 28.704,89 | 1.981,76 |
STJ | Assessor / chefe / CJ-3 | 11.191,73 | 10.745,39 | 6.729,14 | 670,00 | 29.336,26 | 28.666,26 | 1.943,13 |
STJ | Assessor / chefe / CJ-3 | 11.017,79 | 10.649,04 | 6.729,14 | 670,00 | 29.065,97 | 28.395,97 | 1.672,84 |
STJ | Assessor / chefe / CJ-3 | 11.017,79 | 10.649,04 | 6.729,14 | 670,00 | 29.065,97 | 28.395,97 | 1.672,84 |
TRF-2 | CJ-3 | 10.495,98 | 10.900,55 | 6.729,14 | 630,00 | 28.755,67 | 28.125,67 | 1.402,54 |
TRF-4 | Assessor | 11.017,79 | 10.340,13 | 6.729,14 | 630,00 | 28.717,06 | 28.087,06 | 1.363,93 |
TRF-4 | Assessor | 10.565,56 | 10.522,07 | 6.729,14 | 630,00 | 28.446,77 | 27.816,77 | 1.093,64 |
STJ | Secretário / CJ-3 | 11.156,93 | 9.309,02 | 6.729,14 | 670,00 | 27.865,09 | 27.195,09 | 471,96 |
STJ | Assessor / chefe / CJ-3 | 10.495,99 | 9.592,54 | 6.729,14 | 670,00 | 27.487,67 | 26.817,67 | 94,54 |
TRF-3 | Assessor | 11.087,36 | 8.962,54 | 6.729,14 | 630,00 | 27.409,04 | 26.779,04 | 55,91 |
Fonte: Levantamentos da Comissão Pró-subsídio (CPS), com base nos portais da transparência dos tribunais coletados em dezembro de 2010 (exceção: TRF-3 em maio de 2011), descontados os valores de férias, 13º salários e auxílios
O Tribunal de Justiça do DF disse que nenhum magistrado ou servidor recebe acima do teto. A assessoria do órgão afirmou que as tabelas em seu site não mostram o abate-teto feito em cada salário. Leia a resposta.
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região, no Rio Grande do Sul, informou que os dois funcionários passam do teto porque recebem abono de permanência, um bônus para quem tem direito a se aposentar, mas prefere continuar no trabalho. Uma resolução do CNJ considerou que esse benefício, que é permanente até o funcionário completar 70 anos de idade, não deve compor o cálculo do teto. Leia a resposta.
A reportagem procurou por telefone e correio eletrônico a assessoria do presidente do Supremo e do CNJ, Cézar Peluso, mas não teve nenhum esclarecimento sobre a existência de supersalários para os servidores. Os outros tribunais citados não prestaram informações até o fechamento desta reportagem.
Congresso em foco
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