Patrícia Vianna atua na ONG do complexo de favelas há 12 anos e cita denúncias de abuso por parte de policiais do Bope na região
“Isso aqui é um verdadeiro espetáculo”, aponta Patrícia Vianna, enquanto policiais colocam crianças sobre os cavalos na típica tentativa de aproximação do poder público junto aos moradores, na Vila dos Pinheiros. Diretora há 12 anos da Redes da Maré, ONG que atua no complexo de favelas da zona norte do Rio de Janeiro, ocupado pelas forças de segurança do Estado desde as primeiras horas deste domingo, Patrícia vê com reticência a chegada efetiva do Estado na região.
“É algo que nós só saberemos se vai mudar mesmo a vida das pessoas depois de um tempo”, analisa a agente social, um dos cinco diretores que atuam na ONG, fundada há 15 anos e que estimula ações culturais nas 15 comunidades que formam a Maré. “Se for para melhorar a nossa segurança, ok”, complementa.
Mais de mil policiais ocupam o complexo da Maré no primeiro passo para a chegada do Exército, que ocupará a região até depois da Copa do Mundo, quando o efetivo policial será formado para atuar dentro das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) a serem montadas em localidades ainda não definidas do conjunto de favelas.
A principal crítica em torno do projeto das UPPs diz respeito, justamente, a falta de projetos sociais por parte do Estado, que ocupa o território, mas não proporciona alternativas culturais, principalmente, para quem viveu anos sob o domínio do tráfico. O projeto das UPPs sociais, por exemplo, nunca saiu do papel. Neste contexto, Patrícia espera que a Redes da Maré possa ampliar ainda seu leque de opções para os moradores das comunidades.
“Essa é uma função do Estado, não nossa, vale lembrar”, ressalta. “Mas a gente nunca deixou de atuar, existem, aliás, várias outras ONGs. Só nós temos mais de 30 projetos em execução por aqui. Espero, sim, que a gente possa de alguma forma melhorar mais a vidas das pessoas que vivem por aqui”, falou.
De acordo com a diretora da Redes da Maré, o mais importante neste momento inicial de ocupação é que os moradores tenham seus direitos respeitados no processo de varredura por parte dos policiais do Bope, principalmente. A ONG já recebeu diversas denúncias de abuso por parte dos PMs nas revistas dentro das residências.
“A gente questionou, mas eles (policiais) negam tudo. Teve gente relatando que policiais expulsaram moradores de algumas lajes para poderem ficar em pontos estratégicos. Isso é um absurdo”, afirma. “Por isso, acionamos a Corregedoria da PM e a Comissão de Direitos Humanos da Alerj para que isso possa ser apurado”, explica ainda.
Ocupação da Maré
Reduto do crime organizado do Rio de Janeiro, o complexo de favelas da Maré, na zona norte da capital fluminense, foi ocupado nas primeiras horas deste domingo pelas forças de segurança do Estado no primeiro passo para a instalação de Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) na região que compreende 15 favelas no total, com aproximadamente 130 mil moradores.
Segundo a Secretaria de Estado de Segurança, “as comunidades foram recuperadas pelas forças policiais sem encontrar resistência, o que permitiu o domínio dos pontos planejados dos territórios em 15 minutos”. Policiais continuam nas comunidades em operações de busca de criminosos, apreensões de armas, drogas e objetos roubados.
Participam da operação 1.180 policiais militares de várias unidades, entre elas o Batalhão de Choque e do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope), além de policiais da Corregedoria Interna da PM. O Bope ocupa as favelas Nova Holanda e Parque União, enquanto que o Batalhão de Choque as outras 13 favelas. Da Polícia Civil, o efetivo no local é de 132 pessoas. Uma base móvel do Instituto Félix Pacheco está instalada no 22º BPM (Maré) para fazer a identificação biométrica de suspeitos.
Além disso, os policiais militares usam 14 blindados disponibilizados pela Marinha e um blindado do Batalhão de Polícia de Choque. Agentes do Comando de Operações Táticas da Polícia Federal e do Núcleo de Operações Especiais da Polícia Rodoviária Federal apoiam a operação.
De acordo com a Secretaria de Estado de Segurança do Rio de Janeiro, as comunidades que fazem parte do Complexo da Maré e serão ocupadas são: Praia de Ramos, Parque Roquete Pinto, Parque União, Parque Rubens Vaz, Nova Holanda, Parque Maré, Conjunto Nova Maré, Baixa do Sapateiro, Morro do Timbau, Bento Ribeiro Dantas, Vila dos Pinheiros, Conjunto Pinheiros, Conjunto Novo Pinheiros (Salsa&Merengue), Vila do João e Conjunto Esperança.
O intuito da secretaria de Segurança Pública do Estado é abrir espaço para a entrada do Exército no local, que a exemplo do que ocorreu no complexo de favelas do Alemão, fará a ocupação do local até que o efetivo da Polícia Militar forme o novo efetivo para atuar na Maré – o acordo foi feito junto com ao Ministério da Justiça por intermédio do secretario José Mariano Beltrame e o governador Sérgio Cabral.
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