Acorda, Policial e Bombeiro Militar!


O verdadeiro desafio não é inserir uma idéia nova na mente militar, mas sim expelir a idéia antiga" (Lidell Hart)
Um verdadeiro amigo desabafa-se livremente, aconselha com justiça, ajuda prontamente, aventura-se com ousadia, aceita tudo com paciência, defende com coragem e continua amigo para sempre. William Penn.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

LUIZ EDUARDO SOARES - VAMOS CONVERSAR SOBRE POLÍCIA?

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Há 30 anos peço um tempo no final das reuniões realizadas no âmbito dos movimentos, dos partidos e das associações, para compartilhar uma pergunta e introduzir um novo tema na pauta: Que modelo de polícia devemos propor para a sociedade brasileira que se democratiza e luta por justiça? Qual seria o modelo menos problemático, o mais adequado, de nosso ponto de vista, nós que defendemos os direitos humanos? Qual modelo facilitaria o controle externo, a transparência, o respeito aos direitos, inclusive dos policiais, que são trabalhadores e cidadãos?

Meus amigos e minhas amigas, parceiras da longa travessia, respondem: "Fica pra próxima. Não há tempo agora”. Na próxima, levanto o braço e cobro a promessa. "Fica pra depois, companheiro, temos coisas mais importantes e urgentes". No final, volto a cobrar. "Hoje não, companheiro". Há sempre outros assuntos mais importantes e urgentes. Tudo bem. É verdade. Há tanta coisa mais importante do que polícia, até mesmo para a segurança pública, até mesmo para os policiais. Concordo. Vamos em frente. Fica pra próxima.

E assim passaram-se 30 anos. Careca, velho, com menos energia do que antes, cá estou, no final da sala, no final da fila, erguendo a mão, pedindo o favor aos parceiros de caminhada, agora tão mais jovens do que eu: sei que há muita coisa mais importante, inclusive para a segurança, mas em algum momento precisamos falar sobre polícia. Vocês aceitam discutir este tema? "Na próxima reunião, companheiro, fica pra próxima".

E assim, as esquerdas e as forças democráticas, os movimentos sociais, as entidades da sociedade civil e os partidos políticos que se querem transformadores jamais apresentaram ao país uma proposta completa e realista para as polícias. Denunciaram sim, sempre, e com toda razão, as violações. Propostas objetivas para reforma do modelo policial, nunca formularam, ainda que alguns indivíduos --bravo !-- o tenham feito. Os conservadores não precisam apresentar nada. Sua proposta está aí nas ruas, liquidando gerações futuras, massacrando jovens negros nas periferias e envolvendo policiais que morrem à tôa na guerra fratricida de pobres contra pobres, com o beneplácito do Estado, o patrocínio das elites e a benção da sociedade.  

Daqui a alguns anos, imagino que haverá alguém no fundo da sala, onde eu costumava sentar-me. Alguém que sequer me conheceu levantará a mão: Vamos conversar sobre polícia? Mas talvez não seja preciso. Talvez o futuro liberte-se desse passado de omissão e silêncio, fruto de preconceitos e mal-entendidos. Talvez as pessoas mais sensíveis à questão dos direitos, às lutas anti-racistas, anti-homofóbicas, anti-misóginas, talvez os democratas se convençam de que, mesmo havendo temas tão mais importantes, inclusive para a segurança pública, é absolutamente injustificável amaldiçoar um deles: polícia.

Dê uma chance a meu argumento e participe do debate virtual em curso na plataforma mudamos.org.


Luiz Eduardo Soares é antropólogo, escritor, dramaturgo e professor de filosofia política da UERJ. Foi secretário nacional de segurança pública e coordena curso sobre segurança pública na Universidade Estácio de Sá. Seu livro mais recente é “Rio de Janeiro; histórias de vida e morte" (Companhia das Letras, 2015).

Texto originalmente publicado no justificando.com

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