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terça-feira, 27 de maio de 2014

Geraizeiros pedem preservação de seu modo de vida


Comunidades tradicionais de Diamantina fizeram a reivindicação em audiência pública da ALMG, desta segunda-feira (26).

A audiência aconteceu no Mercado Velho de Diamantina
A audiência aconteceu no Mercado Velho de Diamantina - Foto: Raíla Melo
Geraizeiros, populações tradicionais que residem no Norte do Estado, pedem reconhecimento e o direito de preservarem seu modo de vida. A reivindicação foi feita em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), nesta segunda-feira (26/5/14), em Diamantina (Vale do Jequitinhonha). A reunião, solicitada pelo presidente da comissão, deputado Durval Ângelo (PT), debateu propostas para que as comunidades tradicionais da região permaneçam exercendo suas atividades no Parque Nacional das Sempre-Vivas e denúncias dos moradores.
O parlamentar abriu a audiência informando sobre a visita da comissão, realizada no domingo (25), na comunidade quilombola Vargem do Inhaí, onde ouviu dos moradores relatos sobre ameaças, abuso de autoridade, prisões arbitrárias, dentre outras ocorrências que teriam sido impostas aos membros das comunidades tradicionais por antigos gestores do parque. Ele assegurou que o Parlamento mineiro não deixará que o próprio poder público aja com barbárie.
O Parque Nacional das Sempre-Vivas foi criado pelo Decreto Federal 13, de 2002, e é gerido pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), uma autarquia em regime especial, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente e integra o Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama). Para Durval, o governo federal deverá repensar a gestão do parque no sentido de estruturar a convivência harmoniosa entre a unidade de conservação e as comunidades como as de apanhadores de flores, faísqueiros (que praticam garimpo artesanal) e pescadores.
O deputado Luiz Henrique (PSDB) também afirmou que será necessário encontrar uma solução equilibrada para o conflito. Ele disse, ainda, que foi graças às comunidades que a existência do parque foi possível. Concordou com os parlamentares Paulo Célio de Almeida Hugo, prefeito de Diamantina, que agradeceu a iniciativa da ALMG e disse estar certo de que “esse é o primeiro passo para a busca do entendimento”.
Já Maria de Fátima Alves, representante da Comunidade de Macacos, disse que os estudos para instituição do parque não levaram em conta a existência deles. Segundo ela, as comunidades estão proibidas de plantar roças de subsistência, de apanhar flores, atividades que garantem a sobrevivência de mais de 500 famílias. A líder comunitária disse que o movimento não está pedindo a extinção do parque, mas a permissão para continuarem a exercer suas atividades econômicas e vivenciar seus modos de vida, “aquele território é a nossa história”.
Maria Alves apresentou a proposta para que o parque seja transformado em Reserva de Desenvolvimento Sustentável, “assim seremos reconhecidos como parte do sistema ambiental a ser preservado”. Ela ainda entregou ao presidente da comissão abaixo-assinado com a solicitação apresentada pelas 20 comunidades. Na atual configuração, sendo o parque classificado como unidade de conservação, não poderia haver qualquer intervenção humana dentro de seus limites.
Para a representante do Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas Gerais (CCA), Elisângela Ribeiro de Aquino, “há centenas de anos, as comunidades tradicionais vivem nesse espaço de forma sustentável, foram esses povos que protegeram aquela área, precisamos valorizá-los, permitir que eles possam sobreviver; é injusto dizer que as pessoas apresentam risco para o parque, eles são parte desse território”.
Autoridades locais se manifestaram favoráveis à permanência das atividades das comunidades no parque. Conforme o prefeito de Bocaiúva, Ricardo Afonso Veloso, o conflito de direitos deve ser solucionado por meio do diálogo; posição também corroborada pelo secretário de Meio Ambiente e Desenvolvimento Rural de Diamantina, Rodrigo Luiz de Couto, e pelo prefeito de Buenópolis, José Alves.
Já o vereador de Diamantina Dijalma da Conceição Coelho disse que a proposta inicial de criação do parque era de apenas metade que aquela área que consta hoje no decreto que instituiu o parque (125 mil hectares). Conforme ele disse, já presenciou, de fato, ex-servidores do parque agirem de forma autoritária e abusiva.
Projeto para transformar as comunidades em patrimônio imaterial
Representantes da comunidade realizaram manifestação pelas ruas da cidade antes da reunião
Representantes da comunidade realizaram manifestação pelas ruas da cidade antes da reunião - Foto: Raíla Melo
Claudenir Fávero, coordenador do Núcleo de Agroecologia e Campesinato da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), falou sobre o ecossistema da região, que, segundo ele, “nunca foi dissociado dos povos tradicionais”. Ele explicou que essas comunidades como as de apanhadores de flores moram nas bordas das serras, onde se encontram mais próximas dos cursos de água e que, no período de colheita das sempre-vivas, arrancham durante cinco meses na serra para a coleta. “Esse é um modo de vida, que também deve ser considerado como patrimônio imaterial; essa singularidade deve ser reconhecida. O próprio manejo das comunidades permite a perpetuação das espécies”, ressaltou o docente.
Após a manifestação do professor, os deputados Durval Ângelo e Luiz Henrique anunciaram a elaboração de projeto de lei transformando a atividade extrativista das comunidades como um bem cultural e imaterial de Minas Gerais. Durval ainda declarou que, após a conclusão dos trabalhos das universidades, que hoje desenvolvem estudos na região, vai se reunir com o deputado federal Padre João (PT-MG), para mediar junto à direção do ICMBio nacional a recategorização do parque.
Já Aderval Costa Filho, professor e coordenador do Programa de Mapeamento de Povos e Comunidades Tradicionais de Minas da UFMG, afirmou que as políticas públicas estão em paradoxo: “Há políticas em curso que balizam empreendimentos que visam a ocupar territórios de povos tradicionais e, de outro lado, políticas que pretendem assegurar a sobrevivência dessas comunidades”. Para ele, o desafio é compatibilizar as ações governamentais e buscar alternativas a esse paradoxo.
Segundo o professor, já estão previstos no orçamento da União R$ 3 bilhões para fomentar a Política Nacional de Desenvolvimento dos Povos Tradicionais, implementada em 2007, “acredito que não há possibilidade de retroceder. Temos que fazer tirar do papel a lei estadual 21.147, de 2014, que institui essa política no âmbito do Estado”.
Ainda de acordo com o docente, nos últimos quatro meses, o grupo de trabalho da universidade mapeou 20 comunidades tradicionais na região, totalizando cerca de 2.500 pessoas. Ele ponderou que, para os membros dessa população, o território não é um bem econômico apenas, “é também a alma de um povo, é sua forma de estar no mundo e agir nele”. Ele informou, ainda, que os trabalhos devem ser concluídos em um mês. Também o professor da Universidade do Estado de Minas Gerais, Mário Gomes Ferreira, afirmou que vai levar a discussão de hoje para a instituição a fim de trazer outras contribuições.
CMBio – O representante da CMBio, Villi Pinheiro Tomich, falou sobre as afirmações de abuso por parte dos servidores do instituto e sobre a posição oficial da autarquia a respeito do conflito. Ele afirmou que a recomendação institucional é que diante do desvio de seus gestores, como os alegados durante a audiência, os cidadãos devem apresentar as denúncias ao órgão para que sejam apuradas e os responsáveis punidos, se for esse o caso.
Também disse que o CMBio está aberto à discussão para a recategorização do parque, a fim de que as demandas das comunidades possam ser atendidas. “Agora, o parque está instituído e há uma Ação Civil Pública (ACP) movida pelo Ministério Público, que obriga a execução do plano de manejo existente; sabemos que as comunidades rejeitam esse plano, contudo precisamos cumprir a liminar Judicial”, enfatizou Tomich, que acrescentou ainda que vai levar a discussão à exaustão, até que todos possam participar e encontrar uma solução que atenda aos interesses ambientais e os das comunidades.
Já Estevão Ferreira Couto, defensor público federal, informou que a Defensoria Pública da União em Minas Gerais (DPU/MG) acompanha a questão desde 2002, quando a titular do ofício de Direitos Humanos da instituição era a defensora Giêdra Cristina Pinto Moreira. Para ele, a solução do conflito passa pelo entendimento de que os parâmetros de análise não podem ser apenas os instrumentos jurídicos relativos aos direitos ambientais. “Não podemos perder de vista os direitos das comunidades tradicionais” alertou o defensor.
Segundo Estevão Couto, de fato, a liminar obriga a execução do atual plano de manejo, mas que a ACP parece ter sido elaborada sem o conhecimento de parecer emitido pela 6ª Câmara do Colegiado de Procuradores do MPF, que indica como modelo mais adequado, para áreas de preservação onde existem comunidades tradicionais no entorno, o de Reserva de Desenvolvimento Sustentável. Também disse que os abusos cometidos pela a gestão anterior devem ser apurados, “precisamos acertar as contas com o passado para que o futuro seja possível. Vamos cobrar a investigação dos órgãos competentes por meio do Judiciário, se for preciso”.
Debates – durante a reunião, foram ouvidos os demais participantes, que relataram abusos de poder que teriam sido praticados pelos gestores. Também pediram a imediata revisão da categoria do parque, uma vez que, em uma unidade de conservação, não seja permitido exercer atividades econômicas.
Antes de encerrar a audiência, Durval Ângelo anunciou que vai encaminhar as notas taquigráficas da audiência para as autoridades presentes, Ministério do Meio Ambiente, Presidência da República, Ministério Público Federal, Fundação Palmares, dentre outros. Segundo o parlamentar, vai encaminhar também, aos mesmos destinatários da nota, o abaixo-assinado das comunidades pedindo a recategorização do parque. Declarou que vai solicitar à senadora Ana Rita, presidente da Comissão de Direitos Humanos do Senado, audiência pública para debater o tema. Por último disse que vai encaminhar pedido ao Poder Judiciário para que suspenda a liminar que obriga a execução do plano de manejo do ICMBio, até o termino dos estudos da UFMG.

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