Basicamente, três posições competem no partido: os que acham que a decisão do STF deve ser aceita; os que acham que o caráter político da condenação deve ser duramente denunciado, e os que ficam num meio-termo entre os dois grupos
Na reunião que teve com a bancada de senadores do partido na última quarta-feira (31), o presidente do PT, Rui Falcão, informou que, após o final do julgamento do mensalão, será divulgada uma dura nota com um posicionamento oficial sobre o caso. A intenção é que a nota explicite alguns pontos que vêm sendo repetidos por petistas desde que o julgamento iniciou-se no Supremo Tribunal Federal (STF): a coincidência do calendário com as eleições municipais, os aspectos políticos de alguns posicionamentos dos ministros, a falta de provas para sustentar algumas condenações. Há, porém, um problema que dificulta a redação da nota: não há unidade no PT sobre o que deve dizer o texto, até onde se deve ir, até onde o partido deve confrontar-se com o STF, até onde é possível denunciar excessos no julgamento sem perder a razão e até que ponto o partido deve correr o risco do desgaste na defesa de seus companheiros condenados.
Basicamente, há no PT três posições distintas sobre como deve se formar a reação do partido ao mensalão. A essas posições somam-se discussões de estratégias políticas que complicam um pouco mais o quadro. Um grupo, liderado pelo governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, prega que o partido deve reconhecer o resultado do julgamento, não se opor a ele e liderar reformas e mudanças no sistema político e no formato das coalizões para evitar que novas situações parecidas se repitam. Há outro grupo, mais ligado ao ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, que acha que o partido deve denunciar duramente os aspectos políticos e a falta de sustentação jurídica (na opinião deles) do julgamento. E, finalmente, há um grupo mais moderado que oscila entre as duas posições, cujo representante mais visível é o senador Jorge Viana (PT-AC). Para esse grupo, erros foram cometidos, ainda que alguns aspectos do julgamento possam ser questionados. Mas o que o PT fez não é diferente do que fazem os demais partidos. Assim, nenhuma outra legenda tem condições de dar lições de moral no PT a esse respeito.
A disputa entre os três grupos dificulta ao partido encontrar o tom exato da nota que pretende fazer para se posicionar sobre o julgamento. Além disso, competem para complicar o quadro algumas estratégias pensadas. Na mesma reunião, Rui Falcão e os senadores discutiram que o partido deve exigir da Justiça que julgue com o mesmo rigor o mensalão do PSDB de Minas Gerais, que tem como protagonista o deputado Eduardo Azeredo. Há, porém, um problema: se o PT denunciar que o julgamento de seu mensalão foi político e que os réus foram condenados sem provas, como poderá depois argumentar que no caso do mensalão tucano foi diferente? Afinal, segundo a acusação, o sistema usado foi basicamente o mesmo: nos dois casos, os partidos valeram-se do publicitário Marcos Valério para forjar empréstimos e contratos de publicidade (no caso do mensalão mineiro, para promover eventos esportivos).
Desgaste
Há no PT também quem tema que o desgaste político seja maior caso o partido parta para um confronto mais forte com o Supremo Tribunal Federal. Chegou-se a aventar, por exemplo, a hipótese de pedir à presidenta Dilma Rousseff que não comparecesse à posse de Joaquim Barbosa na presidência do STF. Dilma negou-se: é chefe do Poder Executivo, não poderia misturar as atribuições do seu cargo com questões partidárias.
Na verdade, porém, Dilma busca manter distância do caso. Durante todo o julgamento, ela só se manifestou quando Joaquim Barbosa mencionou algo que a envolvia diretamente: as negociações para aprovar medidas do setor elétrico no tempo em que ela era ministra das Minas e Energia. “Ela não pretendia se envolver no julgamento. Mas a presidenta é muito ciosa do seu próprio trabalho. Ela não poderia aceitar qualquer insinuação de que algo irregular pudesse ter sido feito na seara que ela administrava”, explica um assessor da Presidência da República.
Os novos líderes
Ainda que Tarso Genro não tenha força para fazer prevalecer seu grupo, há quem aposte que pode ser numa junção das suas posições com a dos moderados como Jorge Viana que venha o caminho mais provável para o PT pós-mensalão. Logo depois que o caso veio à tona, Tarso assumiu a presidência do partido. Naquele momento, a intenção era admitir que erros foram cometidos e fazer o que o governador do Rio Grande do Sul batizou de “refundação do PT”. Mas, com a retomada da popularidade do governo Lula, essa ideia foi sendo abandonada. Com as condenações ao final do julgamento, Tarso as retoma. O que alguns petistas imaginam é que, longe de ser com a liderança dele, que é minoritário no partido, pode crescer um posicionamento semelhante, talvez mais próximo do que vem dizendo Jorge Viana, surgido, porém, dos novos líderes do partido, que ascenderam com a queda do grupo que dominava o PT e perdeu espaço com o mensalão.
A própria presidenta Dilma faz parte desse grupo. E desde o início do governo ela já procurou dar mostras de uma reação mais dura com casos de corrupção, quando, por exemplo, afastou vários ministros após denúncias. Também pode se agregar a esse grupo o prefeito eleito de São Paulo, Fernando Haddad.
O que se teme, no caso, é que o PT sofra um desgaste no caso de uma defesa mais forte dos condenados. E outros lucrem com isso. Mais exatamente o PSB do governador de Pernambuco, Eduardo Campos. Ele, como aliado, poderia vir a lucrar com as ações positivas do governo Dilma sem ter sobre ele o estigma do mensalão. Ele não tem a menor obrigação de defender “companheiros” condenados pelo STF. Não tem que tentar mobilizar militantes para a inglória tentativa de, provavelmente em vão, tentar demonstrar que o julgamento foi político e movido por interesses oposicionistas. Não terá que se esforçar para tratar como se fossem mártires um grupo de futuros presidiários. São essas constatações que adiam a adoção prática da reação do PT ao julgamento do mensalão.
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