Política
Wadih Damous (*)
postado em: 16/11/2014
A presidente Dilma Roussef, logo em seu primeiro pronunciamento depois de conhecido o resultado eleitoral, reafirmou seu compromisso com a realização de uma reforma política. Isso se explica: a modificação das regras que norteiam o funcionamento das eleições e dos partidos pode aperfeiçoar, e muito a democracia no país.
Mas a reforma política não é uma tarefa simples. A rigor, ela não é exatamente uma proposta, mas um tema. Nele, cabem as mais diversas sugestões. Umas boas, outras, nem tanto. Para que se tenha uma ideia, até mesmo a proposta de volta à monarquia – que não passa pela cabeça de alguém de bom senso - poderia ser apresentada no debate. E, se todos concordam em que a reforma política é necessária, as divergências se afloram quando as propostas começam a ser explicitadas.
A primeira questão essencial, ao se tratar de reforma política, é a mudança das formas de financiamento das campanhas e dos partidos, de forma a coibir a gigantesca influência do poder econômico nas eleições.
Durante muito tempo a esquerda defendeu o financiamento público exclusivo, com o argumento de que isso poderia inibir o toma-lá-dá-cá. E, por isso, no fim das contas acabaria mais barato para a sociedade do que o atual sistema em que muitos dos eleitos acabam retribuindo a ajuda que receberam na campanha de formas que acabam saindo caro para o poder público.
Isso não deixou de ser verdade, mas a proposta perdeu força. Dado o desgaste dos políticos, a opinião pública tenderia a rechaçar a hipótese de que se dê mais dinheiro para partidos ou campanhas eleitorais. No lugar dessa sugestão, surgiu outra, essa sim capaz de ser bem compreendida pela sociedade: limitar os financiamentos de pessoas físicas e impedir os financiamentos de empresas.
Um conjunto de entidades, capitaneadas pela OAB e a CNBB, apresentou proposta ao STF para que fossem proibidas doações de pessoas jurídicas a candidatos ou partidos. A proposta está praticamente aprovada, pois seis dos 11 integrantes do STF já votaram a favor, o que garantiria a aprovação. No entanto, o ministro Gilmar Mendes pediu vistas do processo, supostamente para preparar melhor seu voto.
Com isso, a votação foi interrompida. Até que Gilmar devolva o processo, está tudo parado. De qualquer forma, mais dia, menos, dia as doações de empresas acabarão proibidas. Isso já será um importante passo para coibir a influência do poder econômico nas eleições.
Outra questão que deverá ser tratada por uma reforma política digna deste nome é a proporcionalidade na representação da Câmara dos Deputados. A legislação determina um limite máximo de 70 e um piso de oito representantes por estado. Isso distorce a representação, que passa a não ser proporcional ao eleitorado de cada unidade da Federação. São Paulo, o estado mais populoso, tem a representação rebaixada para o teto de 70 deputados. Acre, Amazonas, Amapá, Distrito Federal, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Norte, Rondônia, Roraima, Sergipe e Tocantins, que, pela proporcionalidade, teriam direito a menos de oito deputados federais, acabam elegendo os oito, que é o piso legal. Essa injustificável distorção na representação dos eleitores na Câmara em que ser corrigida.
Ainda no que se refere ao Congresso, há a questão do Senado, cuja existência agrava a distorção na representação popular. Nele, cada estado tem três representantes, se trate de um estado com grande eleitorado, como São Paulo ou Minas, ou com eleitorado pequeno, como Roraima ou Rondônia.
A justificativa para a existência do Senado é que ele representa a federação. Só que, na prática, a Casa funciona como uma câmara revisora e todos os projetos aprovados pelos deputados têm que passar por ela para se transformarem em lei. Por isso, uma reforma política digna desse nome deve extinguir o Senado ou, pelo menos, restringir as suas funções, para que ele se manifeste apenas em assuntos que digam respeito à Federação.
Outro debate necessário é sobre a forma da eleição proporcional (para deputados ou vereadores). O sistema atual transforma os candidatos de cada partido em adversários entre si e enfraquece os partidos. A alternativa anteriormente apresentada previa que cada partido apresentaria uma lista fechada e os eleitores votariam na lista partidária. Dependendo do número de votos, seria eleita certa quantidade de candidatos da lista na ordem em que eles fossem apresentados. O sistema fortaleceria os partidos, mas deixaria nas mãos das direções de cada partido a escolha dos eleitos, fortalecendo a burocracia partidária.
Surgiu, porém, uma proposta que resolve essa questão: a realização das eleições proporcionais em dois turnos. Segundo esse modelo, sugerido pela OAB, a CNBB e outras entidades, a eleição de deputados federais e estaduais e de vereadores passaria a ser feita em dois turnos. No primeiro, o eleitor escolheria um partido; no segundo, já definido o número de vagas a que cada legenda teria direito, com base na votação recebida no primeiro turno, o voto seria dado num nome, a partir de uma lista apresentada por cada partido com o dobro de candidatos em relação ao número de vagas a que o partido tem direito.
Esse modelo fortaleceria os partidos, ao instituir o voto em lista, mas não deixaria nas mãos das burocracias partidárias a escolha dos eleitos.
E ainda acabaria com um problema que ocorre hoje, quando milhares de candidatos disputam cada vaga, confundindo a cabeça dos eleitores e tornando o horário eleitoral um mosaico de excentricidades.
(*) Advogado
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