Segundo ONG, autoridades usam ‘força excessiva’ no combate ao crime.
Relatório cita criação da Comissão da Verdade e avanços contra pobreza.
Relatório cita criação da Comissão da Verdade e avanços contra pobreza.
Relatório
da Anistia Internacional divulgado nesta quarta-feira (22) condena a
“força excessiva” das autoridades brasileiras em resposta a crimes
violentos. A ONG, que monitora violações contra os direitos humanos no
mundo, também citou o avanço do Brasil no combate à pobreza e a criação
da Comissão da Verdade, para investigar violações de direitos humanos
ocorridas entre 1946 e 1988 no país.
A análise faz parte do relatório anual
“O Estado dos Direitos Humanos no Mundo”, que avaliou a situação dos
direitos humanos em 159 países no ano de 2012.
No documento, a organização afirma que,
no Brasil, “a situação socioeconômica continuou a melhorar, com mais
pessoas saindo da pobreza extrema”.
Segundo o relatório, no entanto,
“estados continuaram a adotar práticas policiais repressivas e
discriminatórias para enfrentar a violência criminal armada, que matou
dezenas de milhares de pessoas”.
“Jovens negros do sexo masculino
constituíam um número desproporcional dessas vítimas, sobretudo no Norte
e Nordeste do país”, diz o documento.
Além disso, segundo o relatório, “a
incidência de crimes violentos permaneceu alta”, apesar de ações como as
UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora) no Rio de Janeiro, que
contribuíram para diminuir o número de mortes.
Em São Paulo, diz a ONG, “o número de
homicídios aumentou de forma significativa, revertendo a redução
alcançada nos oito anos anteriores”. Entre janeiro e setembro de 2012,
foram registrados 3.539 homicídios – um aumento de 9,7% com relação ao
mesmo período do ano anterior.
A
anistia diz também que o número de homicídios cometidos por policiais
aumentou de forma acentuada em São Paulo, com mais de 90 pessoas mortas
apenas no mês de novembro de 2012, estatística atribuída a confrontos
entre policiais e a principal organização criminosa que atua no Estado.
Os crimes cometidos por policiais, diz a
ONG, continuaram a ser registrados como “autos de resistência” ou
“resistência seguida de morte”. “Apesar das evidências de que esses
casos envolviam o uso de força excessiva e de que, possivelmente, seriam
execuções extrajudiciais, poucos foram efetivamente investigados”, diz o
documento.
O relatório mostra que o Brasil vive um déficit de justiça. Temos
leis e instituições suficientes para assegurar a efetivação dos direitos
humanos”
Atila Roque, diretor executivo da Anistia Internacional Brasil
Atila Roque, diretor executivo da Anistia Internacional Brasil
Ainda conforme a Anistia Internacional, “membros da polícia continuaram envolvidos com atividades corruptas e criminosas”.
“No Rio de Janeiro, apesar de alguns
avanços no provimento da segurança pública, as milícias (grupos
criminosos formados, em parte, por agentes da lei ainda ativos ou que já
deixaram a função) continuaram a dominar muitas favelas da cidade”,
avalia.
“O relatório mostra que o Brasil vive um
déficit de justiça. Temos leis e instituições suficientes para
assegurar a efetivação dos direitos humanos”, afirma Atila Roque,
diretor executivo da Anistia Internacional Brasil.
“No entanto, a realidade tem se mostrado
bem diferente, com a contínua violação de direitos constitucionais
assegurados às populações indígenas, a presença de abusos e violência
policial nas operações nas favelas e periferias, as frequentes ameaças
àqueles que lutam pelos direitos de comunidades ameaçadas no campo e o
risco constante de remoções forçadas de populações urbanas”,
complementa.
O relatório também avalia o respeito aos
direitos humanos no mundo. O destaque são os conflitos na Síria, que já
deixaram 60 mil mortos. Segundo a anistia, a “soberania” tem impedido a
interferência externa como da Organização das Nações Unidas (ONU).
“Apesar do número crescente de mortes – e da abundância de provas dos
crimes cometidos – o Conselho de Segurança da ONU mais uma vez se
absteve de proteger os civis.”
Tortura e superpopulação carcerária
Um déficit de mais de 200 mil vagas no sistema carcerário implica
em condições cruéis, desumanas e degradantes serem extremamente
frequentes, diz o relatório.
Sobre o Brasil, a anistia cita também a
criação da Comissão Nacional da Verdade para investigar violações dos
direitos humanos ocorridas entre 1946 e 1988, o que levou à criação de
diversas comissões da verdade em âmbito estadual, como nos estados de
Pernambuco, do Rio Grande do Sul e de São Paulo.
O relatório diz, no entanto, que a Lei
da Anistia faz com que persistam “temores sobre a capacidade do Brasil
enfrentar a impunidade por crimes contra a humanidade” e defende a
necessidade da aprovação da legislação federal para um Mecanismo
Preventivo Nacional, conforme estabelecido no Protocolo Facultativo à
Convenção da ONU contra a Tortura.
O relatório aponta ainda que o número de
pessoas encarceradas continuou a aumentar. “Um déficit de mais de 200
mil vagas no sistema carcerário implica em condições cruéis, desumanas e
degradantes serem extremamente frequentes. No estado do Amazonas, uma
visita da Anistia Internacional constatou que os detentos eram mantidos
em celas fétidas, superlotadas e inseguras”, analisa.
“Mulheres e menores eram detidos nas
mesmas unidades que os homens. Houve vários relatos de tortura, tais
como sufocamento com sacola plástica, espancamentos e choques
elétricos”, diz o relatório.
Terra e moradia
Ainda conforme a anistia, “centenas de
comunidades foram condenadas a viver em condições deploráveis porque as
autoridades não garantiram seu direito a terra” e “grandes obras de
infraestrutura continuaram provocando impactos danosos sobre os povos
indígenas”. Um exemplo citado pelo relatório é o da construção da
hidrelétrica de Belo Monte, “que foi levada adiante, apesar de uma série
de protestos e contestações judiciais”.
A anistia também critica a violência em
Mato Grosso do Sul contra comunidades indígenas Guarani-Kaiowá e no
Maranhão, “onde ao menos nove comunidades [quilombolas] foram submetidas
a intimidações violentas, e dezenas de líderes comunitários foram
ameaçados de morte”.
Segundo a ONG, os ativistas brasileiros
sofreram ameaças e intimidações ao defender essas comunidades, citando
casos no Amazonas, Pará e Rio de Janeiro.
Estupro
Por fim, a anistia diz que os direitos
sexuais e reprodutivos das mulheres continuaram ameaçados. “Em março, o
Superior Tribunal de Justiça absolveu um homem acusado de estuprar três
meninas de 12 anos, argumentando que elas seriam ‘trabalhadoras do
sexo’. A decisão, que suscitou condenação nacional e internacional, foi
anulada, em agosto, pelo mesmo tribunal.”
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