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quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Integrantes e ex-membros da cúpula da segurança estadual respondem por irregularidades no pagamento de gratificação exclusiva da banca examinadora do Detran. Indiciados negam


O inquérito que apura o envolvimento de 121 servidores públicos, a maioria policiais civis, no desvio de recursos destinados exclusivamente a integrantes da banca examinadora de candidatos a motoristas do Departamento de Trânsito (Detran/MG) em Belo Horizonte tem entre os indiciados vários integrantes da cúpula de segurança pública no estado, alguns já aposentados. No documento, em análise pelo Ministério Público, aparecem delegados que ocuparam cargos de secretário de Segurança, chefe da Polícia Civil e do Detran/MG, e até um ex-corregedor da corporação. O ex-delegado Edson Moreira, atualmente vereador em BH, também foi indiciado. Todos são acusados de crime contra a administração pública por peculato, na modalidade desvio, conforme o artigo 312 do Código Penal. O inquérito cita também o hoje deputado federal Mauro Ribeiro Lopes (PMDB), que foi titular da Secretaria de Segurança.
As irregularidades apuradas pela corregedoria ocorreram entre 2001 e 2003, quando o delegado Oto Teixeira Filho era chefe do Detran, ocasião em que foi instituído o regimento interno da Comissão Examinadora. Segundo as investigações, Oto era o responsável por incluir e excluir nomes de servidores para o pagamento de honorários da banca examinadora, no entendimento da Corregedoria sem qualquer critério. Os honorários eram concedidos a “servidores que não tinham nenhum vínculo com a banca, sendo feito (o processo de concessão de benefícios) de maneira graciosa e por apadrinhamento, amizade ou aproximação”, dizem os autos.
As investigações apontam que os acusados de receber irregulamente tinham direito a quantias diferentes, não havendo justificativa para pagamentos desiguais, já que em depoimentos eles disseram exerecer a mesma função. De acordo com a Corregedoria, o Decreto Estadual 33.335/92, que é apontado como base legal para justificar as ações dos acusados, não previa as figuras de fiscal e coordenador da banca examinadora, que justificaram pagamentos a vários servidores. “Portanto, nenhum honorário de banca examinadora poderia ser pago a quem detinha tais funções enquanto durasse a vigência do decreto”, concluiu o inquérito.
De acordo com os autos, não foram constatados registros das fiscalizações que servidores, entre eles delegados de polícia do mais alto nível da carreira, e integrantes do Conselho Superior de Polícia Civil, afirmam ter realizado. “Todo ato administrativo, a não ser os emergenciais, deve ser precedido de legalidade e previsão. Ainda que tenham comparecido aos locais de exames para exercer as fiscalizações, não havia previsão legal para tanto”, diz o inquérito.
FISCAL SECRETO
Entre os indiciados, o delegado aposentado Oto Teixeira Filho foi chefe do Detran na época das irregularidades e cabia a ele nomear os supostos fiscais nas bancas que aplicavam o exame prático de direção. O ex-chefe da Polícia Civil disse em inquérito que criou o cargo de “fiscal secreto” para apurar possíveis irregularidades nos exames. Disse que esses fiscais só fariam relatórios se algo errado fosse encontrado, mas não apresentou esses relatos, apesar de ter dito que o número de denúncias caiu no período. A Corregedoria sustenta que as nomeações eram ilegais. O ex-delegado preferiu não se posicionar sobre o assunto até ser intimado. “Não tenho conhecimento dos fatos”, disse.
O deputado federal Mauro Ribeiro Lopes (PMDB) não foi indiciado, por ter foro privilegiado, mas foi apontado pela Corregedoria como sendo quem indicava nomes de beneficiários dos bônus, usando o cargo de secretário. Os corregedores sugerem o encaminhamento do caso à Procuradoria Geral da República. O parlamentar negou conhecimento ou envolvimento em possíveis irregularidades. “Não era sequer secretário na época. Saí em 2000 e as apurações são de 2003. O Detran tem arrecadação própria e só seu diretor é que decide como é empregada, e não o secretário. Estão querendo promoção sobre o meu nome”, disse, ontem.
Outro ex-secretário de Segurança, Márcio Barroso Domingues, foi indiciado no inquérito da Corregedoria, não por ter recebido indevidamente honorários, mas por não ter impedido as irregularidades. O Estado de Minas fez contato telefônico com a casa de Barroso, onde a informação era de que ele estava em um sítio, onde não havia sinal de celular. O ex-secretário não retornou o telefonema.
O ex-delegado Edson Moreira, vereador em BH pelo PTN, foi indiciado sob acusação de receber ilegalmente honorários de fiscal de banca sem ter exercido a função. Em depoimento, Moreira disse que escolhia os locais onde ocorreria a fiscalização e elaborava relatórios, mas, segundo a Corregedoria, nenhum relato foi encontrado, nem ato oficial de nomeação. O EM procurou a assessoria do vereador, ontem, mas não obteve retorno.
Chefe da Polícia Civil até março do ano passado e ex-chefe do Detran, o delegado Jairo Lellis Filho também aparece no inquérito da Corregedoria como um dos fiscais secretos, também sem registro de nomeação. Ainda segundo a investigação, o delegado alegou ter presidido o Conselho Estadual de Trânsito para justificar o recebimento, mas os argumentos não foram considerados válidos. O EM ligou para a casa de Lelis e deixou recados, mas não houve retorno.
O delegado Marco Antônio Monteiro de Castro, ex-chefe da Polícia Civil e atual diretor da academia da corporação, foi indiciado após afirmar que prestou serviço na assessoria jurídica do Detran. Deixou o departamento em janeiro de 2003. De acordo com os autos, recebeu honorários ilegais, por não ter vínculo com a banca examinadora. O delegado foi procurado, mas não retornou as ligações.
Chefe do Detran se diz surpreso
“Um equívoco de interpretação da legislação.” Foi como o atual chefe do DeDetran/MG, delegado Oliveira Santiago Maciel, definiu a motivação para as denúncias de desvio de recursos da banca examinadora de Belo Horizonte entre 2001 e 2003. Ontem à tarde, Oliveira disse que, a partir do Decreto 33.335/92, foi criado o regimento da banca examinadora, do processo de habilitação e controle do condutor. Segundo ele, os honorários da Comissão Examinadora não se restringiam a examinadores, mas também a servidores administrativo, digitadores, secretários das bancas, entre outros.
No inquérito, Oliveira Santiago é apontado pela Corregedoria como responsável pela elaboração das listagens e processamentos de despesas, em apoio ao gabinete do chefe do Detran, na época o delegado Oto Teixeira Filho. Ele teria dado à regra vigente à época a interpretação de que a banca examinadora não abrangia somente servidores que lidavam com o candidato à CNH, mas também as atividades de controle do condutor. Para a Corregedoria, um ato sem previsão legal.
“Não conheço os autos, não fui notificado. Entretanto, esse indiciamento é no mínimo muito estranho para mim. E trouxe muita indignação, primeiro porque nunca exerci qualquer atividade na banca examinadora do Detran. Portanto nunca recebi um centavo sequer de honorários. Nunca tive autonomia para incluir ou excluir qualquer pessoa servidora na banca examinadora”, afirmou.
O chefe do Detran acrescentou que foi ouvido como testemunha no inquérito em 2005, para explicar como funcionava a banca. “Foi surpreendido com a imprensa falando de meu indiciamento. Se no decurso desse inquérito surgiu algum indício, deveria ter sido reinquerido”, disse ele, que não descarta que podem ter havido falhas, que não chegaram ao seu conhecimento.
O governo do estado informou que o delegado Santiago Oliveira não será afastado devido ao indiciamento no inquérito. Informou também que acompanha com o máximo interesse o desenrolar do caso no Ministério Público estadual.
Em nota, a Polícia Civil confirmou ontem que o inquérito da Corregedoria apontou que critérios usados pelo Detran para pagamento de honorários teriam ocorrido em desacordo com a legislação em 2001 e 2002. E que, diante da constatação, o delegado responsável pelo caso indiciou por crime contra a administração pública os servidores, entre eles policiais e administrativos.
“Como em todos os procedimentos da corregedoria legitimados pela Lei Orgânica da instituição, a Polícia Civil acompanha com o devido interesse público a tramitação do caso no âmbito da Justiça, a quem cabe agora acatar ou não, no todo ou em partes, a apuração concluída pelo órgão corregedor”, informa a nota.

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