O título deste post me ocorreu agora que o STF volta a julgar, a partir de quarta-feira (9), a descriminalização do consumo individual de drogas no país. Dependendo da sentença, poderá favorecer uma nova abordagem ao problema das drogas no país, que o tire da lógica da “guerra”. A eficácia da “guerra” vem sendo contestada em diferentes partes do mundo.
No Brasil, e segundo o artigo 28 da lei Antidrogas, portar drogas para uso pessoal não dá cadeia, mas a pessoa pode ser penalizada com advertência, prestação de serviços à comunidade e medidas educativas. O STF vai julgar se este artigo fere ou não a Constituição – e aqui entra um rol de argumentos jurídicos que giram em torno à inviolabilidade da intimidade e à vida privada do cidadão.
A descriminalização do consumo a ser examinada pelo STF ajudaria a separar usuários de traficantes. São mais de 130 mil presos por tráfico de drogas no país. Muitos, porém, seriam, de acordo com defensores públicos, usuários, apenas, o que além de ilegal, aguça o problema da superlotação dos presídios. Muitos presídios, por sua vez, estão em estado precário e dominados por facções criminosas, o que faz do problema uma bola de neve.
Mais um exemplo gritante disso foi dado na semana passada quando apareceu o vídeo de presas em São Paulo comemorando os 22 anos do PCC. Nas imagens, uma bandeja de cocaína com as iniciais do PCC é consumida em fila, com o pavilhão tomado por mulheres em branco e laranja gritando é o 15!, como é chamado o comando. Comando que, alguns anos atrás, paralisou a capital paulista, dando mostras da dimensão do teatro que é a segurança pública não apenas em SP mas em todo o país quando se trata do poder real do narco e de suas relações com o Estado. Secretários de segurança fingem que mandam, a população finge que acredita e o business segue com seus atores principais à sombra (e turbinados por muito dinheiro).
Alguns anos atrás, entrevistando um ex-diretor geral da Polícia Federal, ele me contou que havia prendido no Ceará um traficante dos cartéis colombianos, que lhe contara que o problema do narco, naquela época, era que o dinheiro, abarrotado em armazéns, estava fisicamente se estragando, como frutas. Daí a necessidade urgente de colocá-lo no sistema financeiro: lavar o dinheiro é tão importante quanto vender a droga, me disse o policial. Mas, enfim, e sobretudo: como enfrentar militarmente uma organização que tem papel-moeda abarrotada em armazéns, dinheiro que compra policiais, políticos, juízes?
A lógica da ilegalidade favorece o crime organizado e o tráfico. Essas organizações e cartéis vendem um produto para o qual há uma demanda intensa, livre de pagamento de impostos ou qualquer tipo de regulação. É um negócio com alta taxa de retorno. A ilegalidade alimenta, ainda, alianças subterrâneas entre organizações criminosas e representantes do Estado.
Presídios superlotados e dominados, no mais das vezes, por facções criminosas, sugerem que prender, prender, prender, pode não ser a solução. Este é um ponto cego da política atual sobre as drogas: o encarceramento em massa pode estar contribuindo para retroalimentar o tráfico e a violência. Drogas e seu tráfico matam, desestruturam famílias e corroem vidas pessoais. Por outro lado, usuários, principalmente se moradores de favelas e das periferias, são muitas vezes enquadrados como traficantes e presos.
Nestes termos a discussão no STF sobre a descriminalização das drogas pode ser um alento. Oportunidade para lançar luz sobre uma discussão cheia de sombras.
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Imagem: Tico/Flickr
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