[Artigo publicado na edição deste sábado, 18 de junho de 2011, no jornal O Globo]
Em um Estado democrático de Direito, há de observar-se a ordem jurídica. O respeito deve vir tanto dos cidadãos em geral como do Estado, do qual é aguardada postura exemplar. Políticas governamentais são potencializadas e nem sempre isso se verifica quanto a valores básicos. Em verdadeira atuação de força, míope ante os ares da Constituição Federal, parte-se para o menosprezo a interesses maiores, sendo alcançados contribuintes e servidores, toda a sociedade, enfim.
O fator de equilíbrio está na própria Carta da Republica, a que todos, indistintamente, se submetem. A falha das autoridades constituídas, intencional ou não, fez surgir, com papel insuplantável, segmento equidistante, não engajado nesta ou naquela política governamental, que é o Judiciário. Preserva o Direito e, por esse motivo, torna-se o destinatário das esperanças dos que se sentem espezinhados, dos que sofrem as consequências danosas do desprezo a interesses legitimamente protegidos. É o que vem acontecendo, ano a ano, e nas três esferas federal, estadual e municipal, relativamente à equação serviço a ser implementado e remuneração dos servidores públicos.
Embora a Constituição Federal imponha a revisão anual dos vencimentos dos servidores, isso não ocorre, havendo a diminuição do poder aquisitivo. O servidor já não recebe o que recebia inicialmente, com desequilíbrio flagrante da relação jurídica, vindo o setor público, mediante perverso ato omissivo, alcançar vantagem indevida os mesmos serviços geram vencimentos que já não compram o que compravam anteriormente.
Até aqui, vinga, em verdadeira confusão terminológica, a ótica de estar o reajuste sujeito à previsão em lei, apesar de não se tratar de aumento, apesar de o próprio Diploma Maior já contemplar os parâmetros a serem observados, ficando afastada a opção político-normativa concernente à lei: a reposição do poder aquisitivo da moeda o reajuste deve ser anual, no mesmo índice, que outro não é senão o indicador oficial, da inflação do período. Não existe razão suficiente para cogitar da necessidade de lei, a não ser que se potencialize a forma pela forma.
O quadro conduz ao abalo da paz social, como acabou de acontecer no lamentável episódio do Rio de Janeiro, envolvendo policiais militares bombeiros.
Na última trincheira da cidadania, o Supremo, teve início o julgamento da matéria. Coincidentemente, policial civil de São Paulo reivindica o reconhecimento da responsabilidade do Estado ante a omissão, ante a incúria, do poder público, pleiteando a correlata verba indenizatória. Relator do recurso, pronunciei- me pelo acolhimento da pretensão, seguindo-se o pedido de vista da ministra Cármen Lúcia.
Que prevaleça a concretude da Constituição Federal, alertados os agentes políticos sobre as graves consequências do menosprezo às regras jurídicas, do menosprezo à dignidade dos cidadãos. Somente assim, avançar-se-á culturalmente.
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