Coronel PM representa contra Tenente que defendeu desmilitarização
"Há ainda coronéis que insistem no modelo militarizado de segurança pública, pois gozam de privilégios absurdos, poder ilimitado e sem controle, e impunidade no âmbito das instituições militares."
José Luiz Barbosa, Sgt PM - RR
Presidente da Associação Mineira de Defesa e Promoção da Cidadania e Dignidade, ativista de direitos e garantias fundamentais, e especialista em segurança pública
Já escrevi aqui muitas vezes que dois pontos se enquadram num pretenso conceito de “desmilitarização” das polícias brasileiras: reduzir os abusos cometidos por policiais contra cidadãos e garantir aos próprios policiais direitos de cidadão. Neste contexto, na Polícia Militar do Rio Grande do Norte um fato emblemático acaba de ocorrer, com um Coronel PM da Reserva Remunerada tendo representado administrativamente contra um Tenente PM que defendeu abertamente a desmilitarização no Facebook:
Uma mensagem publicada em uma rede social por um Tenente da Polícia Militar vem causando agitação devido a reação de um Coronel PM da Reserva Remunerada que ofereceu representação contra o Oficial.O Tenente teria publicado no último dia 22 uma mensagem em seu perfil do facebook apoiando a desmilitarização das polícias militares. “Basta uma única polícia. No Chile é assim e dá de 10 x 0 no Brasil”, declarou o Oficial, seguido de uma foto com os dizeres “Fim do militarismo nas polícias já”.A declaração, contudo, ocasionou a reação de um Coronel da Reserva Remunerada, o qual publicou em seu facebook uma “Representação Administrativa” dirigida ao Comandante Geral da PMRN em face da publicação do 1º Tenente em seu perfil.Na representação, o Oficial da Reserva passa a enumerar os ordenamentos jurídicos aos quais são subordinados os policiais militares, destacando a questão da hierarquia, disciplina, acatamento das leis, amor à profissão, entre outros dispositivos constantes na legislação militar. Para o Coronel, o Tenente, “ao manifestar-se publicamente, da forma como o fez, atropela, em tese, todos os dispositivos”, destacou o Coronel. Ainda conforme a representação, “as polícias militares passam por um momento de transição em sua história, aonde setores externos seguidores de ideologia contrária aos valores castrenses ‘injetam’, aqui e acolá, sementes de discórdia, na tentativa de fragilizar, enfraquecer e desmistificar nossas tradições, nossa história, nossos paradigmas, nossos dogmas, nossa honra e nossa glória”.De acordo ainda com a representação, o Tenente “não se restringiu apenas a noticiar eventual insatisfação pessoal frente à estrutura hierarquizada da instituição que o acolheu em suas fileiras, mas, ao compará-la com instituições congêneres e atribuir-lhe nota zero e suscitando a sua própria extinção, ‘cospe no prato que come’, como bem ensina a sabedoria popular”. Ao final, o Coronel refere-se ao Tenente como um “jovem oficial que, presume-se, ainda não conseguiu assimilar e aprender a real e verdadeira razão de ser policial militar e da importância transcendental e imensurável da Polícia Militar do Rio Grande do Norte”, e solicita ao Comandante Geral da PMRN “que seja dado ciência formal dos termos do presente instrumento ao representado, acrescido de orientações de Comando, na expectativa de que fatos de igual natureza sejam, por ele, tempestivamente, avaliados, sopesados e comparados à luz do direito alheio”, conclui o Coronel.Militares criticam atitude de Oficial da Reserva e emitem mensagens de apoio a Tenente PMA representação administrativa elaborada pelo Oficial da Reserva Remunerada dividiu opiniões, e muitos saíram em defesa do Tenente da PMRN, afirmando se tratar de uma simples manifestação de pensamento. “Uma simples e curta opinião resultou nisso”, disse um policial militar em seu perfil e concluiu: “Onde anda a liberdade de expressão?”.A Associação de Cabos e Soldados da PMRN (ACS/PMRN) também saiu em defesa do 1º Tenente e emitiu uma nota de apoio ao Oficial, destacando que o “Tenente teve o privilégio de em sua carreira militar ter sido soldado e, por isso, tem uma visão ampla dessa questão do militarismo e de suas implicações hierarquizadas na nossa Corporação”, diz um trecho da nota.
É espantoso ver tamanha defesa da “importância transcendental e imensurável da Polícia Militar“, instituição criada para cultivar a cidadania, no mesmo discurso onde se pretende calar um cidadão(?) que apenas manifestou seu pensamento. Pensamento que, aliás, é impessoal e não desrespeita direitos, tampouco é autoritário e arrogante.
Todos têm direito de ter paixões. Mas ninguém tem o direito de forçar que outros indivíduos proclamem essas mesmas paixões.
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