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segunda-feira, 22 de julho de 2013

O objeto de desejo, a obsessão de Obama




Encalhado em Moscou, sem ter para onde ir, Edward Snowden resolveu pedir asilo à Rússia. Será o primeiro passo para poder ir para um dos três países – a Nicarágua, a Venezuela e a Bolívia – que ofereceram asilo ao ex técnico terceirizado da CIA que desmontou uma das grandes farsas do governo de Barack Obama.

Mais enrolada que rocambole de avó ou bolo de rolo de Pernambuco, a situação de Edward Snowden continua atraindo as atenções de meio mundo. Encalhado em Moscou, sem ter para onde ir, ele resolveu pedir asilo à Rússia. Será o primeiro passo para poder ir para um dos três países – a Nicarágua, a Venezuela e a Bolívia – que ofereceram asilo ao ex técnico terceirizado da CIA que desmontou uma das grandes farsas do governo de Barack Obama. 

Empenhando uma palavra cada vez mais carente de valor, Obama havia assegurado que desmantelaria o gigantesco esquema de espionagem global armado pelo seu antecessor, George W. Bush. Pois não só manteve como o expandiu. 

Escudado no argumento da necessidade de evitar atentados terroristas, seu governo aproveitou para espionar a tudo e a todos. Até agora tem gente se perguntando como é que informações criptografadas trocadas entre a representação da União Européia em Washington e sua sede em Bruxelas poderiam conter dados que atentassem contra a segurança dos Estados Unidos. Isso, para não falar de espionagem contra empresas, bancos e cidadãos de todo o mundo. 

Uma ação de tal envergadura, e feita com tal descaramento, oculta, na verdade, uma atitude vil, impertinente, agressiva, típica da prepotência imperial que Obama parecia disposto não a eliminar, pois seria impossível, mas pelo menos suavizar. 

O que vemos agora é o avesso. Snowden revelou parte do que sabe, e essa parte foi suficiente para que ele se tornasse uma obsessão para Omaba, que desandou a distribuir ordens e determinações com a tranqüilidade de quem não só se crê, mas está convicto de ser o verdadeiro dono do mundo.

Há, evidentemente, um preço político e diplomático altíssimo a ser pago por essa obsessão. Mas Obama parece disposto a pagar o que for.

Para começo de conversa, é preciso impedir que Snowden continue gotejando informações. Além disso, é preciso impedir que outros jovens técnicos em computação resolvam seguir seu exemplo e difundam métodos que invadem a privacidade da cidadania e violam uma seqüência de garantias asseguradas pela própria Constituição dos Estados Unidos, para não mencionar acordos e tratados e convênios internacionais. Há, nos Estados Unidos, uma multidão – calcula-se que cinco milhões de pessoas – fazendo trabalhos terceirizados para a Agência de Segurança Nacional, com acesso a dados supostamente sigilosos. Quantos Snowdens potenciais estão por aí?

Há outros aspectos: Obama precisa mostrar à opinião pública interna que o poder de influência dos Estados Unidos continua intacto apesar de seu governo errático. 

Deve-se, a isso tudo, somar um dado essencial: a ação de Edward Snowden deixou claro, e bem claro, que o sistema de espionagem dos Estados Unidos é, além de invasivo, frágil. 

Afinal, o jovem técnico era parte do sistema, e fez o que fez sem que ninguém se desse conta até tudo vir à tona. 

No horizonte mais próximo paira a possibilidade de conflitos diplomáticos sérios entre Washington e a América Latina, e também com a Rússia. Obama, que se dedica a advertir quem se anime a dar asilo a Snowden das graves conseqüências que esse ato poderá provocar, desconhece limites. O que Washington fez, com a servil cumplicidade dos governos da França, Itália, Portugal e Espanha, ao forçar um pouso do avião do presidente boliviano Evo Morales na Áustria, é só um vislumbre de até que ponto Washington pode chegar. 

Agora, foi a vez de Moscou receber a advertência: que nem se atreva a servir de ‘plataforma de propaganda’ das denúncias de Snowden. Para Obama, pouco importa que a Rússia seja peça chave da segurança global. 

Enfrentar problemas com a América Latina, onde a influência norte-americana, apesar de ter diminuído, continua imensa, não significa nenhum obstáculo. Afinal, as relações com a Nicarágua, a Venezuela e a Bolívia já não são nada boas. 

Os Estados Unidos compram 900 mil barris de petróleo venezuelano por dia. Isso significa um terço do total das exportações de petróleo do país que ofereceu asilo a Snowden. A Bolívia conta com alguns benefícios comerciais que Washington concede aos países andinos. E a Nicarágua, um dos países mais pobres da região, conta com algumas preferências comerciais outorgadas pelos Estados Unidos. 

Nenhum dos três países parece disposto a priorizar esses eventuais benefícios sobre seu direito a assumir uma decisão soberana e conceder asilo a um perseguido político.

Enquanto continua nebuloso o panorama, resta uma pergunta entre tantas: de onde tamanha sanha? Por que, afinal, Snowden se transformou na obsessão, no verdadeiro objeto de desejo de Obama?

O enigma, talvez, nem seja tão intrincado assim. Obama, tido como fraco e frouxo, precisa mostrar que é forte e decidido. É uma questão interna. Os truculentos republicanos vivem dizendo que ele não é de nada. E, talvez por não ser de nada, Obama resolveu fazer uma exibição global de valentia. O custo, as conseqüências, nada disso importa. O que importa é satisfazer a opinião pública e seu eleitorado. Que, quando se trata de questões internas, até que é bem informado. Mas que não tem noção do que acontece fora de seus condados, e justamente por causa dessa ignorância olímpica acredita que o sentimento anti-norte americano é, no fundo, uma tremenda injustiça da humanidade. 

Há décadas o mundo não via caçada tão implacável a um fugitivo. Para Obama, Snowden virou uma questão prioritária para a auto-estima de alguém cada vez menos estimado. 

Onde isso tudo vai parar, ninguém sabe. Mas o que sim, se sabe, é que se alguma vez a imagem de Barack Obama na América Latina teve algum peso, significou alguma esperança de mudança, por mais tênue que fosse, agora se diluiu feito pó no oceano. 





Fotos: Human Rights Watch 

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