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quinta-feira, 14 de junho de 2012

Só seis senadores se dizem a favor do voto secreto

Levantamento feito pelo Congresso em Foco mostra ampla maioria de apoio à extinção do sigilo de voto no Congresso em temas como a cassação de mandatos. Se é assim, por que, então, a mudança não é votada?

Demóstenes diz que é a favor do voto aberto nos casos de cassação de mandato. Para ele também?
O discurso é um, a prática é outra. Dos 81 senadores em exercício nesta legislatura (2011-2018), 69 dizem ser favoráveis ao fim do voto secreto em casos de cassação de mandato. Apenas seis declaram-se frontalmente contrários ao voto aberto nessa situação, três dos quais do PMDB. Seis preferiram não adiantar seu voto ou disseram ainda não ter formado opinião sobre o assunto. Os números constam de levantamento feito com exclusividade pelo Congresso em Foco, a partir de entrevistas feitas com os próprios senadores ou por informações das suas assessorias.

Até o senador Demóstenes Torres (ex-DEM-GO), que responde a processo de cassação no Conselho de Ética por seu envolvimento com o esquema do bicheiro Carlinhos Cachoeira, declara-se favorável ao voto aberto. Se é assim, se há essa tão grande maioria favorável ao fim do sigilo do voto nesses casos, por que a proposta do voto aberto nos julgamentos de cassação dos mandatos tramita há quase 12 anos no Congresso sem decisão final? Por que a decisão de finalmente colocar as propostas de emenda à Constituição (PECs) que tratam do tema em votação foi novamente adiada nesta semana? Por que tudo indica que o caso de Demóstenes ainda será decidido por voto secreto?

Além da cassação, o voto secreto é previsto em outras situações no Congresso, como apreciação de veto presidencial, indicação de autoridades e composição de mesas diretoras, entre outras. Para simplificar, porém, o Congresso em Foco limitou a pergunta aos senadores ao voto secreto nos processos de cassação. “O (a) senhor (a) é a favor ou contra o voto aberto para cassação de mandato?”, foi a pergunta.
A profunda diferença entre o que os senadores declararam e a realidade na tramitação das  PECs sobre o tema chama a atenção. A PEC mais antiga sobre o tema é de 2001. Foi apresentada pelo ex-deputado e ex-governador de São Paulo Luiz Antonio Fleury (PTB). Foi aprovada em primeiro turno pela Câmara em 2006 e, desde então, não há qualquer vestígio de decisão para a sua votação em segundo turno.
Enquanto a PEC de Fleury mofa na Câmara, no Senado, o presidente José Sarney (PMDB-AP) – após pressão feita por parlamentares em razão do caso Demóstenes, reforçados pela formação de uma Frente Parlamentar pelo Voto Aberto – resolveu colocar na pauta de votação três outras PECs de senadores que pregam o fim do voto secreto. São elas as PECs 50/2006, de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS); 86/2007, do líder do PSDB no Senado, Alvaro Dias (PSDB-PR), e38/2004, apresentada em 2004 pelo então senador Sérgio Cabral (PMDB-RJ), atual governador do Rio de Janeiro.
As três propostas já foram aprovadas pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) – as duas últimas, que tramitam em conjunto, foram aprovadas em 2010, quando o colegiado era presidido, por coincidência, pelo próprio Demóstenes Torres, cada vez mais isolado na atividade legislativa. Inicialmente, as PECs seriam colocadas em votação na sessão de quarta-feira (12), mas os líderes resolveram adiar a discussão para depois do fim da Conferência Mundial sobre o Meio-Ambiente, a Rio+20, que começou ontem (13) e chega ao fim no dia 22. Ou seja, novo adiamento sobre uma decisão que se prolonga desde 2001.
Não decisão
Para o professor de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB), Leonardo Barreto, a marcha lenta adotada pelo Congresso para a extinção do voto secreto é um caso típico em que a não decisão é uma forma de decidir. “Isso é um caso clássico daquilo que a gente chama de não decisão – não decidir é também uma forma de decidir.”
Para Leonardo, fica claro que, na verdade, os parlamentares evitam ter de tomar uma decisão. “Vamos imaginar que, a priori, os parlamentares são contra abrir o voto, mas como isso é uma posição impopular, eles não querem assumir essa posição e arcar com o desgaste político disso”, observa o acadêmico. Eis a explicação para o fato de eles declararem uma posição pelo fim do voto secreto, mas, na prática, agirem no sentido contrário. “Ao não decidir, eles mantêm o status quo atual. E, dessa maneira, eles estão fazendo uma opção política.”
Trata-se uma conduta, diz Leonardo, tanto de omissão quanto de oportunismo. “Eles nem dizem que sim, nem dizem que não, e deixam-na [a PEC do Voto Aberto] na agenda. Isso é uma maneira que eles têm de sair de uma situação embaraçosa”, acrescenta Leonardo, explicando que, quando determinados parlamentares são instados a explicar por que não apreciam as proposições sobre o voto aberto, dizem que querem votar a proposta, mas recorrem à desculpa de que, “infelizmente”, as lideranças do Congresso não a incluem na pauta.
Salvo-conduto
Assim, o voto secreto vai funcionando como um biombo para que parlamentares, que nada mais são que representantes do povo, possam adotar determinadas posturas sem ser cobrados por agir de modo contrário ao que deseja a população. Recentemente, mesmo flagrada em vídeo recebendo dinheiro de propina, a deputada Jaqueline Roriz (PMN-DF) foi salva pelo voto secreto de seus colegas em plenário. Antes, em 2007, Renan Calheiros (PMDB-AL) também se livrou da cassação no Senado graças ao voto secreto. Ambos tinham sido antes condenados no Conselho de Ética, instância na qual o voto é aberto.
Pressão da sociedade
Para Leonardo Barreto, porém, a pressão constante da sociedade acabará fazendo com que os parlamentares cedam. Agora mesmo, depois do novo adiamento, ficará difícil aos senadores encontrarem outra desculpa para não votarem as PECs colocadas em pauta por Sarney. Na avaliação do cientista político, a divulgação da lista de como votará cada senador sobre as propostas de emenda à Constituição que abrem o voto em decisões do Congresso é “pertinente e essencial”.
“Isso é um sinal de nossa vitalidade democrática, que está crescendo. Esses caras estavam acostumados a se ver em um isolamento muito grande, em um sentimento de corporativismo forte, inclusive com a ação da grande mídia, com os poucos órgãos que tinham acesso a esses lugares. Os novos órgãos de imprensa – muitos especializados na cobertura do Legislativo, como é o caso do Congresso em Foco – aumentam as ferramentas de pressão. Assim, criam-se instrumentos muitos fortes de controle social. Muitas vezes vocês fazem não só jornalismo, mas controle social. Isso é extremamente importante aqui, nos Estados Unidos, em muitos lugares do mundo”, analisou Barreto.

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