Em tese, a condenação pelo STF, como a que ocorreu na quinta-feira (8) com Asdrubal Bentes, deveria implicar a perda do mandato de deputado federal. Na prática, porém, isso não é nada automático. Que o diga Natan Donadon, condenado há quase um ano
A condenação pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a três anos, um mês e dez dias de prisão do deputado licenciado Asdrubal Bentes (PMDB-PA) deve demorar para ter um impacto na Câmara. O regimento interno da Casa prevê a perda de mandato do parlamentar que for condenado criminalmente em sentença transitada em julgada. Ou seja, que seja julgada até a última instância (que, no caso, é o Supremo). Como, porém, há mecanismos que ainda permitem recursos protelatórios da decisão, o peemebista não corre o risco de ficar sem seu cargo no curto prazo.
Asdrubal Bentes foi reeleito para mais um mandato de deputado em outubro com 87.681 votos. Mal tomou posse em fevereiro, já se licenciou para assumir a Secretaria de Pesca do Pará. Por 8 votos a 1, Asdrúbal Bentes foi condenado por uma acusação das mais graves: ele teria esterilizado mulheres em troca de votos. Isso mesmo: em retribuição ao apoio eleitoral, encaminhou mulheres para cirurgias de laqueadura de trompas. Agora, porém, Asdrubal Bentes passará a integrar uma bancada sui-generis da Câmara, ao lado de seu colega de partido Natan Donadon (PMDB-RO): a bancada dos condenados. Em outubro, fará um ano que Natan Donadon foi condenado pelo STF a 13 anos, quatro meses e dez dias de prisão em regime inicialmente fechado. Natan permanece solto, e deputado.
O caso de Donadon é um exemplo de como é lento o caminho da decisão judicial à sua aplicação prática. O acórdão da decisão tomada pelo STF contra ele só foi publicado em abril deste ano, seis meses depois da sessão que decidiu pela condenação do peemedebista. O primeiro passo de Donadon depois disso foi entrar com um embargo de declaração questionando a decisão do Supremo. Ao fazer isso, ele ganhou mais tempo de mandato. Seu recurso teve que ser aberto para vista da Procuradoria Geral da República. Em junho, voltou para as mãos da ministra Cármen Lúcia, relatora do caso. E é com ela que o processo ainda se encontra. Enquanto aguarda a decisão de Cármen Lúcia, a Câmara mantém Donadon deputado federal.
Depois que Cármen Lúcia se posicionar, o recurso de Donadon seguirá para análise dos demais colegas. O embargo não questiona diretamente o mérito da decisão. Ou seja, a essa altura Donadon já não questiona mais se deveria ou não ser condenado. Ele pede a eliminação da existência de uma possível obscuridade, omissão ou contradição e, em alguns casos, dúvida, presente no acórdão. Após a manifestação de Cármen Lúcia e da corte, ainda é possível entrar com um agravo regimental.
Asdrubal vai pelo mesmo caminho
O mesmo caminho deve seguir Asdrubal Bentes. O motivo é simples. Enquanto ainda existirem recursos para o Supremo analisar, o caso não transita em julgado. Antes de se esgotar a possibilidade de contestação, a Câmara não tem como ser notificada. Para efeitos políticos, é como se a condenação à prisão de ambos ainda não tivesse acontecido. Na sessão de ontem, o relator da ação penal contra o peemedebista, José Dias Toffoli, defendeu que o peemedebista tivesse os direitos políticos suspensos pelo tempo da condenação.
No entanto, sua sugestão foi derrotada pela maioria. A corrente majoritária no Supremo entendeu que, ao não obedecer a Lei 9.263/96, que trata do planejamento familiar, ele não poderia ter suspensos seus direitos políticos. Na norma, são estabelecidas as formas de como devem acontecer as laqueaduras, que, de acordo com a denúncia do Ministério Público Federal (MPF), foram usadas como moeda para compra de votos na eleição para prefeitura de Marabá em 2004.
Durante o julgamento, ministros se posicionaram por uma decisão clara da corte sobre o tema. Para eles, era necessário que o Supremo estabelecesse as implicações da pena de prisão estabelecida contra o peemedebista. Ficou decidido que, assim que a decisão transitar em julgado, ela será enviada para a Mesa Diretora da Câmara. O órgão, que reúne o presidente, os vices e os secretários da Casa, será responsável pelo destino político de Asdrubal.
Votação secreta
Ocorre, no entanto, que mesmo o término do processo, culminando com a condenação, não leva à perda automática do mandato. O regimento interno da Câmara, no artigo 240 (leia a íntegra), prevê que o deputado que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado terá seu futuro decidido pelos colegas em votação secreta e com a necessidade de maioria absoluta de votos (257, independente do quorum). “O que deve ser feito é a Mesa da Câmara ser avisada para tomar as providências que achar mais cabível. Se quiser abrir processo, se quiser arquivar, é o direito do Legislativo”, disse o presidente do STF, Cezar Peluso, durante a sessão de ontem.
O parágrafo primeiro do mesmo artigo diz que a ampla defesa será assegurada ao deputado que sofrer condenação criminal sem possibilidade de novos recursos. A expectativa na Casa, porém, é que ocorra o mesmo rito da confusão adotado após uma decisão do STF com relação aos suplentes.
Assim que a Mesa for notificada, a decisão é enviada ao corregedor da Câmara, deputado Eduardo da Fonte (PP-PE). Ele vai abrir tempo de defesa para o parlamentar. No caso de Asdrubal, que está licenciado, o prazo só passaria a contar quando ele reassumisse o mandato. Após ter todos os elementos, o corregedor faria um relatório pedindo ou não a cassação do colega. Caso entenda que o peemedebista deve perder o mandato, seu parecer iria a voto dos colegas. “A Constituição prevê que somente o Legislativo pode cassar o mandato em casos de condenação criminal”, disse o ministro Carlos Ayres Britto.
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