A greve dos PMs: o que fazer?
Há um debate dentro da esquerda brasileira, iniciado quando da greve dos bombeiros no Rio de Janeiro no ano passado (2011) e reiniciado agora (2012), com a atual greve dos PMs da Bahia: devemos apoiá-los ou não?
Os defensores da omissão alegam, não sem certa razão, que a PM é o braço armado do Estado, a serviço dos governantes, das elites sociais, da exploração dos trabalhadores, enfim, são também opressores do povo. Um aumento salarial (ou qualquer outro recurso destinado a eles) apenas ampliaria seu poder repressivo. Uma histórica repressão covarde e assassina cometida, dentre outros, pela PM recentemente, e os atuais e cotidianos crimes contra os Direitos Humanos, sobretudo contra pobres, reforça o argumento deste grupo.
Por outro lado, existem aqueles que enxergam uma divisão social (classista) também dentro da PM: além de seus setores mais elitizados (o alto oficialato), comprometido com os donos do poder e por isso melhores remunerados, a PM é composta em sua maioria (oficiais de baixa patente e praças) por homens e mulheres altamente explorados, diariamente humilhados, sobrecarregados, muito mal-pagos e internamente oprimidos, pertencendo também à classe trabalhadora (assalariados), vindas do povo, compondo-o, de onde são recrutados e (mal) treinados pelo Estado para fazerem o que fazem...
Na greve dos bombeiros do Rio, o governador Sérgio Cabral (PMDB) agiu com uma truculência digna de um regime ditatorial: mandou policiais, colegas de farda dos bombeiros, reprimi-los a qualquer custo. Porém, para sua surpresa, os PMs cariocas se negaram e inclusive aderiram aos grevistas. Assim, Cabral acionou o BOPE, sua “tropa de elite” (ou melhor, tropa DA elite) acostumada a deixar "corpo no chão" nas favelas, que reprimiu violentamente a todos, ferindo alguns a cassetetes e tiros, prendendo 400 deles. O governador carioca, então, foi à TV e passou a utilizar da velha cantilena demonizadora de greve que todos já conhecemos: chamou pais de família e pessoas de bem de “criminosos”, “baderneiros”, “vândalos”, “covardes” e por aí vai. Só que o tiro saiu pela culatra, pois bombeiros são muito bem quistos pela população. Ganharam apoio popular, seu movimento cresceu, desmoralizando desse jeito um governador que teve que retroceder.
A PM baiana é uma das mais mal-pagas do Brasil. É majoritariamente formada por “soldados quase todos pretos dando porrada na nuca de malandros pretos, de ladrões mulatos e outros quase brancos tratados como pretos”, como canta Caetano Veloso. Já protagonizaram greves duríssimas, muitas delas reprimidas violentamente pelo Exército. O governador baiano Jaques Wagner, do PT, vem utilizando nos jornais os mesmíssimos argumentos difamadores de greve e grevistas de sempre. Convocou o Ministro da Justiça, seu “companheiro” de partido, que prontamente enviou o Exército e a Polícia Federal, expedindo 11 mandados de prisão aos líderes grevistas, que serão enviados a presídios federais destinado s aos bandidos de alta periculosidade. É o PT mostrando mais uma vez o que se tornou desde sua “metamorfose”. Mas o que seria do governador baiano, do atual Ministro da (In)Justiça, da presidente e seu partido sem as greves? Eles devem toda a sua história às elas! O que seria, sem as greves, do próprio Lula, que chegou a ser preso na ditadura por fazê-las? Se vivêssemos no século XIX, certamente os políticos, o ministro de Estado e seus sabujos açoitariam e até enforcariam alguns líderes grevistas para servirem de exemplo aos demais oprimidos. Se vivêssemos na ditadura, alguns grevistas simplesmente "desapareceriam". Vivemos em anos de greve diante de governos do PT, que continuam a reprimir grevistas violentamente, tratando-os como se fossem criminosos...
Não importa se um juiz baiano simpático ao governador (a solidariedade de classe deles é coisa impressionante!) decretou aquela greve como “ilegal”. Greve é um direito universal, inalienável e inclusive descrita nos artigos dos Direitos Humanos. É e sempre foi o meio mais legítimo, justo e eficaz que os trabalhadores arranjaram para nos defender de nossos exploradores, sejam eles patrões privados ou chefes de Estado. Greve não é crime e resulta da mistura da necessidade com a consciência crítica nascida nos que vivem do suor do trabalho e com miserável salário.
Oxalá chegue o dia no qual uma greve qualquer de trabalhadores fardados ou não iniciada em qualquer parte do país ou planeta desencadeie muitas outras paralisações, protestos e demais greves em solidariedade. Eis um motivo para apoiarmos sem vacilo a luta dos PMs na Bahia!
Hemerson Ferreira é Policial Militar no Rio Grande do Sul e também professor de História. E-mail: hemersonfer@bol.com.br
Fonte: Blog NOQAP
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