* José Luiz Barbosa, Sgt PM - RR - Especialista em segurança pública.
* A muito temos defendido que o modelo militarizado de segurança pública está falido e precisando de urgentes e profundas reformas, a começar pela desmilitarização das Polícias Militares, bem como uma revisão total do inquérito policial e da legislação processual penal.
De nada adianta conceder ciclo completo de polícia à Polícia Militar, sem que se faça sua reformulação organizacional desmilitarizando sua estrutura impregnada de autoritarismo, superposição, desvalorização da autoridade policial, e de reprodução da cultura da retribuição punitivista, autoritária, invasora e violadora de direitos.
E o debate sobre a legalização das drogas se exauriu exatamente pelos resultados alcançados nesta lógica de guerra, que sempre discutiu e tratou o tráfico de drogas somente pelo viés da proibição e da repressão policial, que gera mais violência, alimentando e reproduzindo um ciclo vicioso de mais violências, mortes e violação de direitos para se justificar a dura, difícil e inócua atividade de prevenir e reprimir o tráfico de drogas.
A guerra contra as drogas está tirando a vidas de policiais, criminosos e muitos inocentes sob a incoerente e ilógica fórmula de que quanto mais repressão, menos tráfico e menos crimes, mas como estamos constatando tais medidas somente reforçam que o tratamento está recrudescendo e acirrando ainda mais a violência, sem qualquer resultado, salvo, o espetáculo para imprimir mais medo, pânico e encobrir a irreal e suposta vitória contra a criminalidade.
Durante a semana, Robson Rodrigues tem uma vida dupla. O coronel passa manhãs e tardes em seu gabinete no Quartel General da PM. Ao entardecer, ele tira a farda e vira aluno: formado em Direito e mestre em Antropologia, Robson, aos 51 anos — 31 deles na PM — é doutorando em Ciências Sociais pela Uerj. Até na faculdade, entretanto, o oficial não esquece a polícia, seu principal objeto de estudo. Em janeiro, Robson deixou os planos de aposentadoria de lado e aceitou o convite para o cargo de chefe do Estado Maior da PM, com o objetivo de transformar suas reflexões sobre a atividade policial em mudanças práticas. Numa sala da Secretaria de Segurança a poucos metros do gabinete do secretário José Mariano Beltrame, o oficial — fardado — revelou ao EXTRA que pretende aumentar o período de formação dos praças, admitiu erros na expansão das UPPs e criticou a política de guerra às drogas e o conservadorismo dentro e fora da corporação.
Por que o senhor largou a aposentadoria e voltou à PM?
A corporação passava por uma crise moral, de credibilidade, os números não estavam bons. Nosso projeto é o de modernização. Modernizar controle, processos e estrutura é prioridade, para que a PM entregue um serviço melhor.
No ano passado, integrantes da cúpula da PM foram presos em casos de corrupção. Esse é um problema institucional?
A corrupção existe em qualquer lugar. A PM está mais visível, como braço da força do estado. Só que o nível onde ela chegou, isso nunca tinha acontecido. Chegou aos altos escalões. Esse combate virou responsabilidade cívica. Por isso, muita gente foi afastada.
Você é a favor da desmilitarização da PM?
Eu sou a favor do serviço policial de natureza civil numa sociedade democrática, só que sou pragmático. Sou a favor da modernização antes da desmilitarização. Na identidade militar, temos bons princípios, como controle, organização e planejamento. Precisamos recuperar isso. Mesmo dentro do militarismo, que eu não acho que seja o melhor modelo, perdemos a essência.
A PM é o maior alvo de críticas quando o assunto é segurança pública. A que você acha que isso se deve?
A uma herança maldita da ditadura que a PM carrega até hoje. A ditadura construiu um desenho institucional bem planejado para um controle totalitário. Nesse cenário, a PM era a extensão da ditadura nas ruas. Passamos a um período democrático e o mesmo arcabouço permaneceu inalterado. Temos que prestar contas e defender os direitos da cidadania, mas temos o mesmo leque de atribuições. A PM faz desde a briga por furto de passarinho até a criminalidade transnacional na favela.
Você acha que a PM gasta tempo e recursos demais com a guerra às drogas?
A política de combate às drogas, que gerou o proibicionismo, fracassou. O pretexto da guerra era o de que ela iria acabar com o tráfico, diminuir o consumo e a violência. Aconteceu ao contrário. Hoje, muitos estados americanos legalizaram o consumo. Nós continuamos aí. O que consome nossas energias é isso. Se acabasse, talvez sobrasse mais tempo para que combatêssemos o grande traficante de armas e de drogas, os grupos de extermínio... A PM foi convidada para uma dança, e ficou dançando sozinha com uma venda nos olhos. Quem convidou para dançar já saiu há muito tempo.
Como você avalia a formação policial hoje?
Essa é uma área que vai passar por mudanças. Vamos diminuir tempo para formação de oficiais e aumentar o tempo para formação de praças. O fluxo de carreira será meritocrático, os melhores vão ascender. O praça vai ter oportunidade de ter uma formação continuada, chegar a oficial. Mas não acho que haja problemas no currículo. Existe toda uma cultura que não nasce na polícia, mas na sociedade. O policial está em inserido em nossa sociedade elitista, conservadora, o que gera impactos na corporação.
As UPPs falharam?
As UPPs são um ótimo produto, mas precisam ser aprimoradas. Houve equívocos? Houve. Se criou uma expectativa muito grande de que a polícia iria resolver tudo. Se tivéssemos feito investimentos em qualidade, talvez não tivéssemos avançado tão rápido.
Dá para consertar os erros?
A UPP estava isolada dentro da corporação. Percebemos isso e remodelamos. Criamos dois núcleos: um de ocupação segura, com homens do Bope, e outro de proximidade. Por isso dividimos as comunidades por graus de risco. Quando percebemos um nível crítico, entra o núcleo de ocupação segura. Mas não podemos esquecer da pacificação e nos lançarmos para a guerra, como já aconteceu.
Como a PM se posiciona sobre a maioridade penal?
Nossos jovens estão sendo dizimados, tanto policiais quanto moradores de favelas. É uma covardia achar que a polícia vai resolver o problema. Se vai continuar como está ou não, não importa. O que importa é que nós vejamos o que produz isso. A maior parte dos menores encaminhados para delegacias são vítimas, e não autores.
Fonte: http://extra.globo.com/
Mais de 50 mil assassinatos por ano. Por que não assumirmos o fracasso na guerra contra os assassinos e implantarmos o abolicionismo penal de Louk Hulsman? Sou favorável à liberação das drogas porque sou contra qualquer intromissão indevida por parte do Estado na vida do cidadão. O que não resulta em danos para terceiros não deve ser criminalizado. Se determinado cidadão quer se drogar até as tampas, que o faça!, desde que não implique danos para terceiros. Mas claro que há de se pensar em um modelo que tribute a venda de drogas para o custeio do impacto que a liberação teria no nosso já combalido sistema de saúde. Aí entra o problema: lojas legalizadas vendendo drogas mais caras devido à tributação vs. traficantes vendendo drogas sem tributação. Será que a medida acabaria mesmo com a figura do traficante na nossa sociedade? Sou um tanto cético com soluções simples para problemas complexos.
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