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quarta-feira, 20 de novembro de 2013

PMs denunciam maus tratos de juiz de Ribeirão das Neves

Magistrado pediu que audiência pública da Comissão de Direitos Humanos da ALMG fosse cancelada.

Em tom de indignação, policiais militares e representantes de entidades de classe denunciaram, nesta quarta-feira (20/11/13), o desrespeito e os maus tratos do juiz Fabiano Afonso, da 1ª Vara Criminal e do 1º Tribunal do Júri de Ribeirão das Neves (RMBH), não apenas contra os PMs, mas também em relação aos servidores públicos do Tribunal de Justiça e advogados. Os relatos contra o magistrado dominaram a audiência pública realizada pela Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), com o intuito de debater a forma desrespeitosa com que o magistrado teria tratado vários policiais militares durante as audiências, bem como suposta discriminação aos moradores desse município.
De acordo com os relatos, os militares iam para as audiências na condição de testemunhas, mas o juiz os transformava em réus. Além de gritar e desqualificar policiais e servidores do tribunal, constrangendo e humilhando os PMs, o juiz exigia, em algumas situações, que policiais fizessem continência para ele – norma restrita aos militares. Em uma das audiências, Fabiano Afonso teria dito que “Ribeirão das Neves é constituída de favelas e semianalfabetos”. Tais fatos têm deixado os policiais do 40º Batalhão da Polícia Militar da cidade com medo de participar das audiências comandadas pelo juiz.
O deputado Sargento Rodrigues (PDT), autor do requerimento para a audiência pública, fez um levantamento das denúncias contra o magistrado, que tiveram início em janeiro de 2010. “Antes disso, contudo, quando atuava na comarca de Araguari (Triângulo), também houve reclamações contra o juiz Fabiano Afonso”, disse o parlamentar, o que foi confirmado pela presidente do Sindicato dos Servidores da Justiça de Primeira Instância do Estado de Minas Gerais (Serjusmig), Sandra Margareth Silvestrini, Ela ressaltou que os servidores do tribunal de Ribeirão das Neves também sofrem e, como estão diretamente subordinados ao magistrado, têm medo de fazer denúncias e sofrer retaliações. “Temos levado essas denúncias para a Corregedoria Geral de Justiça, que precisa agir prontamente”, avaliou.
“Somos solidários a essa luta. É uma pena que esse juiz tenha passado por Araguari e que nada tenha acontecido com ele”, observou o diretor institucional da Associação dos Servidores do Corpo de Bombeiros e Polícia Militar de Minas Gerais (Ascobom-MG), Raimundo Meneses Araújo.
O presidente da comissão, o deputado Durval Ângelo, informou, no início da reunião, que uma petição do juiz Fabiano Afonso, encaminhada à comissão e também ao presidente da ALMG, deputado Dinis Pinheiro (PP), solicitava que a audiência pública fosse suspensa ou cancelada, pois, segundo o juiz, “investigação de magistrado é da alçada do Tribunal de Justiça e, assim, a ALMG não poderia investigá-lo”. Disse também que nunca destratou policiais nem a população de Ribeirão das Neves. Segundo o juiz, “não é competência da comissão tratar de segurança pública”. Finalmente, o juiz disse que o Sargento Rodrigues havia se dirigido a ele de forma desrespeitosa, o que poderia ensejar perda de mandato de Rodrigues, pois estaria quebrando decoro parlamentar. Tanto o presidente da ALMG quanto o presidente da Comissão de Direitos Humanos decidiram realizar a audiência pública.
Para Durval Ângelo, o juiz se equivocou ao pedir suspensão da audiência, pois, com base no Regimento Interno da ALMG, às comissões legislativas compete esclarecer matéria de interesse público. Portanto, essa audiência não ofende norma regimental. “Todos os assuntos de interesse da sociedade podem e devem ser tratados no Parlamento mineiro. Tentar impedir isso é crime de improbidade administrativa”, alertou. Sargento Rodrigues acrescentou que foi dada oportunidade para o magistrado se defender, mas ele não compareceu à reunião desta quarta-feira. “Vamos dizer ao juiz que essa comissão não vai se furtar a exercer o direito de petição: qualquer cidadão pode se dirigir a qualquer órgão público e peticionar”, advertiu.
“Se o juiz teve a insensatez de ameaçar deputado com perda de mandato, o que ele pode fazer com um soldado? Esse cidadão não merece o nosso respeito. Os militares que chegam como testemunha saem na condição de réu. Que segurança eles terão para desempenhar suas funções nessa condição? Isso precisa de um basta”, argumentou o sargento Héder Martins de Oliveira, diretor jurídico da Associação dos Praças Policiais e Bombeiros Militares de Minas Gerais (Aspra PM/BM).
No caso mais polêmico, cinco policiais militares prenderam este ano um traficante com 15 pedras de crack. Segundo os policiais, o criminoso estava machucado antes da prisão, tiveram autorização da mulher dele para entrar na casa e encontrar pedras de crack. No dia da audiência, o juiz inverteu a situação, afirmando que os PMs não tinham mandado de busca e apreensão, torturaram o traficante e cometeram abuso de poder. Mandou prender os militares e soltar o traficante. Um dos presos, o sargento Carlos Alberto Rocha, com 22 anos na corporação, dos quais 16 em Ribeirão das Neves, ficou 18 dias preso, perdendo inclusive o aniversário da filha. “Eram cinco militares contra um bandido, e a palavra dele valeu mais do que a nossa”, disse o sargento.
Presidente do Sindicato dos Oficiais de Justiça de Minas Gerais (Sindojusmg), Wander da Costa Ribeiro, relatou um caso em que uma mulher se negou a ser jurada, tendo em vista que o réu era traficante e morava próximo à casa dela. “Em reação, o juiz disse, na frente do guarda que conduzia o réu e do júri: 'Esqueci que aqui em Ribeirão só tem favelado'. Ele não respeita ninguém na cidade, não só os servidores como as pessoas que residem naquela comarca”, afirmou Ribeiro.
Para advogado, atitude do juiz é crime de tortura
Outras categorias também reclamaram do relacionamento com o juiz. O diretor jurídico do Centro Social dos Cabos e Soldados da Polícia Militar e Bombeiro Militar de Minas Gerais (CSCS), Fábio Queiroz, afirmou que o juiz que destrata advogado está destratando o próprio Judiciário. “Pesquisei seu currículo. Faz doutorado na PUC-MG, então esperava-se que tivesse postura mais adequada. A postura dele é contrária ao Estado Democrático de Direito”, afirmou. “O que o juiz está fazendo, submetendo os militares a humilhações e desrespeito, é crime de tortura”, disse Queiroz. Nesse momento, Durval Ângelo propôs que entidades de classe entrassem com representação contra o magistrado alegando crime de tortura.
“Temos feito um trabalho para reduzir a criminalidade em Ribeirão das Neves, com treinamento dos PMs, de maneira que possamos servir aquela comunidade de forma ética e dentro dos limites legais. O índice de letalidade (ou seja, disparos com armas, de policiais) é quase zero. Isso só se consegue com tropa treinada, pois os enfrentamentos são muitos. Contudo, quase metade da minha companhia está aqui porque esse juiz impõe medo nas pessoas”, disse o comandante do 40º Batalhão, 1º tenente Marcelo Rodrigues da Silva.
O comandante anterior do batalhão, major Fabrizio Cortenzo, reforçou a fala do 1º tenente. Para Cortenzo, tanto o comando anterior quanto o atual tomaram providências sobre as reclamações. “Não houve omissão. O que eu posso testemunhar é que nossa tropa está com medo”, frisou.
Deputados e militares fazem encaminhamentos
De acordo com o deputado Durval Ângelo, o Tribunal de Justiça tem que tomar providências rapidamente. Ele também disse que levará o fato ao conhecimento do comandante-geral da PMMG, coronel Márcio Martins Sant'ana. “Vamos encaminhar esse caso ao Conselho Nacional de Justiça. Um homem como esse demonstra desequilíbrio. Já conseguimos o afastamento de oito juízes e de um desembargador”, destacou.
Segundo o deputado Cabo Júlio (PMDB), com essas atitudes o magistrado está dizendo aos policiais que o inimigo do juiz não são os criminosos, mas os militares. “O cidadão se acha acima do bem e do mal. Um juiz que desrespeita o Estado, estimula o traficante e desestimula soldados. O Conselho Nacional de Justiça precisa tomar providência. A área institucional da polícia precisa agir também. Do jeito que está não dá”, afirmou.
O coronel Antônio Damásio, membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB, disse que irá encaminhar relatório ao Conselho Nacional de Justiça e pedir que sejam tomadas providências contra o juiz. “Ele está rasgando a Constituição”, disse.
Também apresentaram relatos sobre o magistrado os 2ºs sargentos Geordane Geraldo Rocha e José Felipe de Oliveira Filho; o 3º sargento Valter Lúcio Randi Vitório; os cabos Kleber de Amorim e Glaysson Morais de Lima; e o soldado Samuel Marcos Barbosa Gomes, todos do 40º Batalhão da Polícia Militar de Ribeirão das Neves. O 3º sargento Leonardo José Pinto de Souza sintetizou o sentimento da corporação: “Somos treinados a suportar situações adversas. Quando reclamamos é porque chegou a um ponto muito além do suportável”.

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