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sexta-feira, 10 de junho de 2011

Nova batalha ambiental opõe ministérios no Congresso


Projeto da deputada Rebecca Garcia que propõe compensações financeiras para quem preserva coloca em campos opostos Itamaraty e Ministério do Meio Ambiente
Beto Oliveira/Câmara
Projeto da deputada Rebecca Garcia coloca em campos opostos Ministérios do Meio Ambiente e Relações Exteriores
Renata Camargo
Pouco presente no debate ambiental político no Congresso nos últimos anos, o governo federal tenta agora retomar o controle de projetos de lei importantes que podem melhorar ou piorar a imagem do Brasil no exterior. Após a atropelada votação do novo Código Florestal no mês passado na Câmara, uma nova batalha florestal toma conta das discussões ambientais no Congresso e coloca em relações estreitas os ministérios do Meio Ambiente e das Relações Exteriores.
Leia tudo sobre o Código Florestal

A causa é o Projeto de Lei 195/2011, aprovado ontem (8) na Comissão de Meio Ambiente da Câmara, com apoio da pasta ambiental do governo, mas com ressalvas por parte do Itamaraty. A proposta regulamenta em todo o país o sistema de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação, conservação e manejo florestal sustentável (REDD). De nome complicado e complexidade técnica, o sistema de REDD, na prática, corresponde a uma forma de garantir recursos financeiros para aqueles que deixarem a floresta em pé, sem desmatar.
“A nossa legislação ambiental é extremamente rica, mas é muito pensada para situações onde a mata não foi preservada. Hoje, não se tem como premiar aquele que deixou sua floresta em pé. No caso da Amazônia, em especial do estado do Amazonas, que tem 98% de suas florestas preservadas, a pessoa não se vê contemplada, uma vez que preservou. O REDD vem suprir essa necessidade, criando mecanismos para levar recursos para quem preserva”, disse ao Congresso em Foco a deputada Rebecca Garcia (PP-AM), autora do projeto.
Impasse
O projeto foi aprovado por unanimidade pela Comissão de Meio Ambiente, após semanas de votações adiadas por pressão de parte do governo.  Na tarde de ontem, depois da aprovação na comissão, o deputado governista Dr. Rosinha (PT-PR) apresentou um requerimento para que a matéria tenha o conteúdo apreciado também pela Comissão de Relações Exteriores da Câmara.
Segundo o parlamentar, para o Itamaraty é prematuro que o Brasil tenha uma regulamentação sobre o sistema de REDD neste momento, já que ainda não há um entendimento internacional  “sobre metodologias que sejam capazes de assegurar solidez” a esse tipo de mecanismo. Mas, segundo a deputada Rebecca Garcia, a posição da pasta internacional do governo é contrária ao posicionamento do Ministério do Meio Ambiente, que defende que o país precisa ser protagonista neste processo.
“Não podemos parar um assunto que está sendo debatido no Congresso, em função de decisões internacionais que queremos que aconteçam. Não podemos estar pautando as decisões do Congresso Nacional pelo que vai ser discutido quiçá um dia nos fóruns internacionais. Nós parlamentares entendemos que não só é o momento de aprovar o projeto, como já está tarde”, defendeu Rebecca.
O PL do REDD ainda precisa passar pelas comissões de Finanças e Tributação e de Constituição e Justiça, em caráter terminativo, e ser votada no Senado. A decisão sobre a necessidade de uma quarta comissão analisar a proposta cabe ao presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS). Se acatado, o requerimento do deputado Dr. Rosinha vai prorrogar as discussões da matéria no Congresso. A intenção do Ministério do Meio Ambiente é apresentar uma lei de REDD do Brasil na Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável (RIO +20), que ocorrerá no Rio de Janeiro em junho de 2012.
“A questão do REDD vai aumentar a pressão internacional sobre o Brasil em relação à preservação de nossas florestas. O Itamaraty é contra votar esse projeto agora, porque ainda não há um entendimento internacional com solidez sobre o REDD. Como essa negociação também é um tema internacional, então a Comissão de Relações Exteriores precisa analisar como mérito. Precisamos ganhar tempo”, justificou o Dr. Rosinha.
Floresta em pé
O desmatamento é responsável por mais de 70% das emissões brasileiras de gases do efeito estufa, como o gás carbônico (CO2). Para o relator do projeto na Comissão de Meio Ambiente, deputado Ricardo Tripoli (PSDB-SP), ao remunerar a preservação das florestas, o sistema de REDD ajudará a conter o desmatamento no país e a reduzir as emissões brasileiras. Na prática, o sistema cria uma espécie de mercado de carbono interno, em que os créditos por reduzir emissão de gases podem ser negociados, por exemplo, em Bolsas de Valor.
De acordo com a proposta, podem ser beneficiadas pelas políticas, programas e projetos de REDD indivíduos ou grupos com propostas de preservação em áreas de florestas em terras indígenas, unidades de conservação, territórios quilombolas, assentamentos rurais de reforma agrária e propriedades privadas.  No caso das propriedades privadas, o governo costurou uma mudança no projeto para assegurar que a remuneração do REDD para áreas de reserva legal e de preservação permanente (APPs) dependam de regulamentação posterior do Executivo.
Pelo projeto, o funcionamento do sistema de REDD dependerá também de que o índice de desmatamento anual nacional do país esteja abaixo do índice histórico de desmatamento no Brasil. Se o índice de desmatamento em um determinado ano for acima dos níveis históricos, não haverá unidades de redução (medidas de REDD) para que os projetos de preservação sejam remunerados. “Se aumentar o desmatamento no país, não tem REDD”, afirmou a autora do projeto.
Soberania
Na tarde de terça-feira (7), o secretário-geral da ONU para a Rio +20, Sha Zukang, participou de uma reunião com parlamentares no Senado. Na ocasião, o secretário disse estar “impressionado” com a agilidade do Brasil em relação a temas como o REDD. Sha Zukang reforçou ainda que as florestas brasileiras são de “soberania” dos brasileiros. “A pressão internacional sobre a proteção das nossas florestas existe, mas ninguém está colocando dinheiro aqui. Se a gente tem que preservar, tem que dividir a conta”, defendeu Rebecca.
Pelo projeto, o sistema de REDD poderá ser financiado por fundos nacionais como o de Mudanças do Clima, o da Amazônia e do Meio Ambiente, além de recursos provenientes de acordos bilaterais ou multilaterais sobre clima e acordos decorrentes de ajustes, contratos de gestão e convênios celebrados com órgãos brasileiros. Também podem virar recursos para o REDD no Brasil doações e verbas do Orçamento da União.
A construção do projeto de lei do sistema de REDD no Congresso surgiu a partir do esforço dos governadores dos estados da Amazônia no ano passado. Na ocasião, eles procuraram o então presidente Lula para pedir uma regulamentação nacional sobre o tema. O país já possui projetos estaduais de REDD, como é o caso do Bolsa Florestal, no estado do Amazonas, mas ainda falta um marco regulatório.

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