Bancada da bala quer revogar o Estatuto do Desarmamento, mesmo com inúmeras evidências de que a proliferação de armas de fogo faz aumentar os homicídios.
Na Câmara dos Deputados está se urdindo o maior atentado contra a vida nunca antes visto na história deste país. Querem revogar o Estatuto do Desarmamento (ED) e permitir que a população ande armada. Isto está para acontecer nessa quarta-feira (17/12/2014). Uma comissão especial da Câmara foi montada em sua maior parte por deputados financiados pela indústria armamentista, que não fazem política olhando as evidências empíricas e o bem-estar da população, mas apenas o lucro privado. Segundo a aberração que querem aprovar, cada cidadão teria direito a portar nove armas de fogo e adquirir 5.400 cartuchos de munição por ano.
Há inúmeras evidências nacionais e internacionais de que a proliferação de armas de fogo nas cidades faz aumentar barbaramente os homicídios, mas não tem efeito para diminuir os crimes econômicos (roubos, furtos, etc.). Aliás, alguns importantes acadêmicos, como o Prof.Donohue, da Universidade de Stanford, e colaboradores concluem inclusive que: “A totalidade das evidências acerca dos melhores modelos estatísticos sugerem que o direito a portar arma de fogo é associado a uma substancialmente maior taxa de roubos, furtos, estupros e homicídios”.
No Brasil, três teses de doutorado apresentaram fortes evidências de que mais armas causam mais crimes, sendo as mesmas defendidas nos mais importantes departamentos de economia do país: na PUC-Rio, de minha autoria; na EPGE-FGV, produzida pelo Gabriel Hartung; e na USP, defendida pelo Marcelo Justus.
Em outro artigo, o Prof. João Manoel Pinho de Mello, do Insper, e eu mostramos fortes evidências que o ED salvou milhares de vidas. Adicionalmente, o Danilo Santa Cruz Coelho e eu publicamos num livro do IPEA o mapa das armas de fogo no Brasil e mostramos que as microrregiões com mais armas possuem taxas de homicídio 7,4 vezes maiores do que aquelas localidades com menos armas.
Sem enveredar em modelos causais mais complexos, os dados básicos já sugerem o papel crucial que o ED desempenhou para interromper a escalada dos homicídios no Brasil. Entre 1980 e 2003 (ano da sanção do ED), o número de homicídios por arma de fogo aumentou de 6.104, para 36.576, em 2003, um aumento médio de 8,36% a cada ano. Já em 2013 o número de homicídio chegou a 38.578, um aumento anual de 0,53% ao ano, no período pós-estatuto. Ou seja, o crescimento médio anual de pessoas assassinadas por arma de fogo antes do estatuto era mais de 15 vezes maior do que o observado após o estatuto. Segundo extrapolações feitas pelo Prof. Gláucio Soares, do IESP/UERJ e por mim, se a trajetória de mortes por armas de fogo aumentasse na mesma velocidade que vinha antes do estatuto, mais 121 mil pessoas seriam mortas por arma de fogo. O ED foi fundamental para quebrar esta trágica trajetória.
Se essa aberração em gestação na Câmara dos Deputados for aprovada, será mais uma marca na já tão desgastada imagem do nosso parlamento, ao custo de milhares de vidas.
Créditos da foto: EBC
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