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domingo, 26 de outubro de 2014

Por que os negros não votam em Aécio Neves?

Política


Áurea Carolina de Freitas e Silva e Lilian C.B. Gomes

postado em: 24/10/2014

Em Minas Gerais, as resistências de cunho étnico-racial têm se expandido por meio de inúmeros coletivos e organizações que criam e reinventam, cotidianamente, sentidos e práticas de emancipação. A história dessa terra de herança escravista mostra que a mudança não virá pela ação de governos comprometidos com os senhores da escravidão. Sem as lutas, nada feito. No estado que ostenta a ideia de liberdade em sua bandeira, quem se posiciona contra o racismo sabe que a libertação é uma conquista sem ponto de chegada. Não existe tinta que possa fixar o significado de ser livre em uma sociedade que massacra o povo negro.

De fato, o pacto de sangue escravocrata firmado entre grupos que tradicionalmente controlaram o poder em Minas Gerais impediu a consolidação de qualquer avanço no campo das políticas de promoção da igualdade racial no estado, sobretudo durante os últimos doze anos de governos tucanos (PSDB). As gestões de Aécio Neves e Antônio Anastasia foram orientadas por uma lógica racista que pode ser verificada, por exemplo, nos tipos de tratamento dados aos segmentos de juventude e aos grupos quilombolas nesse período.

O Brasil vive uma realidade de genocídio contra a população negra, manifesto na destruição subjetiva, simbólica e corpórea de seus membros. A estratégia de eliminação física de pessoas negras é evidenciada por vários estudos sobre violência, que demonstram que jovens negros são as vítimas preferenciais de homicídios no país. De acordo com o Mapa da Violência 2014, para cada jovem branco que morre assassinado, morrem 2,7 jovens negros no Brasil. Entre 2002 e 2012, enquanto a região Sudeste teve uma queda de 47% nas taxas de homicídio juvenil, Minas Gerais teve um aumento de 51%. A maioria dos jovens assassinados são rapazes negros, pobres e moradores de periferia. Desigualdades raciais, criminalização da pobreza e negação de oportunidades estão na raiz do problema.

Ao invés de promover políticas inclusivas e participativas para romper com o ciclo genocida, a resposta dos governos tucanos mineiros foi a implantação de uma agenda ultraliberal via sucateamento das políticas sociais, acirramento da seletividade racial na perseguição ao crime, encarceramento em massa e privatização de presídios – verdadeiros depósitos de gente negra e pobre que se tornam fonte de lucro para investidores de mercado. Não há nenhuma política em escala estadual que realmente reconheça e valorize os modos criar, fazer e viver da juventude negra e das comunidades quilombolas. Nunca se estabeleceu um diálogo democrático com esses sujeitos e grupos para construir políticas públicas que pudessem lidar com as suas especificidades.

Veto aos quilombos

As mais de 400 comunidades quilombolas existentes em Minas Gerais, de acordo com o levantamento feito  pelo CEDEFES em 2008 foram ignoradas em seus modos de criar, fazer e viver pelo poder público estadual. Nesse ano de 2014, a Federação das Comunidades Quilombolas de Minas Gerais – N’Golo – completa 10 anos sem nenhuma comunidade titulada pelos governos mineiros. Embora a atribuição da titulação dos territórios quilombolas – a principal demanda desses grupos – seja do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), o Decreto 4.887/2003 determina em seu artigo 3º,  parágrafo 2º, que o Incra poderá “estabelecer convênios, contratos, acordos e instrumentos similares com órgãos da administração pública federal, estadual, municipal, do Distrito Federal, organizações não governamentais e entidades privadas, observada a legislação pertinente”. Assim, abre-se a possibilidade de que as titulações sejam feitas em parceria com órgãos estaduais. Outros estados têm atuado nesse sentido, como é o caso do Instituto de Terras do Pará (ITERPA), que titulou 37 territórios. Em Minas Gerais, no entanto, o que se viu durante a era PSDB foi a produção de invisibilidade e exclusão desses grupos.

Uma análise do programa de governo do candidato Aécio Neves (PSDB) permite perceber que estereótipos, práticas racistas e processos de invisibilização de grupos étnico-raciais poderão ser agravados e reproduzidos em escala nacional se ele for eleito presidente do país. Basta conferir a proposta da redução da maioridade penal, flagrantemente sustentada em uma cultura de punição de adolescentes negros e pobres, ou as políticas voltadas para quilombolas e indígenas, que tratam esses grupos na vertente da “pobreza”, ignorando suas formas de criar, fazer e viver.

Apenas para exemplificar, no documento disponibilizado pelo candidato na internet , na área Cidadania: saúde, segurança, esporte e cultura, os quilombolas e indígenas são apresentados como populações “vulneráveis”, para as quais deverão ser destinadas “soluções habitacionais”, manifestando um completo desconhecimento das dinâmicas organizativas próprias desses grupos, cujo recurso básico essencial é uma territorialidade que lhes garanta a sua reprodução física e cultural. Na mesma área do programa de governo, a juventude é apresentada em uma vinculação direta com a questão das drogas, o que manifesta, também, um desconhecimento das pluralidades criativas e formas de ocupação dos espaços que a juventude negra tem experimentado nos ambientes urbano e rural.

Portanto, que não se confunda Minas Gerais com os governos tucanos, como por vezes o candidato Aécio Neves tenta fazer, querendo sobrepor a política danosa que se fez em Minas Gerais às lutas do povo mineiro. Os movimentos negros e quilombolas resistem apesar do governo ultraliberal e genocida que predominou nos últimos doze anos nesse estado onde a palavra liberdade está em disputa.


(*) Áurea Carolina de Freitas e Silva é mestranda em Ciência Política pela UFMG e ativista em movimentos juvenis. Lilian Cristina Bernardo Gomes é Doutora em Ciência Política pela UFMG e uma das assessoras da Federação das Comunidades Quilombolas de Minas Gerais N’Golo.

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