Estamos diante de limites da tensão política extraordinários. E quando o extraordinário acontece as receitas da rotina já não são eficazes.
por: Saul Leblon
Estamos a 10 dias do início da Copa do mundo.
A violência na rua emerge como a derradeira aposta de quem, sucessivamente, ancorou o seu futuro no julgamento da AP 470, na explosão da inflação, no apagão das hidrelétricas, no abismo fiscal e, ainda há pouco, na hecatombe decorrente da redução da liquidez nos EUA.
Cada uma dessas alternativas, mesmo sem deixar de impor constrangimentos objetivos ao país e ao governo, mostrou-se incapaz de destruir o contrapeso de acertos e conquistas acumulados ao longo dos últimos 12 anos.
A irrupção de protestos em plena Copa do mundo tornou-se assim a nova bala de prata acalentada por aqueles que, corretamente, ressentem-se de um amalgama capaz de injetar torque e dinamismo ao acerto de contas que buscam contra a agenda progressista brasileira.
Não se espere indulgência ou trégua a partir dessa avaliação.
Está em curso o vale tudo para mobilizar uma classe média eterna aspirante a elite, ademais de segmentos que consideram indiferente ter na chefia da nação Dilma, Aécio ou Campos.
Juntos eles compõem o novo rosto da velha agenda conservadora.
Sugestiva reportagem do Estadão neste domingo anuncia --após ‘exaustiva’ consulta a 16 membros do agrupamento-- que os black blocs buscam uma parceria com os não menos carbonaros integrantes do PCC para tocar fogo nos grandes centros urbanos durante a Copa.
Mobilizações de massa não são a primeira escolha de elites mais afeitas a golpes e arranjos de cúpula.
Seu medo atávico às ruas remonta às revoluções burguesas do século XVIII, sendo a contrarrevolução francesa um exemplo clássico do empenho em capturar o poder para a segurança de um diretório armado, se preciso.
As reticências empalidecem, no entanto, em momentos da história em que a rua é o que de mais palpável se apresenta ao seu interesse em uma correlação de forças que ameaça escapar definitivamente ao controle.
A campanha do PT em 2014 não pode hesitar diante dessa mistura de esgotamento e vale tudo.
Se o conservadorismo se inclina às ruas , a resposta progressista não pode se reduzir à importante, mas insuficiente agregação de minutos a sua grade no horário eleitoral gratuito.
A representação da sociedade no atual sistema político –a exemplo de seu mosaico de mídia-- já não expressa o aggiornamento verificado no mercado de massa e na correlação de forças nos últimos anos.
É justamente a urgência dessas atualizações institucionais que a agenda petista deve incorporar à campanha eleitoral de 2014.
Não como recurso ornamental de um cuore publicitário, ou mero fecho exclamativo do discurso.
Não se trata de criar uma antídoto às ruas.
Mas de mobilizar as ruas.
Levando a elas uma referência efetiva de renovação histórica, uma resposta palpável às expectativas sistematicamente fraudadas pelos que hoje se fantasiam de justiceiros sociais.
Ou se declaram ‘envergonhados’ do Brasil , como ontem se diziam enfadados nos meetings do ‘Cansei’.
E quando o extraordinário acontece não bastam as receitas da rotina.
A campanha eleitoral de 2014 fará um bem inestimável ao Brasil se assumir uma natureza híbrida.
Ser, ao mesmo tempo, a luta pela reeleição da Presidenta Dilma; e a mobilização educativa pela convocação de uma Constituinte Exclusiva e Soberana para renovar o sistema político brasileiro.
Não há rigorosamente uma receita macroeconômica capaz de resolver a frio os desafios da encruzilhada vivida pelo desenvolvimento do país.
O conservadorismo tem razão quando acusa os governos progressistas de Lula e Dilma de terem desequilibrado a rigidez estrutural do capitalismo por aqui.
Ao propiciarem o ingresso de mais de 50 milhões de brasileiros pobres à fila do caixa, eles acionaram um movimento de placas tectônicas em direção a um ciclo épico de investimento em produção, infraestrutura e logística social.
A engorda do capital rentista em piquetes de juro alto é incompatível com esse degelo social.
No fundo, o conservadorismo sabe que um Brasil morreu para sempre depois que esse deslocamento histórico se pôs em marcha.
Velhas estruturas e limites tornaram-se disfuncionais --sempre o foram, mas agora a inadequação ficou incomodamente escancarada.
O que se almeja é resistir. Desgastar. Disseminar o vírus do menosprezo pelo país que ainda somos.
Na esperança de ganhar tempo para que o desalento faça o resto.
E desmoralize a política, abatendo no ar o salto histórico do discernimento social em relação ao Brasil que poderíamos ser.
Uma retração econômica redentora cuidaria do serviço sujo, injetando arrocho e ordem no xadrez político, no desesperado esforço de devolver ao ‘crescimento’ o sentido excludente e genuflexo que ele sempre teve por aqui.
Repita-se : estamos diante de limites da tensão política extraordinários.
E quando o extraordinário acontece as receitas da rotina já não são eficazes.
Nenhuma panaceia técnica substituirá a sociedade naquilo que lhe cabe decidir: os pactos, os prazos, as metas , as concessões e as salvaguardas inerentes ao passo seguinte do seu desenvolvimento.
A reeleição da Presidenta Dilma é um passo indispensável a essa repactuação do futuro. A eleição de uma Constituinte que injete soberania popular à democracia brasileira é outro.
Um não se equilibra sem seu par.
Na grande aliança para o Brasil avançar, o vice de Dilma é a Constituinte da Reforma Política.
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