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segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Falta de parecer do Conselho Penitenciário é inconstitucional

INDULTO E COMUTAÇÃO


A primeira função prevista para os Conselhos Penitenciários, tanto pela LEP (artigo 70, I), quanto pela Lei 6.181/2012, é a de emitir parecer sobre indulto e comutação. São dezenas de processos por mês analisados pelos conselheiros estaduais, que no debate semanal na análise de múltiplas situações relativas à concessão da clemência presidencial, acabam por especializar-se na matéria.
Em razão desta atribuição, os conselheiros do Conselho Penitenciário do Estado do Rio de Janeiro opinam em relação a benefícios, como a comutação e o indulto, muitas vezes não observados em toda sua extensão nem pela defesa (exercida por experientes advogados e defensores públicos), pelo Ministério Público, ou pelo Juízo da Execução; buscando, sempre que possível, igualmente detectar eventuais falhas que precisem de saneamento.
O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), ao encaminhar a proposta de indulto para o ano de 2013, sugeriu a dispensa da obrigatoriedade do parecer do Conselho Penitenciário, sob o argumento de “desobstruir os gargalos que se formam no Poder Judiciário e que atrasam, sobremaneira, uma manifestação judicial que deve ser, o quanto possível, a mais objetiva, breve e célere.”
A sugestão, consubstanciada na previsão do artigo 11, parágrafo 5°, incorre em grave equívoco. Viola a competência do legislador ordinário (artigo 22, I, da CF), ao invadir matéria já regulada em lei federal à guisa de exercer sua prerrogativa prevista no artigo 84, XII, da CF.
Frise-se que a Constituição limita expressamente os poderes do chefe do Executivo, vedando em seu artigo 62 que adote medidas provisórias relativas a direito processual penal. Logo, à guisa de conceder indultos e comutar penas, não pode modificar normas processuais penais através de decreto.
O Código de Processo Penal, em seu Título IV, ao regular a matéria relativa a graça, indulto e anistia, em seus artigos 734 a 742, menciona a participação do Conselho Penitenciário nos artigos 734, 735, 736, 737, 741 e 742. É porque é o órgão da execução penal especializado nesta matéria (artigo 70, I, LEP).
Guardadas as devidas proporções, e com a devida vênia, é como excluir da execução penal o setor de cálculos, sob alegação de que seria um gargalo processual. Com uma boa calculadora e bastante paciência, um magistrado consegue realizar os cálculos necessários para a concessão da progressão da pena e concessão de benefícios previstos em sede de execução penal.
Ainda que seja recomendável aos decretos buscar caminhos para facilitar a aplicação e o reconhecimento do indulto e comutação presidenciais, não possui competência a Presidência da República para, através de decreto, regular matéria processual penal.
Sob o ponto de vista da prática da execução penal, nos casos de comutação, em que não se prevê o perdão total da pena, mas redução de pequena parcela, qualquer alegação de atraso não possui razoabilidade, porque ao fim e ao cabo o apenado nestes casos não sofre nenhuma consequência prática.[1]
No que diz respeito ao indulto, o ilegal atalho buscado pelo decreto presidencial para a execução penal deverá empobrecer o exame dos requisitos para a concessão do indulto ou comutação. Diminuirá, inerentemente, a fiscalização sobre os processos em sede de execução penal. Verificamos que na imensa maioria das vezes, o atraso ocorre nas Varas de Execução Penal, e em outros setores da execução penal, e não nos Conselhos Penitenciários, não tendo demonstrado o CNPCP nenhum dado empírico ou estatístico que lhe permita demonstrar que exista um gargalo nos conselhos penitenciários estaduais.
Se busca agilizar a concessão do benefício, poderia sugerir à Presidência da República que publicasse seus Decretos com meses de antecedência em relação à data marco de concessão do benefício, como ocorriam com os Decretos editados nos anos de 1993 e seguintes, mantendo o dia 25 de dezembro como marco temporal para a obtenção do benefício. Eram, então, publicados nos meses de outubro e novembro, permitindo assim que os beneficiários do perdão presidencial conhecessem de antemão as premissas para obtenção do benefício, facilitando a elaboração antecipada dos requerimentos e seu processamento.
A tendência, se as varas de execução penal do país aplicarem o ilegal dispositivo inconstitucional, é que ocorra uma redução do número de concessão dos benefícios. Magistrados poderão negar diversos requerimentos sem o amparo do parecer emitido pelo Conselho Penitenciário.
Ceifar desta fase da execução penal — tão defeituosa e tão carente de fiscalização — o Conselho Penitenciário, não me parece algo tendente a retirar um gargalo do processo de execução penal, mas obstruir o já estreito gargalo pelo qual saem do sistema os beneficiários do perdão presidencial.
A fim de buscar efetivar e garantir os direitos dos presos beneficiados pela clemência presidencial, melhor seria que o artigo previsse a possibilidade do magistrado agir de ofício apenas para conceder o benefício do indulto total.
Assim, porventura o magistrado entendendo pela não aplicação de nenhum benefício, ou aplicando a comutação, remeteria o feito ao Conselho Penitenciário em uma espécie de reexame necessário — de natureza consultiva mista, porque também exerce a prerrogativa de suscitar incidente de desvio ou excesso de execução (artigo 185 e 186 da LEP) —, evitando assim, em casos eventuais de equívocos do magistrado, que beneficiários do perdão presidencial permaneçam indevidamente sob custódia do Estado, violando direitos fundamentais, e onerando indevidamente a administração.

[1] Um preso cuja pena de cinquenta anos caia para quarenta; ou cuja pena de 15 anos sofra uma redução de um quarto, não sofrem resultados decorrentes de eventual trâmite burocrático, porque a previsão para a sua liberdade é para data muito distante.
Rodrigo de Oliveira Ribeiro é advogado criminal e membro do Conselho Penitenciário do Estado do Rio de Janeiro.

Revista Consultor Jurídico

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