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segunda-feira, 27 de maio de 2013

Nova lei não extingue prescrição retroativa


Por: Elarmim Miranda Advogados Associados


A Lei 12.234/2010, que entrou em vigor em 6 de maio de 2010, alterou os artigos 109 e 110 do Código Penal, refletindo em inovações quanto ao prazo mínimo da prescrição da pretensão punitiva, o qual era de dois anos para o crime com pena máxima privativa de liberdade inferior a um ano, bem como quanto à revogação da prescrição da pretensão punitiva retroativa. 
 
Este trabalho tem por escopo trazer à lume, em breve digressão, às alterações que essa nova lei refletirá no poder punitivo estatal, discorrendo, inicialmente, o conceito de prescrição e suas modalidades, as consequências da mudança legislativa, a crítica da doutrina em relação ao equívoco do legislador quanto à extinção total da prescrição retroativa, a questão da prescrição virtual e, por fim, a alteração do prazo mínimo prescricional e repercussão do direito intertemporal, seguida da conclusão. 
 
Trata-se do instituto jurídico mediante o qual o Estado perde o direito de exercer seu monopólio punitivo diante do decurso de lapso temporal previsto em lei. 
Em outras palavras, o Estado atesta sua incapacidade de fazer valer seu direito de punir dentro de determinado prazo regulado por lei, acabando por gerar a extinção da punibilidade, conforme prevê o artigo 107, IV, do Código Penal. Vale lembrar que o fundamento principal da prescrição é que o tempo faz desaparecer o interesse social em punir, seja pelo esquecimento do fato, pela dispersão de prova, pela falência da finalidade punitiva ao infrator ou, por fim, seja pela vedação da proibição da perpetuidade da persecução penal.
 
Modalidades de prescrição O Código Penal prevê duas modalidades de prescrição: prescrição da pretensão punitiva e a prescrição da pretensão executória. Por sua vez, a prescrição da pretensão punitiva, divide-se em abstrata, superveniente ou intercorrente e retroativa. A prescrição da pretensão punitiva em abstrato tem previsão do artigo 109, caput, do Código Penal, sendo essa prescrição calculada sobre a pena máxima em abstrato cominada para cada infração penal, considerando que não há título executivo punitivo, ou seja, não há sentença condenatória com trânsito em julgado. 
 
Já a prescrição da pretensão punitiva intercorrente ou superveniente, disciplinada no artigo 110, parágrafo 1º, do Código Penal, ocorre quando há trânsito em julgado apenas para a acusação ou quando improvido seu recurso, mas tem por cálculo a pena já fixada na sentença condenatória. Por sua vez, a prescrição da pretensão punitiva retroativa tinha previsão no parágrafo 2º do artigo 110 do Código Penal, atualmente revogado pela Lei 12.234/2010. 
 
Para sua caracterização necessário se fazia percorrer dois percursos: o primeiro, verificando se entre a data do fato delituoso e o do recebimento da peça acusatória houve prescrição, conforme a pena em concreto imposta na sentença condenatória; o segundo, entre a data desse recebimento da denúncia ou da queixa e a da sentença penal condenatória recorrível ainda para a defesa. Por fim, a prescrição da pretensão executória, prevista no artigo 110, caput, do Código Penal, é calculada com base na pena efetivamente imposta na sentença penal condenatória, já transitada em julgado, sendo que seu lapso prescricional também é obtido mediante a análise da tabela prevista no artigo 109 do CP, contudo, com base na pena em concreto. 
Ressalta-se, por oportuno, que a prescrição da pretensão punitiva refere-se ao lapso temporal que o Estado tem para a apuração a prática criminal de cada fato delituoso, enquanto que a prescrição da pretensão executória diz respeito ao prazo para cumprir a pena que já aplicada na sentença penal condenatória irrecorrível. 
As alterações após a Lei 12.234/2010 A mais importante alteração trazida pela Lei 12.234/2010 refere-se à revogação do parágrafo 2º do artigo 110 do Código Penal, que previa a possibilidade de reconhecer a prescrição da pretensão punitiva na modalidade retroativa, que tinha por termo inicial data anterior à denúncia ou queixa, bem como a alteração da redação do § 1º desse mesmo artigo, o qual passou a proibir expressamente a prescrição retroativa. 
Como já mencionado anteriormente, a prescrição da pretensão punitiva retroativa é aquela contada para trás, ou seja, da sentença penal condenatória até o recebimento da denúncia ou queixa, a qual recebe o nome de retroatividade processual, ou então, calculada do recebimento da denúncia ou queixa até a prática do fato delituoso, que recebe o nome de retroatividade pré-processual. Portanto, havia dois cálculos autônomos. 
Ocorre que com o advento dessa novel lei, a prescrição da pretensão punitiva retroativa não acabou por completo, isto porque a lei apenas vedou, na nova redação do artigo 110, § 1º, do Código Penal, a prescrição que tenha por termo inicial data anterior à da denúncia ou da queixa. 
Ou seja, proibiu a prescrição retroativa pré-processual, aquela que poderia ser alegada pela demora na fase investigativa policial, contada da data do fato até o recebimento da peça acusatória, senão vejamos sua nova redação: Art. 110, § 1º. A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada, não podendo, em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa. 
Como se vê, continua existindo a prescrição da pretensão punitiva processual, vale dizer, aquela que ocorre entre a data do recebimento da denúncia ou queixa até a sentença condenatória com TJ para a acusação, contada para trás. 
A doutrina e a crítica do legislador A doutrina mais atenta aponta para o descuido do legislador ao sancionar e publicar a Lei 12.234/2000, com a redação do artigo 110, parágrafo 1º, no que concerne à proibição expressa de prescrição que tenha por termo inicial data anterior "à da denúncia ou queixa". Isto porque o projeto original, desse mesmo dispositivo, vedava a prescrição que tenha por termo inicial data anterior "à da publicação da sentença ou do acórdão". 
Essa redação sim extinguiria por total a prescrição da pretensão punitiva retroativa, o que de fato, não ocorreu. Em síntese, a nova redação do artigo 110, paágrafo 1º, do CP, não vedou o reconhecimento da prescrição com base na pena aplicada na sentença penal condenatória, seja transita em julgada para a acusação seja pelo fato de seu recurso ser improvido, verificada entre o recebimento da denúncia/queixa e a data da publicação da sentença ou do acórdão condenatório. 
Ressaltando que a data da publicação da sentença condenatória recorrível interrompe a prescrição, conforme a inteligência do artigo 117, inciso III, do Código Penal. Não obstante, a doutrina alerta para o fato que a nova lei proibiu a prescrição da pretensão punitiva, na sua modalidade retroativa, ou seja, quando já houver sentença condenatória com TJ para a acusação ou se improvido seu recurso, calculada antes do recebimento da denúncia ou da queixa. 
Por outro lado, deve-se observar atentamente para o fato deque de ainda existe a prescrição calculada pelo termo inicial anterior a denúncia ou queixa. Contudo, trata-se da prescrição da pretensão punitiva na sua modalidade abstrata, vale dizer, aquela em que ainda não houver título executivo aplicando a pena em concreto, com base no artigo 109, caput, do Código Penal. 
A título de exemplo, um crime de lesão corporal leve praticado em 2005, com recebimento da denúncia em 2006 e sentença penal condenatória com pena de três meses (pena mínima do artigo 129, caput, CP), já transitada em julgado para a acusação em 2010, prescreve em 3 anos, conforme tabela do artigo 109, VI, do Código Penal. 
Como se vê, nesse caso houve prescrição retroativa pelo decurso do prazo de mais de três anos contados do trânsito em julgado da sentença condenatória e do recebimento da denúncia, o que não foi proibida pela nova lei, visto que essa vedação só se estendeu ao tempo anterior ao da denúncia ou queixa. 
A razão de ser dessa alteração legislativa refere-se ao fim da eternidade da persecução penal processual, vale dizer, a demora do Poder Judiciário não deve ser imposta ao acusado, sob pena de violar o princípio constitucional da razoável duração do processo, disciplinado no artigo 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal e da dignidade da pessoa humana, fundamento de todo o ordenamento jurídico brasileiro. 
Entretanto, essa mesma vedação não se impõe a persecução penal na fase investigativa, ressalvada a prescrição da pretensão punitiva em abstrato, conforme acima mencionado. A proibição da prescrição virtual A prescrição virtual, também chamada de antecipada, projetada ou em perspectiva, era considerada uma derivação da prescrição retroativa, reconhecida na primeira hipótese da prescrição da pretensão punitiva retroativa, ou seja, entre a data do fato até o recebimento da denúncia ou da queixa. 
Esse tipo prescrição era reconhecimento doutrinário e jurisprudencial (nunca teve previsão legal), sendo corriqueiramente utilizado pelo Ministério Público, quando se vislumbra-se, antecipadamente, a possível pena a ser aplicada àquele fato delituoso, calculando-se o prazo prescricional em perspectiva, ou seja, apenas com bases em prognósticos penais. 
Desse modo, verificada a suposta prescrição virtual, o parquet deixava de formular denúncia, requerendo diretamente o arquivamento. Ademais, essa prática também era utilizada pelo juiz, que, verificando sua ocorrência, rejeitava a denúncia com fundamento na ausência de condições da ação, consistente no interesse de agir, diante da inutilidade da máquina judiciária e com base no princípio da economia processual. 
Ocorre que o Superior Tribunal de Justiça sepultou essa discussão, com pá de cal, editando o Enunciado de Súmula 348, vedando a prescrição virtual em nosso ordenamento jurídico, com seguintes dizeres: "É inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética, independentemente da existência ou sorte do processo penal". 
Alteração do prazo mínimo prescricional Outra importante alteração trazida pela Lei 12.234/2010 diz respeito ao prazo mínimo prescricional previsto no artigo 109, inciso VI, do Código Penal, o qual previa a prescrição em dois anos para o crime com pena máxima privativa de liberdade inferior a um ano. Com a mudança legislativa, a prescrição mínima do Código Penal só ocorrerá após o prazo de três anos, o que importa na repercussão da contagem dos prazos prescricionais, ampliando sobremaneira o tempo disposto ao Estado para a apuração das infrações penais. 
Oportuno alertar para a manutenção de duas hipóteses legais em que o prazo prescricional continuará a ser de dois anos. A primeira delas é a da pena de multa quando for a única aplicada ou cominada (artigo 114, I, do CP) e nas multas aplicadas isoladamente nos casos de contravenção penais. A segunda, refere-se à prescrição da pena aplicada ao crime de posse de drogas previsto no artigo 28 da Lei 11.3434/06, em respeito ao princípio da especialidade da legislação especial. 
O direito intertemporal Como se observa, essa nova lei, ao aumentar o prazo prescricional no artigo 109, inciso VI, do Código Penal, possibilitando ao Estado maior tempo para fazer valer seu mister de punir quem viola a lei penal, é desfavorável ao réu, portanto, irretroativa. Desse feita, sua aplicação só poderá repercutir aos fatos praticados após 06.05.2010, sob pena de retroatividade in pejus. 
Dessarte, aos crimes com pena máxima privativa de liberdade até um ano, praticados antes da vigência da Lei 12.234/2010, deverá ser observado o prazo prescricional de anos, conforme a antiga redação do artigo 107, inciso VI, do Código Penal. Não obstante, em relação à prescrição retroativa também deve se observar que a nova lei nada mais é do que novatio legis in pejus, portanto, aos delitos praticados antes de maio de 2010, pode ser reconhecida a prescrição retroativa ocorrida antes do recebimento da denúncia ou da queixa. 
Em linhas gerais, foi possível verificar as alterações trazidas pela Lei 12.234/10, no que concerne à extinção da prescrição da pretensão punitiva retroativa e quanto ao prazo prescricional mínimo previsto na tabela do artigo 109 do Código Penal, que passou a ser de três anos, para os crimes com pena máxima inferior a um ano, bem foi analisado o reflexo dessas modificações no direito intertemporal, por ser ela uma novatio legis in pejus. 
A abordagem principal refere-se à crítica da doutrina quanto a não extinção total da prescrição retroativa, uma vez que a novel lei apenas vedou expressamente a possibilidade de considerar prescrito o lapso temporal anterior ao recebimento da denúncia ou da queixa. 
Portanto, conclui-se que a nova lei apenas extinguiu parte da prescrição retroativa, aquele que ocorria na anterior ao processo. Em outras palavras, continua a existe a existir a prescrição retroativa calculada entre a data do recebimento da denúncia ou da queixa e a data da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou quando improvido seu recursos. 
Dessa forma, com o fim da parte da prescrição retroativa anterior ao ato de recebimento do juiz da peça acusatória, bem como com a nova Súmula 348 do Superior Tribunal de Justiça, acabou de vez a possibilidade da aplicação da chamada "Prescrição Virtual"


Bibliografia 
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. Volume I. 12ª. ed. Niterói: Impetus, 2010. 
CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Volume I. 6ª. ed. Saraiva, 2003. Delmanto, Celso. Código Penal Comentado. 6ª. ed. Renovar, 2002. GOMES, Luiz Flávio. Lei nº 12.234/2010: mudanças na prescrição penal. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2514, 20 maio 2010. 
Disponível em: . Acesso em: 22 abr. 2011. CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Prescrição Penal e Alterações da Lei 12.234/10. Disponível em http://www.lfg.com.br. 02 de junho de 2010. Acesso em: 23 de abril de 2011. Por Myrian Pavan. Advogada, pós-graduada em Direito Civil, Difusos e Coletivos, em Direito Ambiental - Desenvolvimento Sustentável e em Direito Público, com ênfase em Direito Processual Civil

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