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O verdadeiro desafio não é inserir uma idéia nova na mente militar, mas sim expelir a idéia antiga" (Lidell Hart)
Um verdadeiro amigo desabafa-se livremente, aconselha com justiça, ajuda prontamente, aventura-se com ousadia, aceita tudo com paciência, defende com coragem e continua amigo para sempre. William Penn.

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Estudo comprova que excesso e sobrecarga de trabalho na Polícia Militar, são fatores de stress e má qualidade de vida


Trabalho e Organização: influências na Qualidade de Vida  e Estresse na Polícia Militar do Estado de Minas Gerais[1]



Resumo
Este artigo apresenta os resultados da pesquisa realizada junto à PMMG, cujo objetivo principal foi estudar a QVT e Estresse Ocupacional, tendo como referência os modelos de HACKMAN, OLDHAM (QVT) e COOPER (Estresse). A pesquisa caracteriza-se como um estudo descritivo-analítico, podendo ser considerada também um estudo de caso. A amostra pesquisada foi de 1.152 indivíduos, extraída de uma população de 7.607 militares. A coleta de dados foi realizada através dos instrumentos (OSI) e do (JDS). A análise dos dados foi realizada através do Statistics Analysis System - SAS - e, para comparação entre os dados foi utilizado o teste Kruskal – Wallis. Como resultado, constatou-se a existência de importantes níveis de estresse entre os membros da Corporação, que decorrem de uma elevada insatisfação em relação à Instituição. Paralelamente, foi encontrado um importante nível de satisfação com o trabalho em si, implicando em  significativa QVT. A promoção de maior satisfação entre os membros da PMMG passa pela revisão de aspectos da cultura organizacional e das políticas de Recursos Humanos. Através desta pesquisa, foi possível identificar as variáveis determinantes que possibilitam recomendar a adoção de políticas que visem a promoção de maior ajustamento e satisfação no trabalho.

1 INTRODUÇÃO
O trabalho constitui, ao longo da história, um importante, se não o principal, determinante da forma de organização das sociedades, sendo o meio através do qual o homem constrói o seu ambiente e a si mesmo.
O advento do sistema capitalista veio introduzir profundas transformações no mundo do trabalho, destacando-se a separação do trabalhador dos meios de produção e do produto do trabalho e a expropriação do conhecimento deste a partir do surgimento de movimentos como os taylorista/fordista no século XX.
Esses últimos movimentos foram responsáveis por um aumento de produtividade e redução dos custos de produção, possibilitando o acesso de uma parcela cada vez maior da população aos bens de consumo.
Em contrapartida, verificou-se que a forma de trabalho instituída então resultou em uma perda de poder do trabalhador sobre seu trabalho e do significado do mesmo, de modo que o trabalho passou a constituir uma fonte de sofrimento para o indivíduo e de deterioração de sua qualidade de vida.
A deterioração da qualidade de vida se manifesta através de diversas formas, destacando-se o surgimento de novas patologias, dentre as quais sobressai o fenômeno do estresse.
Aliado ao impacto decorrente da forma de arranjo do trabalho em si, tem-se a influência da forma de configuração das organizações sobre a personalidade do indivíduo, podendo   o choque entre a estrutura organizacional e a psicofísica do trabalhador  levar ao seu adoecimento.
Tendo em vista a possível repercussão negativa do trabalho sobre o indivíduo, surgiram estudos visando adequar o trabalho e a estrutura das organizações às necessidades dos trabalhadores, buscando a satisfação destes  vis-à-vis a melhoria de seu desempenho profissional. Inserem-se aqui os estudos sobre Qualidade de Vida e Estresse no Trabalho.
De acordo com essa tendência, o Núcleo de Estudos Avançados em Comportamento Organizacional - NEACO/CEPEAD/UFMG - desenvolveu um trabalho junto à Polícia Militar de Minas Gerais - PMMG -, objetivando diagnosticar o nível das variáveis da qualidade de vida no trabalho e estresse ocupacional nos membros da referida instituição.
Este artigo visa apresentar alguns dos resultados encontrados em tal estudo, salientando as questões referentes ao impacto da atividade policial e da estrutura da organização pesquisada sobre as variáveis.
2 QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO
O grande impulso em torno da questão da Qualidade de Vida no Trabalho - QVT - deu-se a partir dos anos 70 quando acontecem as lutas de trabalhadores e estudantes contra o sistema taylorista/fordista de produção. No entanto, diversos autores demonstram preocupação com a QVT no movimento de Administração Científica e mesmo nos trabalhos de Adam Smith.

O interesse das organizações acerca da QVT deve ser entendido como resultado das pressões dos trabalhadores e também como decorrência da constatação de que formas de gerenciamento do trabalho mais democráticas, aliadas a tarefas mais complexas, constituíam as bases para um aumento de produtividade num contexto econômico-tecnológico delineado então.
Em última instância, os estudos da QVT vieram englobar as pesquisas sobre motivação, satisfação no trabalho, fatores ambientais e ergonômicos, proporcionando uma visão mais completa da situação do homem em relação ao trabalho. Nesse sentido, destacam-se as pesquisas realizadas por Maslow, Herzberg, McGregor dentre outros autores.
A QVT surge como esforço no sentido da humanização do trabalho. De fato, observa-se que a forma de estruturação do trabalho e das organizações impõe uma necessidade de adequação do indivíduo aos parâmetros organizacionais, não considerando os seus interesses e desejos. A abordagem da QVT vem então incorporar algumas preferências humanas no desenho e gestão de sistemas organizacionais, buscando torná-los mais satisfatórios ao indivíduo, contribuindo ainda para a qualidade de vida geral do mesmo, como destacam autores como SAYLES, STRAUSS (1977); VREDENBURG, SHERIDAN (1979) e KHAN (1984) citados por SANT’ANNA (1997).
No estudo da qualidade de vida no trabalho podem-se identificar como principais elementos comuns  à maioria dos autores que tratam do assunto a resolução de problemas com a participação dos trabalhadores, a reestruturação da natureza básica do trabalho, a inovação no sistema de recompensas e a melhoria no ambiente de trabalho. Deve-se considerar, porém, que os conceitos de QVT diferem em alguns aspectos, demonstrando, dessa forma, que ainda não existe nada de definitivo a seu respeito e podendo ser considerado dinâmico seu estudo. Os modelos de WALTON (1973), LIPPITT (1978), WESTLEY (1979) abordam a QVT de maneira mais global, enquanto outros autores se preocuparam com aspectos mais específicos como cargo (HUSE, CUMMINGS, 1985; NADLER, LAWLER, 1983; WERTHER , DAVIS, 1983), remuneração (THÉRIAULT, 1980), ambiente físico de trabalho (DENIS, 1980) e as dimensões básicas da tarefa (TURNER, LAWRENCE, 1973; HACKMAN, LAWLER, 1971; HACKMAN, OLDHAM, 1975), citados por SANT’ANNA, MORAES (1999).

2.1 Modelo de Dimensões Básicas da Tarefa de HACKMAN e OLDHAM

O Modelo de Dimensões Básicas da Tarefa de HACKMAN, OLDHAM (1975), baseia-se em trabalhos anteriores de HACKMAN, LAWLER (1971) e TURNER LAWRENCE, (1973) que defendem que as características da tarefa determinam o surgimento de três estados psicológicos:  significância percebida, isto é, valor atribuído ao trabalho; responsabilidade percebida em relação aos resultados do trabalho e conhecimentos dos resultados do trabalho que, quando presentes, promovem a satisfação e motivação dos trabalhadores.
HACKMAN, OLDHAM (1975) consideram as seguintes dimensões da tarefa em seu modelo como determinantes dos estados psicológicos, variedade de habilidades e talentos exigidos na realização da atividade; identidade da tarefa, ou seja, o nível em que é possível, na realização da tarefa, identificar a  realização de um trabalho completo; significado da tarefa, isto é, o grau em que a tarefa impacta a vida ou o trabalho de outras pessoas; autonomia, liberdade do indivíduo de planejar a forma de realização do trabalho; feedback extrínseco decorrente da avaliação de desempenho realizada por terceiros; feedback intrínseco, verificado quando a própria atividade fornece ao indivíduo possibilidade de avaliar seu desempenho e contato com pessoas (colegas, clientes etc.) na realização das atividades.
Além dessas variáveis, o modelo contempla ainda os grupos: resultados pessoais e de trabalho, que avaliam as reações afetivas do indivíduo ao desempenhar seu trabalho, satisfações contextuais, que avaliam a satisfação com as variáveis: possibilidade de crescimento, supervisão, segurança no trabalho, compensação e ambiente social. Acrescenta-se a este modelo a variável necessidade individual de crescimento, que relaciona as características da tarefa e as respostas individuais.
Este modelo encontra-se operacionalizado através do questionário Job Diagnostic Survey - JDS -, desenvolvido por HACKMAN, OLDHAM (1975) e amplamente empregado em pesquisas sobre Qualidade de Vida no Trabalho, tendo sido utilizado também neste estudo.
3 ESTRESSE OCUPACIONAL
O vocábulo estresse deriva do latim stringere que significa espremer e seu uso se tornou mais freqüente a partir das 30 e 40, (COOPER, 1988). Foi utilizada  com várias conotações como adversidade, no século XII, ou como pressão e/ou forte esforço do corpo humano no século XVIII. SELYE (1956), na década de 30, faz uso da palavra estresse para descrever uma síndrome por ele identificada que apresentava profundas correlações com o estado de saúde física e mental, bem como com o adoecimento dos indivíduos.
Dado à vulgarização do termo,  SELYE (1956) decidiu identificar o que não é o estresse. Nessa direção, para o  autor, estresse não é tensão nervosa, não é descarga hormonal das supra-renais, não é estimulante dessas glândulas, não é resultado de lesões corporais, não é uma quebra do estado de equilíbrio do organismo. Para o mesmo autor, estresse pode ser definido como “...um estado manifestado por uma síndrome específica, constituída de todas as alterações, não específicas, produzidas no sistema biológico”.
 Os indivíduos estão sujeitos em todo momento de suas vidas a situações e ambientes que possam ser considerados fontes de pressão desencadeadoras de estresse, não sendo excluído o seu ambiente de trabalho. Nesse contexto, o estresse  é chamado de estresse ocupacional, relacionando-se a ele mais que aspectos de ergonomia, como o trabalho em si e o caráter distintivo da organização.
No ambiente organizacional, todos os elementos, aspectos ou situações que influenciam o surgimento de estresse no indivíduo podem ser considerados fontes de pressão, não importando em que grau elas afetem. Os agentes estressores do ambiente organizacional foram dividido por COOPER et al. (1988) em seis conjuntos abrangentes: fatores intrínsecos ao trabalho, papel do indivíduo na organização, relacionamento interpessoal, a carreira e a realização, a estrutura e o clima organizacional e interface casa/trabalho.
COOPER et al. (1988) ainda salientam que o impacto das fontes de pressão sobre o indivíduo irá depender das características específicas do mesmo.
A partir da inter-relação entre estímulos e características individuais podem se desenvolver duas formas de estresse, que, apesar de biologicamente idênticas, apresentam conseqüências distintas para o indivíduo. São elas o distresse e o eustresse. O primeiro constitui o estresse negativo, resultante da percepção do estímulo como ameaça, ficando a energia retida no organismo para enfrentamento das pressões . O outro consiste em um estresse positivo no qual o excedente de energia é empregado de modo produtivo, sendo o estímulo estressor percebido como um desafio capaz de ser superado.
Esses autores identificam duas variáveis como determinantes da predisposição ao surgimento do quadro de estresse no indivíduo: locus de controle e personalidade tipo A. locus de controle refere-se ao grau de responsabilidade pessoal que o indivíduo atribui aos eventos de sua vida. Já a personalidade tipo A caracteriza indivíduos altamente competitivos, impacientes e que vivem com sentimento constante de urgência.
A combinação de vulnerabilidade individual com estímulos com potencial estressor leva ao desenvolvimento de estresse, o qual se manifesta tanto ao nível individual quanto ao organizacional.
Do ponto de vista individual, COUTO (1987) relaciona como principais sintomas de estresse: nervosismo, ansiedade, irritabilidade, fadiga, sentimentos de raiva, angústia, período de depressão, dor no estômago, dor nos músculos do pescoço e ombros e dores discretas no peito quando o indivíduo se encontra sob pressão.
O aumento do aparecimento de estresse no ambiente organizacional pode ser identificado a partir de dados concretos do aumento nível de absenteísmo, de rotatividade de pessoal, doenças e acidentes de trabalho.
COOPER et al. (1988),  avançando nos estudos sobre o tema, construíram o Modelo Dinâmico de Estresse, o qual engloba agentes estressores, características pessoais, manifestações individuais e organizacionais e estratégias de combate ao estresse. A partir desse modelo, foi desenvolvido o Occupational Stress Indicator - OSI –, questionário utilizado mundialmente no diagnóstico de estresse ocupacional.
No presente trabalho fez-se uso da versão adaptada por MORAES (1998) do OSI, que apresenta como prováveis fontes de pressão: carga de trabalho, equilíbrio entre vida pessoal e profissional, responsabilidade individual, falta de possibilidades de crescimento, clima organizacional e exigências do ambiente de trabalho.
4 METODOLOGIA E OBJETIVOS
A pesquisa base pode ser classificada como um estudo de caso, de caráter descritivo-analítico,  que teve como objetivos:
1.      Identificar as variáveis preditoras de QVT e estresse ocupacional dos integrantes da PMMG de Belo Horizonte.
2.      Identificar aspectos relativos à QVT e estresse ocupacional nos diversos extratos da hierarquia da PMMG.
3.      Extrair dos resultados obtidos indicações que possam subsidiar a definição de políticas de Recursos Humanos que privilegiem, na instituição pesquisada, a maior satisfação dos envolvidos, apresentando como conseqüência melhor qualidade dos serviços prestados à comunidade.
A amostra foi composta de 1.152 militares, extraídos de uma população total de 7.607 indivíduos, sendo estratificada de acordo com a hierarquia em três grandes grupos: Oficiais superiores/intermediários - Coronel, Tenente-Coronel, Major e Capitão; Oficiais subalternos - Tenente, Sargento e Subtenente; Praças - Cabos e Soldados atuantes na cidade de Belo Horizonte.
Foram utilizados na coleta de dados os questionários OSI, de COOPER et al. (1988) e JDS, elaborado por HACKMAN, OLDHAM (1975), ambos adaptados por MORAES et al. (1998). A análise dos dados foi feita com a utilizado do software Statistics Analysis System - SAS - e para comparação entre os dados foi utilizado o teste Kruskal – Wallis. Foram feitas ainda entrevistas semi-estruturadas e análise documental visando a obtenção de informações que possibilitassem melhor compreensão da Instituição pesquisada.
5 A INSTITUIÇÃO PESQUISADA
A história da Polícia Militar de Minas Gerais se mistura com a história político-social do Estado e do País. Sua origem data de mais de 200 anos com a criação do Regimento da Cavalaria de Minas, responsável, em sua época, pela segurança dos cidadãos na região das Minas. Instituição tradicional, que apresenta influências que vão além das questões de segurança pública, interfere de forma estratégica no campo político do Estado.
Dentre suas atribuições, a PMMG é responsável pelo policiamento, pelo patrulhamento, pela preservação e restauração da ordem pública, pela segurança no trânsito urbano e rodoviário, pela preservação de florestas, lagos e rios, pela proteção da fauna e flora, pela defesa do patrimônio histórico e artístico e pelo apoio à Defesa Civil. O policial militar atua de maneira intensiva e fundamental nos conflitos sociais que são gerados a todo momento e em todos os lugares na comunidade.
A relação existente entre a Instituição Polícia Militar e seus integrantes acontece no nível de uma forte identificação, ou seja, os policiais acreditam na filosofia da Instituição e a seguem. A cultura organizacional detém uma grande parcela de influência no comportamento dos indivíduos que atuam na Instituição. De acordo com documentos internos da Polícia Militar, a mesma pode ser identificada como uma organização que direciona suas ações diretamente para a clientela (população bastante heterogênea) que é a sociedade mineira e se preocupa muito com a difusão de seus valores através da atuação de seus integrantes.
O indivíduo, quando ingressa na carreira militar, sofre um processo de ressocialização, em que seu comportamento é modificado de acordo com as necessidades da Instituição, com muita rigidez, levando-o a um afastamento do contexto social externo à mesma.
O processo de ressocialização força uma alteração no comportamento dos indivíduos de forma que os mesmos adotem uma postura caracterizada pela circunspecção, seriedade, formalidade, forjando o que SILVA NETO (1997) descreve como uma cultura de infelicidade, em que sentimentos como a alegria são considerados demonstrações de fragilidade.
O treinamento do militar objetiva promover atitudes totalmente orientadas para a organização e seus objetivos, impondo uma forma de vida caracterizada pela abnegação e mesmo pelo sacerdócio como destaca AFFONSO (1984), citado por SILVA NETO (1997:45):
"A saga do policial militar de todos os tempos é uma vida plena de sacrifícios, de espírito de renuncia e silenciosa dedicação ao dever, elementos sem os quais não é possível levar a bom termo a missão nobilitante de dar proteção a sociedade."
Apesar das dificuldades (greves, protestos, corrupção) enfrentadas nos dias atuais pela Organização, em muitos Estados brasileiros, em relação a suas corporações, a grande maioria dos policiais se encontram fiéis à Instituição e, principalmente, às suas atividades.
No âmbito estrutural, a Polícia Militar de Minas Gerais é dividida em três níveis organizacionais com funções de execução e apoio: estratégico, tático e operacional. Também pode ser verificada internamente uma outra divisão, esta regida pela hierarquia e algumas políticas de Recursos Humanos, sendo dois grupos distintos: os oficiais e os graduados (praças).
Verifica-se que a estrutura da PMMG resiste às transformações que têm acontecido no ambiente organizacional de uma maneira geral, persistindo um caráter burocrático e tradicional, cujo resultado é priorizado em relação ao elemento humano.
6 ANÁLISE DOS RESULTADOS
Analisando-se a amostra em relação aos aspectos profissionais, percebe-se que a mesma é composta principalmente por cabos e soldados (57,7%), seguidos de oficiais subalternos (35%) e oficiais superiores e intermediários (7,3%).
A estabilidade de emprego existente nesse tipo de organização transparece no fato de 75,1% da amostra atuar na Polícia Militar de Minas Gerais há, pelo menos, sete anos, sendo, contudo, elevada a rotatividade interna, 53,5% da amostra atua na mesma unidade há menos de sete anos.
Em relação à carga de trabalho semanal, a maioria (46,7%) cumpre uma jornada superior a 40 horas semanais, a qual é determinada pelo comando em 79,3% dos casos.
No que tange ao desejo de se demitir, grande parte da amostra (48,4%) não o expressa, seguido de 37% que raramente cogita tal possibilidade. Vários fatores podem ter contribuído  para tal resultado, entre eles, a estabilidade de emprego fornecida pela PMMG, contrastando com a elevada instabilidade apresentada pelo mercado de trabalho de maneira geral.
Antes de se proceder a analise das variáveis deste estudo, deve-se destacar que escores médios superiores a 3,5 indicam uma intensa influencia da variável sobre o grupo.
Avaliando-se as variáveis que compõem o Modelo Dinâmico de Estresse Ocupacional (fontes de pressão, variáveis individuais e manifestações de estresse) observa-se que as fontes de pressão que se encontra mais presentes junto aos policiais, de todos os estratos analisados, referem-se à carga de trabalho, inter-relacionamentos e ambiente e clima organizacional. Ressalta-se que a variável falta de possibilidade de crescimento apresentou elevados escores para os grupos de oficiais. Dados demonstrados na TAB. 1.

TABELA 1
Avaliação das fontes de pressão no trabalho, considerando-se o posto
Fonte de
Pressão
Posto
Medidas descritivas
P
Conclusão
Mínimo
Máximo
Média
Desvio
Carga de trabalho
1
2,0
5,4
4,2
0,8
0,046
1 = 2
1 > 3
2 = 3
2
1,0
6,0
4,0
1,0
3
1,0
6,0
3,9
1,0
Inter-relacioname-nto
1
2,9
6,0
4,8
0,8
< 0,001
(1 = 2) > 3
2
1,0
6,0
4,6
0,9
3
1,0
6,0
4,3
1,0
Equilíbrio entre vida pessoal e profissional
1
1,3
5,7
3,8
0,8
< 0,001
1 > 2 > 3
2
1,0
6,0
3,4
0,9
3
1,0
6,0
3,2
1,0
Papel gerencial
1
1,5
4,8
3,3
0,7
0,535
1 = 2 = 3
2
1,0
5,8
3,4
0,8
3
1,0
6,0
3,3
1,0
Responsabi-
lidade pessoal
1
1,3
6,0
3,6
0,9
0,440
1 = 2 = 3
2
1,0
6,0
3,6
0,9
3
1,0
6,0
3,5
1,0
Exigências do ambiente trabalho
1
1,5
5,3
3,6
0,7
0,015
1 > (2 = 3)
2
1,0
5,5
3,4
0,8
3
1,0
6,0
3,4
0,9
Falta de possibilidade de crescimento
1
1,8
6,0
4,1
0,8
< 0,001
(1 = 2) > 3
2
1,0
6,0
3,9
0,9
3
1,0
6,0
3,6
1,0
Ambiente e clima organizacio-
nal
1
2,3
5,5
4,2
0,6
0,049
1 = 2
1 > 3
2 = 3
2
1,0
6,0
4,0
0,9
3
1,0
6,0
4,0
1,0
FONTE - Dados da pesquisa.
NOTAS - a) A probabilidade de significância refere-se ao teste de Kruskal-Wallis.
b) 1 à Oficiais superiores e intermediários    2 à Oficiais subalternos    3 à Praças.
O resultado obtido em relação à  fonte de pressão carga de trabalho não pode ser atribuído unicamente à elevada carga semanal de trabalho descrita anteriormente, o que pode ser constatado pelo fato de policiais com cargas de trabalho diferentes perceberem essa fonte de pressão com a mesma intensidade. Esses resultados podem ser verificados na  TAB. 2.
TABELA 2
Avaliação das fontes de pressão no trabalho, considerando-se as horas semanais trabalhadas
Fonte de
Pressão
Horas
Semanais
Medidas descritivas
P
Conclusão
Mínimo
Máximo
Média
Desvio
Carga de trabalho
< 40 horas
1,2
6,0
3,9
1,0
0,098
1 = 2 = 3
40 horas
1,0
6,0
3,9
1,0
> 40 horas
1,0
6,0
4,1
1,0
FONTE - Dados da pesquisa.
NOTA -   1 à < 40 horas    2 à 40 horas    3 à > 40 horas.
Características intrínsecas ao trabalho policial podem contribuir para a produção desses resultados. O trabalho policial implica disponibilidade constante e obrigatória ao atendimento das necessidades dos clientes (interno e externo). De acordo com o Regulamento Geral da Polícia Militar  (RGPM/1969) vigente, apesar de defasado, em seu Artigo 317:
“Artigo 317 – O policial militar, mesmo de folga, é obrigado a atuar, do ponto de vista policial, em qualquer local em que esteja, afim de prevenir ou reprimir a prática de delitos, e desde que não haja elemento ou força de serviço suficiente.” (Minas Gerais. Polícia Militar, 1969)
De fato, as convocações extraordinárias para missões podem contribuir para o quadro de estresse por sobrecarga de trabalho, interferindo diretamente na vida familiar e social do policial. Em relação à fonte de pressão inter-relacionamento, foram verificados elevados escores, especialmente entre os grupos de oficiais superiores e intermediários, numa realidade descrita por SILVA NETO (1997), em sua análise da cultura organizacional da PMMG. Nesse trabalho, o autor salienta o inter-relacionamento relativamente hostil existente entre colegas de trabalho e superiores, sendo que entre os oficiais persiste uma elevada competição em busca de promoções.
Esse último aspecto alia-se ao elevado sentimento de falta de possibilidade de crescimento profissional observado junto aos grupos de oficiais. Tal resultado pode ser explicado não só pelas dificuldades inerentes à ascensão hierárquica, mas também pelo predomínio de indivíduos com personalidade tipo A entre os oficiais superiores e intermediários, o que os torna mais competitivos que os demais.
A variável ambiente e clima organizacional vem, de certo modo, sintetizar aspectos levantados em relação aos inter-relacionamentos, acrescentando-se a influência negativa da rigidez da hierarquia e das normas organizacionais.
A presença de diversas variáveis com potencial estressor, aliada ao predomínio de indivíduos com personalidade tipo A na organização, contribuiu para a constituição de um quadro de estresse com repercussões individuais e organizacionais.
Individualmente, o estresse manifesta-se, principalmente, por meio de sintomas mentais, sendo relativamente baixos os níveis de manifestações físicas. Contudo, a manutenção prolongada de elevados níveis de estresse mental pode levar ao agravamento das mesmas, através do processo de somatização.
Em nível organizacional, o estresse manifesta-se através de uma elevada insatisfação com a organização, que se contrapõe a uma satisfação geral com o trabalho em si. Conforme TAB. 3:
TABELA 3
Avaliação dos indicadores de estresse no trabalho, considerando-se o posto
Indicadores
Posto
Medidas descritivas
p
Conclusão
Mínimo
Máximo
Média
Desvio
Satisfação com o trabalho em si
1
1,0
5,7
3,8
0,8
0,001
2 > (1 = 3)
2
1,2
6,0
4,1
0,8
3
1,0
6,0
3,9
0,9
Satisfação com a organização
1
1,3
4,8
3,1
0,8
0,014
1 = 2
1 = 3
2 > 3
2
1,0
5,5
3,2
0,8
3
1,0
6,0
3,0
0,9
FONTE - Dados da pesquisa.
NOTAS - a) A probabilidade de significância refere-se ao teste de Kruskal-Wallis.
     b) 1 à Oficiais superiores e intermediários    2 à Oficiais subalternos    3 à Praças.

O resultado descrito acima condiz com a elevada qualidade de vida no trabalho em relação à tarefa observada junto aos policiais, o que pode ser verificado na TAB. 4 .
TABELA 4
Avaliação das dimensões básicas da tarefa considerando-se o posto
Indicadores
Posto
Medidas descritivas
p
Conclusão
Mínimo
Máximo
Média
Desvio
Variedade de habilidades
1
2,5
6,0
4,7
0,9
< 0,001
1 > 2 > 3
2
1,5
6,0
4,4
1,0
3
1,0
6,0
4,1
1,0
Identidade da tarefa
1
1,0
6,0
3,7
1,0
0,536
1 = 2 = 3
2
1,0
6,0
3,8
1,2
3
1,0
6,0
3,7
1,1
Significância da tarefa
1
1,0
6,0
5,2
1,0
< 0,001
1 > 2 > 3
2
1,0
6,0
4,9
1,1
3
1,0
6,0
4,4
1,3
Autonomia
1
1,0
6,0
4,0
1,0
0,009
(1 = 2 ) > 3
2
1,0
6,0
4,0
1,0
3
1,0
6,0
3,8
1,1
Feedbackintrínseco
1
2,0
6,0
4,1
0,9
< 0,001
1 = 2
1 = 3
2 > 3
2
1,0
6,0
4,2
0,9
3
1,0
6,0
4,0
1,0
Feedbackextrínseco
1
1,0
6,0
4,4
1,1
< 0,001
(1 = 2 ) > 3
2
1,0
6,0
4,3
1,1
3
1,0
6,0
4,0
1,1
Contato com pessoas
1
3,0
6,0
5,2
0,8
< 0,001
1 > 2 > 3
2
2,0
6,0
4,9
0,9
3
1,5
6,0
4,6
1,0
QVT
1
3,0
5,6
4,5
0,6
< 0,001
(1 = 2) > 3
2
2,9
6,0
4,4
0,6
3
2,6
5,6
4,1
0,6
FONTE - Dados da pesquisa.
NOTAS - a) A probabilidade de significância refere-se ao teste de Kruskal-Wallis.
b) 1 à Oficiais superiores e intermediários    2 à Oficiais subalternos   3 à Praças.
De fato, analisando-se o trabalho policial, é possível verificar que este não se enquadra em um perfil mecanicista, contando o policial com um nível satisfatório de autonomia na realização de seu trabalho, não obstante a necessidade do cumprimento das normas legais e disciplinares da PMMG.
A TAB. 4 revela ainda que os membros da PMMG percebem a real importância de seu trabalho, o que pode ser verificado por meio dos elevados níveis de significância da tarefa.
Avaliando-se ainda as satisfações contextuais dos policiais, destaca-se a elevada insatisfação em relação ao aspecto compensação, sendo essa mais marcante entre os oficiais superiores e intermediários, em decorrência do maior nível de expectativas resultantes do mais alto nível de escolaridade dos mesmos.

TABELA 5
Avaliação dos resultados atitudinais e satisfações contextuais considerando-se o posto
Indicadores
Posto
Medidas descritivas
P
Conclusão
Mínimo
Máximo
Média
Desvio
Satisfação com possibilidade de crescimento pessoal
1
1,0
6,0
4,1
0,9
< 0,001
(1 = 2) > 3
2
1,3
6,0
4,2
0,9
3
1,0
6,0
3,9
1,0
Satisfação com segurança
1
1,5
6,0
4,1
1,0
< 0,001
(1 = 2) > 3
2
1,0
6,0
4,2
1,1
3
1,0
6,0
3,6
1,2
Satisfação com compensação
1
1,0
5,0
2,3
1,2
< 0,001
(2 = 3) > 1
2
1,0
6,0
3,0
1,3
3
1,0
6,0
3,0
1,3
Satisfação com colegas de trabalho
1
1,7
5,7
4,7
0,7
0,267
1 = 2 = 3
2
2,0
6,0
4,7
0,7
3
1,0
6,0
4,6
0,9
Satisfação com supervisão
1
1,0
5,3
3,9
1,0
< 0,001
(1 = 2) > 3
2
1,0
6,0
3,9
1,0
3
1,0
6,0
3,4
1,2
Satisfação geral  no trabalho
1
1,2
5,1
3,9
0,7
< 0,001
(1 = 2) > 3
2
1,5
6,0
4,1
0,8
3
1,0
6,0
3,7
0,9
FONTE - Dados da pesquisa.
NOTAS - a) A probabilidade de significância refere-se ao teste de Kruskal-Wallis.
b) 1 à Oficiais superiores e intermediários    2 à Oficiais subalternos    3 à Praças.
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho em organizações, tanto de cunho público quanto privado, impõe ao indivíduo uma série de normas e padrões de comportamento (conduta) para a realização de seu trabalho, visando  tornar o comportamento do trabalhador o mais previsível possível.
Tal tentativa de normalização muito freqüentemente não considera as necessidades individuais, impondo restrições que, quanto mais se opõem à constituição de cada indivíduo, mais constitui para ele uma fonte de sofrimento, frente à qual o organismo reage dando origem a doenças como o estresse. A partir do que foi visto neste trabalho, pode-se concluir que uma grande fonte de estresse na PMMG se encontra em aspectos da estrutura organizacional e não no conteúdo do trabalho.
As características da organização (estrutura, hierarquia, disciplina, normas) impõem severas restrições à expressão e ao desenvolvimento pessoal do policial. Destaca-se ainda, de maneira significativa, a baixa remuneração como fator de insatisfação geral entre os policiais militares.
Enfim, tem-se que a satisfação dos policiais militares passa pela revisão de aspectos da cultura e estrutura organizacional da Polícia Militar de Minas Gerais, no sentido de proporcionar melhores possibilidades de crescimento pessoal e profissional dos mesmos, acrescentando-se ainda a necessidade de revisão das políticas salariais da categoria, o que obriga a um esforço conjunto nos diversos âmbitos de Poder.
Deve-se ressaltar que a satisfação no trabalho repercute diretamente nos níveis de qualidade do mesmo, o que torna-se essencial em se tratando da segurança do cidadão.

8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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6        HUSE, E. F.; CUMMINGS, T. G. Organization development and change. 3. ed., St Paul: Minn, 1985.
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8        MORAES, L. F. R. de, et al. Qualidade de vida e estresse organizacional: um estudo comparativo em profissões de risco. Belo Horizonte: NEACO/CEPEAD/FACE/UFMG, 1998. (Relatório de pesquisa).
9        MORAES, L. F. R. de, et al. Diagnóstico de qualidade vida e estresse no trabalho da Polícia Militar do Estado de Minas Gerais. Belo Horizonte: NEACO/CEPEAD/FACE/UFMG 2000. (Relatório de pesquisa).
10    NADLER, D.; LAWLER, E. Quality of work life: perspectives and directions. Organization Dynamics, New York, v. 1, n. 11, p. 20-30, Winter/1983.
11    POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE MINAS GERAIS. Regulamento Geral da Polícia Militar (RGPM). Belo Horizonte: PMMG, 1969.
12      ROBBINS, S. P. Comportamento organizacional. Trad. Christina Avila de Menezes 8.ed.  Rio de Janeiro: LTC, 1999.
13      SANT'ANNA, A. S. Fatores de pressão e insatisfação em áreas de atendimento ao público: um estudo de caso em empresa mineira do setor de serviços. Belo Horizonte: CEPEAD/FACE/UFMG, 1997. 321p. (Dissertação, Mestrado em Administração).
14      SANT'ANNA, A. S., MORAES, L. F. R. de. Programas de qualidade de vida no trabalhoum estudo de caso em empresa brasileira do setor de telecomunicações. In: ENANPAD XXIII, Anais..., Paraná: ANPAD, p.148, 1999.
15    SELYE, H. The stress of life. New York: McGraw-Hill, 1956.
16    SILVA NETO, S. A. Cultura organizacional da Polícia Militar de Minas Gerais: uma visão diagnóstica. In: O Alferes. Belo Horizonte, v. 13, n. 45, p. 13-69, abr./jun. 1997.
17    SOUZA, E. M. C. D.; PATROCÍNIO, M. C. C. Fatores psicossociais na gênese de atos agressivos de policiais militares. In: SAMPAIO, J. R (Org.). Qualidade de vida, saúde mental e psicologia social: estudos contemporâneos II. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1999, p. 181-216.
18    THÉRIAULT, R. Qualité de la vie au travail: implications sur la gestion de la rémunération. In: BOIBOISVERT, M. La qualité de la vie au travail. Ottawa: Agence D’arc, 1980.
19    TURNER, A. N.; LAWRENCE, P. R. Industrial jobs and the worker. Boston: Harvard University Graduate school of Business Administration, 1973.
20    WALTON, R. Quality of working life: what is it? Sloan Management Review, v. 15, n. 1, p. 11-21, Dec. 1973.
21    WESTLEY, W.A. Problems and solutions in the quality working life. Human Relations, New York, v. 32, n. 2, p. 113-23, Feb. 1979.


Autores:

[1] Artigo extraído da pesquisa “Diagnóstico de Qualidade de Vida e Estresse no Trabalho da Polícia Militar do Estado de Minas Gerais”, realizada por MORAES et al. (2000) e financiada pela Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq.

Lúcio Flávio Renault de Moraes, PhD
Professor do NEACO/CEPEAD/FACE/UFMG
Soraia Aparecida Alves Ferreira, IC
Daniellie Bráz Rocha, AP
Bolsistas do NEACO/CEPEAD/FACE/UFMG
Rua Curitiba 832, sl. 1105, Centro, Belo Horizonte, MG, 30170-120
neaco@face.ufmg.br




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