Por Michel Blanco
Tiriricas com o Enem
A eleição de Francisco Everardo Oliveira Silva, o Tiririca, é creditada ao voto de protesto contra “tudo que está aí”. O palhaço, candidato a deputado federal mais votado do país, com 1,350 milhão de votos válidos, amealhou eleitores principalmente entre os mais jovens, sob efeito da percepção generalizada de que nada no pais funciona como deveria. Na última semana, o MEC (Ministério da Educação) deu uma forcinha a essa crença.
Centenas de estudantes foram às ruas de diversas capitais para extravasar revolta contra os sucessivos erros na aplicação do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), que a partir de 2009 passou a servir como vestibular nacional ao mesmo tempo em que visa diagnosticar o ensino médio do país. Reunidos a partir de comunidades na internet, os protestos aglutinaram jovens de diferentes matizes; uns a favor de melhorias no Enem e de mais investimentos em educação; outros contra a realização do exame. Em comum, a ira contra o MEC e narizes de palhaço — símbolo hoje onipresente em manifestações de qualquer classe ou ordem, de policiais a reivindicar maiores salários a jornalistas cobrando bons modos de técnico de futebol. O nariz de palhaço parece simbolizar uma exigência de respeito ao portador, uma relação de difícil compreensão que merece análise mais cuidadosa.
Voltando. A aplicação do Enem 2010 foi marcada por erros inaceitáveis, sobretudo após o histórico de problemas da edição anterior. Cartões-resposta trocados, questões repetidas ou ausentes e brechas de segurança que permitiram a alunos acesso a celular e dali ao indefectível Twitter. A bem da verdade, o número de prejudicados imediatos foi menor que o inicialmente noticiado: algo menos de 2 mil receberam a fatídica prova amarela com erros, num universo de 4,6 milhões de inscritos. Mas as falhas abalaram a credibilidade do exame, e o imbróglio judicial em que se transformou o Enem deste ano traz decepção e insegurança a todos participantes.
Considerados os erros e acertos do novo Enem, no entanto, o saldo é positivo. A confusão na aplicação das provas nada tem a ver com a metodologia, defendida por especialistas e reconhecida pela ONU. Educadores e representantes de escolas e universidades, como o reitor da UFRJ, consideram o Enem um êxito na democratização do acesso à educação superior. Das 84 universidades e instituições federais que usam a nota do Enem, 36 valem-se exclusivamente do exame para selecionar calouros para 2011. Não é pouca coisa. E a intenção é, no futuro, promover o ingresso a instituições de ensino superior apenas pelo Enem. Além disso, um dos objetivos mais elogiados por gente entendida é a tentativa de induzir o currículo das escolas a seguir o padrão do exame, que privilegia o raciocínio em detrimento da decoreba.
Acabar com o Enem, como defendem uns poucos alunos, é ideia fora do lugar. Afinal, quais os beneficiados além da indústria do vestibular e dos cursinhos? Mas têm razão os que clamam por mudanças no exame. A sequência de erros ameaça sim fazer do Enem 2010 uma verdadeira palhaçada; o momento é oportuno e urgente para aperfeiçoamento. O “gigantismo” do Enem é apontado como origem dos problemas, enquanto a regionalização e a aplicação de várias edições da prova ao ano são vistos como caminho para melhora. Talvez. Mas cabe aos principais interessados, os estudantes, entrar nessa discussão.
Os revoltados com as falhas no Enem poderão reclamar com o próprio ministro Fernando Haddad (Educação). Em uma das raras ocasiões em que o Legislativo cumpre, ao menos formalmente, com a missão fundamental de representar os interesses dos cidadãos e fiscalizar o Executivo, a futura casa de Tiririca inaugura, justamente em audiência realizada com Haddad nesta quarta-feira (17), um projeto piloto que envia perguntas da população para os convidados de debates públicos promovidos pelas comissões da Câmara. É um passo.
Por enquanto, duas comissões aderiram ao projeto preliminar: a Comissão de Direitos Humanos e Minorias e a Comissão de Educação e Cultura, que receberá o ministro da Educação. As audiências selecionadas serão transmitidas ao vivo na internet, e os emails podem ser enviados a partir desta terça (16), para pergunte@camara.gov.br. Os emails para Haddad deverão ser enviados com o campo assunto CEC.
A iniciativa é louvável, mas há um porém: as perguntas passarão pelos deputados que integram a comissão, pois, de acordo com o Regimento Interno da Câmara, apenas os parlamentares têm direito ao uso da palavra em audiências públicas. Tudo bem, faz parte do exercício da cidadania representativa. E quem elegeu Tiririca e tantos outros palhaços talvez não veja problema nisso.
Fonte: colunista do yahoo
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