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sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Prisões falham na missão de ressocializar viram escolas do crime

CADEIA DO CRIME


Convivência com outros criminosos e condições precárias são alguns dos motivos


A primeira passagem pela cadeia de Lázaro Jordão Pimentel, 33, foi pelo furto de um veículo. Ele ficou três meses preso e, ao sair, foi detido novamente, dessa vez porque tinha assaltado um banco. Foi dentro da prisão que ele conheceu “mestres” em bandidagem e se “graduou” no crime, assim como outros que entram “aluno do jardim da infância” e saem “profissionais”, como eles mesmos dizem. Um dos princípios do encarceramento, a ressocialização, ficou em um passado distante no sistema brasileiro. Parte pelo contato com criminosos de alta periculosidade, mas também por fatores como as condições precárias das prisões e a falta de qualificação e, consequentemente, de oportunidades.

Um exemplo da mudança de cenário é que até a década de 1960, a comunidade em torno da Penitenciária José Maria Alkimin, em Ribeirão das Neves, na região metropolitana da capital, frequentava o cinema do pavilhão, junto com os presos. Hoje, essa situação é impensável. “Não dá mais para fazer isso por questão de segurança. Temos gente de todo tipo, até com cem anos de condenação. O risco é de rebelião”, disse o diretor geral da unidade, Igor Tavares.

No último dia da série “Cadeia do Crime”, O TEMPO mostra como é o local onde a sociedade acredita que a violência termina: a prisão. Mas esse ‘fim’ só se aplica a no máximo 15% dos detentos, que cumprem pena e mudam de vida. Para a maioria dos presos, esse é apenas o começo de uma trajetória fora da lei. Lá de dentro, eles continuam comandando crimes e, quando saem, é na criminalidade que encontram maior oferta de emprego.

Visita. A reportagem esteve no mais antigo presídio de Minas, o José Maria Alkimin (construído em 1927), onde estão 1.700 presos, 500 a mais que a capacidade. Enclausurados, eles vivem em pavilhões que parecem antigas masmorras, sujas e escuras. De fora é possível ouvir os detentos gritando para se comunicar com os colegas. Entre as celas, eles usam barbantes para passar cigarros e o que mais quiserem.

“Cadeia é pro cara criar maldade na vida. A massa carcerária cobra isso pra não ser pego aqui fora (sic)”, explica “Zé Ninguém”, como um rapaz, com três passagens pela prisão, pede para ser identificado. Em uma cela de 4 m², com 44 presos, o também egresso Gregório Andrade, 41, conta que se revezava para dormir e usar o banheiro. “Era a antessala do inferno. O que mais eu ouvia quando um preso ia sair da cadeia era ‘firma, sociedade, que eu estou voltando’”.

Agravantes. No complexo de Ribeirão das Neves há ainda casos de presos mantidos em celas disciplinares, isolados e privados de visitas e banhos de sol, supostamente por causa da superlotação e não por terem cometido nenhuma falta grave.

Essa irregularidade foi apontada na inspeção feita pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em fevereiro deste ano. A falta de agentes penitenciários também foi destacada. “O descumprimento da lei gera um ambiente hostil que provoca rebeliões”, afirmou Guilherme Calmon, juiz do CNJ.

Sem vaga
Onze mil pessoas estão em prisão domiciliar em Minas porque não há vagas no sistema. Muitos são dos regimes aberto e semiaberto e deveriam dormir em albergues, mas a capital só dispõe de uma unidade. Quase sempre, conforme os juízes, as prisões “em casa” não são acompanhadas e não surtem efeito, fazendo com que alguns sejam pegos em novos delitos.

Menor desassistido

A situação dos adolescentes que cometem crimes segue a mesma tendência dos ‘maiores’: política de reclusão, superlotação e reincidência. A maioria dos bandidos ‘profissionais’ começou no crime ainda quando menores. “Quem está hoje na cadeia foi infrator na adolescência”, disse o promotor da Coordenação Criminal Estadual Marcelo Mattar. Atualmente, 1.800 garotos e garotas estão internados em Minas, em um sistema que conta com 1.400 vagas. “Essa é uma questão gravíssima que o Poder Judiciário enfrenta hoje. As pessoas querem que aquele menino que sempre furta a loja seja preso. Mas a internação não resolve, ele tem que ser tratado. Não há nos municípios uma rede de suporte à criança e ao adolescente para tratamento psiquiátrico e contra as drogas”, diz o juiz José Ricardo Veras.

Pensão alimentícia
Treze pessoas são presas por dia (em média), no Estado, por não pagar pensão alimentícia. Entre elas o torneiro mecânico G.C.B., 37, que alega que não sabia que estava devendo e ficou três dias no Centro de Remanejamento do Sistema Prisional (Ceresp) Gameleira. “Me pegaram na blitz de surpresa e me levaram para lá. Aquilo não é lugar de ser humano, nem o que cometeu o crime mais bárbaro. Na minha cela tinha 80 pessoas dormindo no chão. Quem cai ali sai de lá ainda mais revoltado. Muitos estavam há mais de 30 dias ou já tinham sido presos outras cinco vezes por pensão. Eles só querem prender, e não resolver o débito com o filho”. Já o juiz José Ricardo Veras acredita que esse tipo de sanção costuma ser eficiente no pagamento das pensões. Caso o detento não tenha dinheiro, ele fica preso por 60 dias e depois é solto.

85% é o índice de reincidência no crime entre os presos do sistema prisional comum
18,8 mil é o déficit de vagas nas unidades prisionais de Minas Gerais

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