A palavra hipócrita veio do grego e designava, a princípio, apenas um ator, um comediante, um histrião, sem as conotações intensamente negativas – de falsidade, dissimulação, fingimento – que hoje estão grudadas nela. Ou melhor: o fingimento estava lá, mas era exercido em nome de uma causa nobre, a de entreter o público.
Todos os filólogos concordam sobre a origem do vocábulo hipocrisia: o grego tardio hypokrisía, com ou sem a intermediação do latim hypocrisis. O dicionário Saraiva define assim o substantivo latino: “elocução, declamação; arte, habilidade para imitar a fala, gestos e modos de uma pessoa”.
Há alguma controvérsia sobre os sentidos primitivos que deram origem à acepção moderna de hipócrita. O Houaiss registra a acepção grega de “intérprete de um sonho, de uma visão; adivinho, profeta” como anterior à de ator – o que pode sugerir uma raiz de charlatanismo para o dissimulado de hoje.
No entanto, o etimologista catalão Joan Corominas liga a hipocrisia diretamente ao trabalho de interpretação de uma peça, sem a interferência de profetas ou adivinhos, ao derivar o termo grego de hypokrínomai, “diálogo”.
Seja como for, é certo que ao desembarcar em português no século XIV a palavra hipócrita já trazia consigo, pronta, a acepção que hoje vemos atribuída com frequência a políticos e outros fingidores. O passo decisivo para a consolidação desse sentido foi, segundo o Saraiva, o uso do vocábulo latino por São Jerônimo (cerca de 347-420), padre e erudito, para designar um tipo bem específico de “ator”: o falso bom cristão, o devoto fingido.
Em tempo: o grego Hipócrates, conhecido como “pai da medicina”, não tem nada a ver com isso.
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