Para o Ministério Público do Pará, exigências legais, como a necessidade de obras de saneamento para os novos moradores da região, foram ignoradas. Senador que acompanha as obras admite afrouxamento das normas
Flexa Ribeiro admite que Ibama relevou algumas exigências para acelerar o licenciamento ambiental de Belo Monte |
A mais polêmica obra do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), a usina hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, no Pará, enfrentará uma nova etapa de pressões contrárias à sua construção nos próximos dias. Após a emissão da licença ambiental para início das obras, concedida pelo Ibama na última quarta-feira (2), o Ministério Público Federal do Pará estuda medidas judiciais para “atacar irregularidades” do processo de licenciamento ambiental de instalação do empreendimento.
As pendências mais graves, segundo o Procurador Geral Cláudio Terre do Amaral – um dos responsáveis pelas recomendações do MPF para não emissão da licença – se referem às obras de saneamento básico, necessárias para receber novos moradores na região, e às ações relacionadas à resolução de conflitos nas terras indígenas.
“Nossas conclusões preliminares mostram que há várias condicionantes que estão pendentes de cumprimento, que são condicionantes da licença prévia. Assim que a gente chegar à conclusão a respeito dos pontos, nós vamos aplicar a medida judicial para atacar irregularidades”, afirmou Amaral ao Congresso em Foco.
As pendências relacionadas às obras de saneamento inacabadas e aos conflitos em terras indígenas estão descritas no último parecer técnico do Ibama, que serviu para subsidiar a decisão de liberar o início da construção de Belo Monte. No parecer, técnicos concluem que programas de caráter antecipatório – medidas que devem ser feitas antes do início das obras de instalação da hidrelétrica – não foram implantados.
Apesar do não cumprimento de várias condicionantes prévias, o Ibama considerou suficiente o que foi feito até agora. Na tarde de ontem (1º), após a concessão da licença, o presidente do Ibama, Curt Trennepohl, afirmou serem “satisfatórias” todas as ações e programas feitos até o momento. Curt reconheceu que muitas das medidas para reduzir impactos ambientais e socioeconômicos não foram cumpridas, mas alegou que o órgão teve “segurança técnica e jurídica” para emitir a licença.
Flexibilização
Na avaliação do presidente da Subcomissão de Acompanhamento das Obras de Belo Monte do Senado, senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA), o Ibama flexibilizou as normas da legislação ambiental brasileira para emitir emergencialmente a licença de instalação das obras da usina. Segundo Flexa Ribeiro, era necessário emitir a licença antes do início do período das chuvas (em novembro), para que não houvesse atrasos na construção da hidrelétrica.
“O próprio Ibama ao conceder a licença reconhece que as condicionantes não atendidas poderão ser feitas em paralelo com o início da implantação do projeto principal, que é a barragem”, afirmou o senador paraense. “Se esperássemos completar o sistema de saneamento para iniciar as obras, teríamos energia só lá para 2018. Foi uma flexibilização que o Ibama fez, mas necessária aos interesses da nação brasileira”, disse Flexa. O prazo de início do fornecimento de energia elétrica de Belo Monte é 2015.
Para Flexa Ribeiro, é importante que se entenda que na Amazônia os empreendimentos precisam trabalhar com a variável do clima. O senador defendeu que o objetivo da subcomissão passa a ser acompanhar e cobrar que as medidas necessárias para instalação de um empreendimento sustentável sejam cumpridas. “O Senado passa a ser vigilante no cumprimento das exigências estabelecidas nas condicionantes. Se houver desvios de conduta, o Senado será o primeiro a solicitar a paralisação das obras”, disse.
Alertas
O estudo de impactos ambientais de Belo Monte alerta que a implantação de um empreendimento do porte da nova usina deverá provocar transformações significativas na região no que tange, especialmente, ao aumento da demanda por habitação, saneamento, energia, transporte, saúde, educação e segurança. Somente no município de Altamira, onde será instalada a usina, espera-se que a população local passe de 107 mil pessoas para 203 mil habitantes.
Relatório da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado, elaborado a partir da diligência de uma equipe de senadores, representantes do Ministério Público e entidades da sociedade civil feita em abril, aponta que 100% da população de Altamira não recebe água potável em suas residências. De acordo com o relatório, a estação de águas do município, que não atende sequer 30% da população local, não tem condições de realizar a filtragem da água coletada, nem incluir substâncias como cloro e flúor, necessárias para melhorar a qualidade da água.
“Muita coisa já deveria ter sido feita, e o plano fala em fazer no futuro. Isso deixa claro que a coisa está na metade. Estamos dando um cheque em branco”, afirma o diretor do Programa Amazônia da entidade International River, Brent Milikan. “E sabemos que não precisa nem começar a construção, basta anunciar que vai acontecer, que você já tem pressões sobre a região, como especulação fundiária, violência e outros conflitos. Isso já está comprovado historicamente”, afirma.
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