Papel do Judiciário
Reputação e condutas ilibadas. Prestígio em exercer um cargo de relevância na estrutura social. Respeitabilidade. Presunção de veracidade e confiança na prática dos seus atos. Responsabilidade. Renúncia a uma vida que não privilegie o permanente estudo. Coragem e vocação.
Não se escolhe ser magistrado. A toga escolhe quem pode vesti-la, numa peneira invisível e diária.
Os atributos acima não combinam com expressões como “meia dúzia de vagabundos” e de “bandidos”. E não o são. Magistratura não combina com arroubos e palanques de quem quer arrancar aplausos fáceis da platéia.
A vida de um magistrado, especialmente daqueles que labutam nos mais inóspitos rincões desse país continental, em destaque no estado do Pará, desenham uma caricatura do servidor juiz que não se coaduna com a atual imagem que grassa os meios de comunic ação de massa.
Ninguém passeia na solidão de um jovem juiz quando, distante da família em cidades de acessos tormentosos, vê-se diante de uma causa que pode mudar o destino de toda a comunidade em que labuta. Reticente ao contato social, preocupado com a necessária eqüidistância para o julgamento, o magistrado perde o “calo da vitória” das lições jurídicas universitárias que tanto dominara até aquele momento e queda ante ao desconhecido.
Quem pode sentir a dor da mulher magistrada, longe dos filhos no mais das vezes pela opção da proteção familiar, nas noites de insônia que precedem aos julgamentos mais intrincados? Saberão quanto valeu a escolha de distribuir a Justiça?
As renúncias e dificuldades da judicância atualmente são ignoradas por uma parcela que não deseja contribuir com a melhoria na prestação desse essencial serviço público. O que interessa, a qualquer cronista do cotidiano que sequer domina um termo da técnica processual, é fazer sangrar a classe dos julgadores, os privilegiados e corruptos juízes.
Custo a encontrar toda essa leva de bandidos de toga. Patrícia Accioli, brutalmente assassinada no Rio de Janeiro em agosto de 2011, não saiu do Fórum de São Gonçalo às 22h 30min. depois de um dia de conchavos e displicência funcional. Despachava em processos de fatos tão graves que amedrontariam o mais corajoso dos homens.
A última imagem de Patrícia, nas câmeras de segurança do pátio forense, permitiam ver sua toga balançando leve da certeza do dever cumprido de mais um dia. “Meus ombros suportam o mundo, e ele não pesa mais que a mão de uma criança” poderia cochichar consigo a juíza. Sua armadura de pano foi manchada de sangue minutos depois. Não consigo vê-la envolta na lama de acusações levianas contra a magistratura.
Seu filho, no telejornal do dia seguinte, resumiu o que testemunhava na casa em construção daquela mulher: a mesa repleta de livros nos quais se debruçava cotidianamente e vez por outra ela sentava para ver filmes e conversar. Vivia no mundo de privilégio da realização moral.
Em São Paulo, “a propina de natal” entregue à magistrada Cynthia Andraus Carreta, da Comarca de Rio Claro, veio em forma de carta bomba. Desejavam explodir a probidade do ser humano. ”
“Você me prende vivo, eu escapo morto”, diria o poeta Paulo César Pinheiro.
Os milhões de julgados exarados anualmente por apenas dezesseis ou dezessete mil juízes não brotaram do chão, inadvertidamente. São frutos da renúncia aos mais próximos, do estresse e das noites mal dormidas na dúvida entre o sim e o não.
O dramaturgo alemão Bertolt Brecht escreveu “Perguntas de um trabalhador que lê”, questionando: “Quem construiu a Tebas de sete portas? Nos livros estão nomes de reis. Ar rastaram eles os blocos de pedra?... Cada página uma vitória. Quem cozinhava o banquete? A cada dez anos um grande homem. Quem pagava a conta? Tantas histórias, tantas questões”.
O momento não pode ser da destruição irresponsável. A desconstrução da imagem do Poder Judiciário há de ser feita pelos próprios magistrados. É preciso apagar a visão social que não existe no dia-a-dia dos fóruns ou casas da cidadania. Somos nós os sustentáculos do livre exercício da democracia e ninguém com interesses envoltos em neblina de ganja pode nos diminuir, nos envergonhar de seguir apenas o rastro de nossa consciência.
Quem constrói a democracia brasileira? A quem importa espezinhar e desmoralizar juízes? “Tantas histórias, tantas questões”.
Não se escolhe ser magistrado. A toga escolhe quem pode vesti-la, numa peneira invisível e diária.
Os atributos acima não combinam com expressões como “meia dúzia de vagabundos” e de “bandidos”. E não o são. Magistratura não combina com arroubos e palanques de quem quer arrancar aplausos fáceis da platéia.
A vida de um magistrado, especialmente daqueles que labutam nos mais inóspitos rincões desse país continental, em destaque no estado do Pará, desenham uma caricatura do servidor juiz que não se coaduna com a atual imagem que grassa os meios de comunic ação de massa.
Ninguém passeia na solidão de um jovem juiz quando, distante da família em cidades de acessos tormentosos, vê-se diante de uma causa que pode mudar o destino de toda a comunidade em que labuta. Reticente ao contato social, preocupado com a necessária eqüidistância para o julgamento, o magistrado perde o “calo da vitória” das lições jurídicas universitárias que tanto dominara até aquele momento e queda ante ao desconhecido.
Quem pode sentir a dor da mulher magistrada, longe dos filhos no mais das vezes pela opção da proteção familiar, nas noites de insônia que precedem aos julgamentos mais intrincados? Saberão quanto valeu a escolha de distribuir a Justiça?
As renúncias e dificuldades da judicância atualmente são ignoradas por uma parcela que não deseja contribuir com a melhoria na prestação desse essencial serviço público. O que interessa, a qualquer cronista do cotidiano que sequer domina um termo da técnica processual, é fazer sangrar a classe dos julgadores, os privilegiados e corruptos juízes.
Custo a encontrar toda essa leva de bandidos de toga. Patrícia Accioli, brutalmente assassinada no Rio de Janeiro em agosto de 2011, não saiu do Fórum de São Gonçalo às 22h 30min. depois de um dia de conchavos e displicência funcional. Despachava em processos de fatos tão graves que amedrontariam o mais corajoso dos homens.
A última imagem de Patrícia, nas câmeras de segurança do pátio forense, permitiam ver sua toga balançando leve da certeza do dever cumprido de mais um dia. “Meus ombros suportam o mundo, e ele não pesa mais que a mão de uma criança” poderia cochichar consigo a juíza. Sua armadura de pano foi manchada de sangue minutos depois. Não consigo vê-la envolta na lama de acusações levianas contra a magistratura.
Seu filho, no telejornal do dia seguinte, resumiu o que testemunhava na casa em construção daquela mulher: a mesa repleta de livros nos quais se debruçava cotidianamente e vez por outra ela sentava para ver filmes e conversar. Vivia no mundo de privilégio da realização moral.
Em São Paulo, “a propina de natal” entregue à magistrada Cynthia Andraus Carreta, da Comarca de Rio Claro, veio em forma de carta bomba. Desejavam explodir a probidade do ser humano. ”
“Você me prende vivo, eu escapo morto”, diria o poeta Paulo César Pinheiro.
Os milhões de julgados exarados anualmente por apenas dezesseis ou dezessete mil juízes não brotaram do chão, inadvertidamente. São frutos da renúncia aos mais próximos, do estresse e das noites mal dormidas na dúvida entre o sim e o não.
O dramaturgo alemão Bertolt Brecht escreveu “Perguntas de um trabalhador que lê”, questionando: “Quem construiu a Tebas de sete portas? Nos livros estão nomes de reis. Ar rastaram eles os blocos de pedra?... Cada página uma vitória. Quem cozinhava o banquete? A cada dez anos um grande homem. Quem pagava a conta? Tantas histórias, tantas questões”.
O momento não pode ser da destruição irresponsável. A desconstrução da imagem do Poder Judiciário há de ser feita pelos próprios magistrados. É preciso apagar a visão social que não existe no dia-a-dia dos fóruns ou casas da cidadania. Somos nós os sustentáculos do livre exercício da democracia e ninguém com interesses envoltos em neblina de ganja pode nos diminuir, nos envergonhar de seguir apenas o rastro de nossa consciência.
Quem constrói a democracia brasileira? A quem importa espezinhar e desmoralizar juízes? “Tantas histórias, tantas questões”.
Heyder Ferreira é juiz e presidente da Associação dos Magistrados do Pará (Amepa).
Revista Consultor Jurídico
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