Grupo de 31 organizações se inspira na Lei da Ficha Limpa e tenta formatar projeto de mudanças no sistema político.
A reportagem é de André Gonçalves e publicada pela Gazeta do Povo, 03-04-2011.
Na esteira da Lei da Ficha Limpa, um grupo de 31 organizações sociais começou na semana passada o desafio de popularizar a discussão sobre a reforma política no Brasil. As entidades tentam consolidar um projeto de iniciativa popular para tramitar no Congresso Nacional ainda neste ano. A missão contraria interesses corporativos dos parlamentares e, ao mesmo tempo, as estatísticas: desde a Constituição de 1988, apenas 4 das cerca de 11 mil normas jurídicas aprovadas pelo Poder Legislativo tiveram origem em sugestões da sociedade.
A Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político propõe mudanças mais estruturais do que as que estão sendo debatidas nas comissões especiais sobre o tema instaladas na Câmara dos Deputados e no Senado. As ideias estão dividas em quatro eixos: fortalecimento da democracia direta, democratização e fortalecimento dos partidos políticos, mudanças do sistema eleitoral e controle social do processo eleitoral. O primeiro ponto tenta exatamente simplificar a participação popular no processo de elaboração das leis, modernizando o processo de coleta de assinaturas. Além de formulários impressos, elas poderiam ser recolhidas em urnas eletrônicas e pela internet.
Atualmente, para que um cidadão comum apresente sua sugestão de lei diretamente ao Congresso, o texto precisa estar amparado pela assinatura de 1% do eleitorado brasileiro, o que corresponde a cerca de 1,3 milhão de pessoas, originárias de pelo menos cinco estados. Os documentos precisam ser apresentados ao Legislativo em papel, junto com o número do título de eleitor e do endereço do apoiador da proposta.
Outros dois tópicos giram em torno da mudança do sistema de votação nas eleições para vereador, deputado estadual e federal. A plataforma propõe a adoção de listas fechadas (na qual o eleitor vota no partido e não no candidato) e do financiamento público de campanhas. O objetivo é fortalecer os partidos, que também precisariam passar por mudanças estruturais.
Todos os órgãos de representação interna das legendas, por exemplo, só poderiam ser escolhidos por meio de votação direta e secreta. Além disso, haveria a obrigatoriedade de publicação das contas dos partidos na internet mensalmente. Já o financiamento ocorreria exclusivamente por meio do fundo partidário e das doações de filiados.
Membro do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), uma das entidades que compõem a plataforma, Marlon Reis diz que as medidas acabariam com a “fulanização” da política brasileira. “Nosso maior problema é uma estrutura baseada em pessoas, não em ideias. Esse é o alimento do clientelismo, da cultura de patronato de fulanos que perpetuam o conceito de que o voto é uma troca de favores”, argumenta.
O quarto item da proposta tenta limitar o poder dos parlamentares. Ele pede o fim de todas as votações secretas nos legislativos, da imunidade parlamentar (a não ser no direito de opinião e denúncia), da prerrogativa de foro (exceto para casos de irregularidades que se referem ao mandato) e a proibição de que parlamentares assumam cargo no Poder Executivo ou disputem eleições exercendo mandato (em ambas as situações, eles teriam de renunciar).
“Nosso papel é jogar peso popular sobre a reforma para que ela não fique meramente cosmética como quer a maioria dos parlamentares”, diz Eliana Graça, assessora do Instituto de Estudos Socioeconômicos, que também integra a plataforma. Ela admite que a tarefa não será fácil. “A conjuntura é das piores.”
Mentor da redação original da Ficha Limpa, que posteriormente foi modificada no Congresso Nacional e contestada no mês passado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), Marlon Reis também ressalta que há um preconceito instalado entre os poderes quanto às iniciativas populares. “Em alguns votos de ministros (do STF), deu para perceber que eles trataram a Ficha Limpa como uma proposta originária de um povaréu, uma massa desgovernada. Eles não consideraram o grau de relevância que a Constituição dá ao dispositivo que autoriza o povo a emitir suas propostas diretamente ao Legislativo.”
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