Operação para reprimir a venda de produtos piratas por camelôs, na zona oeste paulistana. Cria-se um tumulto. Um PM saca uma pistola. Um spray de gás de pimenta numa das mãos, a arma na outra. Uma pessoa tenta impedi-lo de usar o spray e o soldado atira para matar.
A PM tenta desconversar, mas um vídeo exibido pela TV Record mostra tudo. Em carta àFolha, o comando da corporação rechaça a ideia de que seria um exemplo de despreparo. Nenhuma polícia é tão preparada quanto a paulista. Não é um padrão. Foi um fato isolado –diz o prefeito. Noticia-se a seguir que o soldado já respondia por outro homicídio. Passam-se uns dias e o autor do disparo, preso em flagrante, recebe um alvará de soltura.
O assassinato de pessoas desarmadas por parte de policiais não é exclusividade do Brasil. No Reino Unido, onde a quantidade de mortes é baixíssima, o brasileiro Jean Charles foi friamente assassinado, "confundido com um terrorista".
Nos EUA, não faz muito que a violência explodiu em Fergusson. Um policial disparou contra num homem desarmado –"casualmente" era um negro. Em Nova York, pouco antes, outro negro havia morrido em decorrência de um golpe fatal, uma "chave de pescoço" aplicada por um agente da polícia.
No Brasil, entretanto, a polícia mata como um exército no front. Quatro vezes mais do que nos EUA. Mais de 100 vezes mais do que na Inglaterra. E são conhecidos os expedientes para maquiar execuções nas estatísticas oficiais como se fossem resultado de troca de tiros.
Sim, o narcotráfico mantém quadrilhas armadas em nossas cidades de Deus. Fuzis e granadas. Há anos uma guerra acontece aqui ao lado. Na favela vale tudo. Invadir residências sem autorização judicial, torturar, sequestrar, dar sumiço, eliminar. Onde está Amarildo?
Não sei, mas a droga é vendida a céu aberto, pertinho da viatura. Legalizar? Nem pensar, cruz credo, oremos.
Prevalece nas polícias brasileiras a cultura do confronto e da arbitrariedade. Às vezes não se sabe se o governo controla as ações ou se, no fim das contas, é controlado. A insegurança envenena os inseguros, que apoiam a carnificina. Bandido bom é bandido morto. Direitos humanos? Direitos civis? Frescura. Pseudoliberais gastam a lábia para defender o bang-bang.
O sistema prisional é o inferno. O ministro da Justiça declarou que preferia morrer a passar um período numa penitenciária brasileira. Facções criminosas regram em presídios, no lugar do Estado. A Justiça é lenta e o poder público não provê aos cidadãos os meios que deveria.
Quando vamos enfrentar essa catástrofe? Ou não vamos?
Marcos Augusto Gonçalves escreve para a Folha de Nova York. É editorialista e colunista do jornal. É autor de 'Pós Tudo - 50 Anos de Cultura na Ilustrada' (Publifolha, 2008) e de '1922 - A semana que Não Terminou' (Cia das Letras, 2012).
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