Por Marina Rossi
Dossiê foi entregue à Comissão Interamericana de Direitos Humanos nesta segunda-feira
São Paulo
O Comitê de Mães e Pais em Luta, grupo que reúne pais apoiadores dos secundaristas contrários à reorganização escolar do governo Alckmin, foi à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) denunciar as violações cometidas pela Polícia Militar contra os estudantes nos últimos dois meses no Estado de São Paulo. A denúncia, dirigida à secretaria de Segurança Pública do Estado, foi acompanhada de um dossiê contendo dezenas de violações aos direitos humanos cometidas pela PM. Desde outubro, quando a reorganização escolar foi anunciada, e os secundaristas começaram a se manifestar, mais de 100 estudantes foram detidos em todo o Estado.
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O documento é assinado por diversas entidades, entre elas, o Núcleo de Direitos Humanos e o Núcleo de Situação Carcerária, ambos da Defensoria Pública. Além da denúncia, os signatários pedem uma audiência temática com a CIDH para que os estudantes possam expor a repressão da PM, que, segundo o documento, age contra o direito à manifestação. Se o pedido for aceito, a audiência deve ocorrer por volta do mês de abril do ano que vem em Washington, nos Estados Unidos.
Dentre as denúncias contidas no dossiê, estão o caso de uma mãe de aluno agredida com cassetete em frente à escola Fernão Dias, na zona oeste da capital paulista, o sucessivo uso de spray de pimenta e bombas de efeito moral para conter os alunos e as diversas tentativas de tortura psicológica por meio de ameaças aos estudantes e professores. Constam no documento também alguns flagrantes de policiais agindo com uma farda onde não constava a identificação – prática comum nas ações de repressão da PM – as dezenas de detenções de alunos e até o caso de um policial que disparou tiros em direção à escola Joaquim Adolfo, na zona sul. Todas as denúncias são acompanhadas de fotos, vídeos e links para as notícias, veiculadas na imprensa.
Luis Braga, um dos pais que fazem parte do Comitê, diz que a ideia de apelar para um órgão internacional surgiu pela ausência do Estado brasileiro na hora de apurar as violações. "Percebemos que não tem sido tomada atitudes em âmbito nacional para coibir esses abusos da polícia", diz. "No Paraná, onde professores foram agredidos pela PM no primeiro semestre, as apurações dos abusos não avançaram. As ocorrências de violência nas manifestações de junho de 2013 até agora não foram apuradas também."
Ele diz que o objetivo da entrega das denúncias é não somente a apuração dos fatos mas também a coibição de novas violações. "É como se a gente ficasse constrangido em pedir isso num momento em que a polícia pratica violências muito maiores", diz. "Parece que eu tenho que agradecer à PM por não ter sido muito pior com o meu filho. Ele foi só enforcado, e ficou com umas escoriações, mas poderia ter levado um tiro. Estamos falando de uma polícia que mata." O filho de Braga, Francisco, de 16 anos, foi detido no último dia 3, data que marcou uma nova fase da reorganização escolar de Alckmin, protagonizada pela violência e repressão da polícia às manifestações dos estudantes.
A representação também pede que as manifestações realizadas por crianças e adolescentes "sejam acompanhadas por órgãos específicos que garantam a proteção integral em conformidade com o previsto na Convenção Americana de Direitos Humanos e na Convenção Internacional sobre os Direitos das Crianças." E que "não haja atuação da Polícia Militar em manifestações e/ou qualquer tipo de monitoramento ou controle, inclusive 'ronda escolar', de caráter militar em estabelecimentos educacionais."
Uma outra questão levantada pelo documento é a Lei do Desacato. Especificada no Código Penal, pode punir com detenção de até dois anos quem desacatar funcionário público "no exercício da função ou em razão dela." O documento pede a extinção dessa lei, e lembra que o Brasil é um dos poucos países que ainda prevê o desacato na legislação criminal. O pedido retoma um encaminhamento feito pela Defensoria Pública em 2012 e reforçado neste ano, que pedia à CIDH a extinção dessa lei.
No final da tarde desta segunda-feira, haverá uma manifestação dos estudantes em São Paulo, convocada pelo Comando das Escolas, coletivo de secundaristas que participaram das ocupações pelo Estado. No auge do movimento, no final de novembro, 200 escolas chegaram a ser ocupadas. No último dia 5, Geraldo Alckmin anunciou a suspensão do plano da reorganização escolar para este ano, mas, ainda assim, os estudantes permaneceram mobilizados. Argumentavam que não tinham nenhuma garantia de que o governador cumpriria sua palavra.
Na semana passada, a Justiça acatou o pedido de liminar expedido pelo Ministério Público e a Defensoria Pública pedindo a suspensão do plano que fecharia ao menos 92 escolas no ano que vem. Com isso, as escolas foram, aos poucos, sendo desocupadas. A data prevista para o início da reposição das aulas perdidas ao longo das ocupações é 15 de janeiro.
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