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domingo, 17 de janeiro de 2016

Água, direito humano fundamental e sua proteção penal no ordenamento jurídico brasileiro das ordenações medievais do reino às normas de controle dos crimes ambientais

Razões de ordem ético-política e econômico-social, que elevam a água à categoria de bem jurídico, justificam a intervenção do Direito Penal Ambiental como sistema de controle e proteção.
Resumo: O objetivo deste artigo científico é o de investigar e analisar as normas promulgadas, no âmbito do sistema criminal brasileiro, com o fim de estabelecer a prevenção e repressão das condutas poluidoras da água potável e dos recursos hídricos, considerados como elementos naturais integrantes do ambiente ecologicamente equilibrado.O estudo inicia com um breve relato das normas prescritas pelo Direito Criminal da época colonial para terminar com a análise do ordenamento jurídicopenal em vigor.
Palavras- chave: Água. Direito penal. Crime ambiental.

INTRODUÇÃO – ESCASSEZ DOS RECURSOS HÍDRICOS E NECESSIDADE DE UMA POLÍTICA PÚBLICA RACIONAL PARA O USO E PRESERVAÇÃO DA ÁGUA

A atual grave crise hídrica que atinge os reservatórios das grandes hidrelétricas e represas para abastecimento de água das regiões sudeste e nordeste do Brasil é a demonstração evidente da necessidade de tratarmos, com seriedade e responsabilidade ambiental, a questão da gestão e do consumo de água em nosso país.[1]
Sabe-se que a cultura do consumismo desenfreado e da exploração dos recursos naturais em larga escala tem dificultado a preservação e a qualidade da água.  Os danos causados pela atividade humana poluidora do ambiente refletem necessariamente nas reservas e qualidade da água. Essa contínua e veloz cadeia contaminante afeta todo o equilíbrio ecológico, pois não se pode falar em água de modo isolado.[2]
Segundo dados a ONU, 748 milhões de pessoas enfrentam a falta d´água no mundo, sendo 36 milhões na América Latina.[3] Esta advertência coincide com o pensamento de Gabriel Real Ferrer, que defende a necessidade imperiosa de proteger o ambiente por meio de todos os mecanismos de prevenção e de repressão, aí incluído o Direito como instrumento de controle das condutas individuais e coletivas: “La Humanidad, al menos de momento, tiene que conformarse con lo que tiene, porque no hay nada más allá. Esta noción es tan elemental como rigurosamente nueva en la historia del Hombre y le obliga a trascendentales cambios conceptuales”.[4]
Fica, assim, evidenciada a necessidade fundamental de se buscar a proteção jurídica da água, para que seu uso e consumo se faça de forma racional e de forma a manter o equilíbrio das condições essenciais à existência da vida humana e do próprio Planeta Terra.
No caso da intervenção penal, deve o Estado estabelecer, por meio de uma Política Criminal comprometida com o princípio constitucional do ambiente ecologicamente equilibrado, o elenco das normas indispensáveis ao efetivo controle das condutas potencialmente ofensivas ao bem jurídicopenal essencial à vida humana, que é a água em toda a sua dimensão de recurso natural renovável, mas finito.

1. ÁGUA COMO BEM JURÍDICO ELEVADO À CATEGORIA CONSTITUCIONAL

1.1 AS DISCUSSÕES E DIRETIVAS APROVADAS EM NÍVEL MUNDIAL 

O reconhecimento do meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, como um direito fundamental da pessoa humana, não poderia excluir a água como um dos elementos naturais integrantes desse direito fundamental, assim como o ar, a fauna, o solo e a flora. El Derecho Ambiental se singulariza cuando su objeto es la protección del Ecosistema Planetario.[5]
A água é o elemento mais importante da Terra, pois permitiu a aparição e a manutenção da vida no planeta e por isso é crucial à efetivação do equilíbrio ecológico em escala global. Por se tratar de um recurso limitado (há três bilhões de anos ela não aumenta e nem diminui de quantidade),[6] é preciso efetivar a sua proteção para que ela não falte aos seres vivos que dela dependam.[7] Riccardo Petrella alerta: água é direito à vida. Ao comentar esta citação em sua obra Paulo Affonso Leme Machado complementa que negar água ao ser humano é negar-lhe o direito à vida. O direito à vida é anterior aos outros direitos.[8]
Em razão dessa realidade contemporânea e de seu elevado valor éticopolíticojurídico e socioeconômico, a doutrina vem sustentando que a água é um direito humano fundamental. A primeira iniciativa em nível mundial, ocorreu no ano de 1977, quando foi realizada a Conferência sobre a Água, em Mar del Plata na Argentina. Anos depois, em 1992, aconteceu na Irlanda (Dublin), a Conferência Internacional sobre a Água e Meio Ambiente. Entre outras diretivas, reconheceu e chamou a atenção para a finitude da água, bem como a necessidade de sua preservação, com a recomendação para que os Estados adotassem gestões de recursos hídricos.
Nesse mesmo ano, realizou-se a ECO – 92. Sua Agenda 21, proclama que “A água é necessária em todos os aspectos da vida” e que, por isso, é indispensável assegurar “uma oferta adequada de água de boa qualidade para toda a população do planeta” (Capitulo 18).
Devem ser mencionados, também, os seguintes eventos mundiais organizados com a finalidade de tratar da preservação e do uso racional da água: I Fórum Mundial da I Fórum Mundial da Água, realizado em 1997, no Marrocos; II Fórum Mundial, em Haia, na Holanda, no ano de 2000 e o III Fórum Mundial, ocorrido no Japão, em 2003. Durante o IV Fórum Mundial da Água, na Cidade do México, em 2006, foi aprovada a proposta reconhecendo que “a água - essência da vida - constitui um direito humano básico”.
Finalmente, é preciso assinalar que Assembleia Nacional da ONU, em 28 de julho de 2010, proclamou “o acesso à água potável como um direito humano fundamental, como se observa no relatório da Assembleia: “Assembleia Geral reconhece o acesso à água como um direito humano.”[9]
Recentemente, a Igreja Católica, preocupada com a degradação ambiental e com a atual crise hídrica mundial, publicou a Encíclica Laudato Si, chamada de Carta Verde, na qual adverte que a cultura do desperdício, do descarte e do consumismo exagerado, praticada pelos países mais ricos, torna-se incompatível com o desenvolvimento sustentável e com o dever de preservação ambiental.
Depois de sustentar que a “água potável e limpa constitui uma questão de primordial importância, porque é indispensável para a vida humana e para sustentar os ecossistemas terrestres e aquáticos”, a Encíclica papal proclama que “o acesso à água potável e segura é um direito humano essencial, fundamental e universal e, portanto, é condição para o exercício dos outros direitos humanos”.[10]
Vladimir Passos Freitas acredita que, pela importância da Igreja Católica e a liderança do Papa Francisco em todo o mundo, o texto da carta encíclica vai “gerar forte influência nas atividades ligadas à proteção do meio ambiente, inclusive no Direito”.[11]

1.2 DIREITO À ÁGUA NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA

Nossa Carta Magna não elevou a água à categoria normativa de um direito fundamental, pois seu art. 5º, com inúmeros incisos e parágrafos, é omisso a esse respeito.[12] No entanto, como elemento integrante e essencial ao meio ambiente, a ela é aplicável o enunciado do art. 225 caput da CF/88.[13] Por sua vez, leciona Celso Fiorillo que a água, ao ser definida como exemplo didático de “bem essencial à sadia qualidade de vida”, passou a ser caracterizada juridicamente como bem ambiental (art. 225 da CF).[14] Da mesma forma, Manoel Gonçalves Ferreira Filho diz que  água deve ser entendida como direito humano fundamental de terceira geração, pois integra o meio ambiente que possui o mesmo status.[15]
O reconhecimento da água como direito fundamental atribui ao Estado, numa atuação conjunta com a sociedade, a tutela efetiva da água.[16] É preciso, portanto, preservar, gerenciar e racionalizar a água, fonte de vida do planeta, impedindo desta forma que o mundo caia num quadro sombrio de exploração, consumo e supervaloração econômica. (...) O acesso universal à água potável é um direito humano, fundamental de todos.[17]
Com base nessas reflexões que colocam a água como direito humano fundamental e essencial à qualidade de vida e ao equilíbrio ecológico passa-se a examinar os fundamentos da proteção jurídicopenal da água como elemento integrante do meio ambiente ecologicamente equilibrado. A questão é a de saber alguns fundamentos que justifiquem a intervenção criminal em condutas que poluam ou contaminem a água e prejudiquem diretamente o próprio equilíbrio ecológico.

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