Generalizada e institucionalizada desde a Ditadura Militar, a prática de violência nas prisões brasileiras conta com a cumplicidade e omissão dos agentes públicos e das autoridades. É isso que uma comissão da ONU deverá constatar, brevemente, em visita ao Brasil – um vexame.
Por Lúcia Rodrigues
No próximo mês uma delegação da ONU virá ao país para verificar o que acontece atrás das grades das prisões brasileiras. O cenário que os representantes do Subcomitê para a Prevenção da Tortura, da Organização das Nações Unidas, irão encontrar é macabro. A tortura é praticada sistematicamente por policiais e agentes penitenciários em presídios, delegacias, centros de detenção provisórios e unidades socioeducativas destinadas a adolescentes. Está disseminada de norte a sul e de leste a oeste do país. Apesar disso, nenhum torturador está preso no Brasil. A tortura conta com a anuência do sistema judiciário.
Caros Amigos fez um raio X da realidade intramuros das unidades prisionais nas cinco regiões do país e antecipa ao leitor da Revista o que os técnicos das Nações Unidas só vão conferir em setembro, quando visitarem os estabelecimentos brasileiros. Para compreender porque os direitos básicos dos presidiários são vilipendiados diuturnamente por agentes do Estado, a reportagem entrevistou juízes, defensores públicos, ativistas de entidades e organizações de defesa dos direitos humanos, pesquisadores, parentes e vítimas da tortura. O resultado é surpreendente.
Os relatos de desrespeito e violação aos direitos humanos são estarrecedores. Presos pendurados pelo pênis, seviciados com cabos de vassoura no ânus, obrigados a rolar em fezes de cachorro, choques elétricos, sufocamentos com sacos plásticos, espancamentos com pedaços de madeira, canos de ferro, cassetetes. Detentas que sofrem abusos sexuais. A lista das práticas empregadas por torturadores contra presidiários é longa.
Mas nenhum maltrato físico precisaria ser aplicado contra os prisioneiros, para que o Brasil figurasse no ranking dos países que torturam. A superlotação do sistema carcerário, por si só, já constitui uma forma de tortura, segundo tratados internacionais de direitos humanos. O Departamento de Polícia Judiciária de Vila Velha, Espírito Santo, chegou a abrigar mais de 300 presos onde cabiam 36. Dados do Depen, o Departamento Penitenciário Nacional, do Ministério da Justiça, apontam que quase 500 mil pessoas estavam presas em 2010. Para a juíza da 16ª Vara Criminal de São Paulo, Kenarik Boujikian Felippe, cofundadora da Associação dos Juízes para a Democracia (AJD), a visita dos técnicos da ONU ao Brasil é importante porque joga luz sobre as violações aos direitos humanos que são cometidas diariamente no sistema prisional brasileiro. A impunidade é um dos principais fatores que contribuem para a perpetuação da tortura no país.
Juíza criminal há 22 anos, Kenarik afirma que não conhece nenhum agente do Estado que tenha sido preso por ter torturado alguém. Até hoje, ela só julgou um único crime de tortura. “O número de processos que trata desse tipo de crime é reduzidíssimo.” Ela conta que os juízes não consideram a tortura um crime grave. “O sistema de Justiça acaba corroborando com a tortura por sua omissão”, frisa
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