Moradores da cidade reclamam de prisões por motivos fúteis e abordagens com armas.
Abuso de poder e truculência desnecessária. Essas foram as denúncias contra dois policiais militares de Felixlândia (Região Central do Estado) apresentadas, nesta segunda-feira (18/11/13), durante audiência pública da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realizada no município.
O cabo Rogério Gonçalves Mendes e o soldado Thiago Almeida, do 4º Pelotão da 218ª Cia. da PM em Felixlândia, foram acusados de fazerem abordagens violentas contra pessoas que estavam na cidade, entre elas o servidor da ALMG Alex Sander Lara. Presente à reunião, o soldado Thiago Almeida negou os excessos e justificou que no interior é comum “ter gente que acha que manda na PM”.
Alex Sander Lara explicou que chegou à cidade para participar da audiência pública e enquanto aguardava um colega em frente à agência bancária do Sicoob, próximo à praça principal da cidade, foi abordado pela dupla de policiais, que chegaram de arma em punho. “Eu fiquei com muito medo, pois em 20 anos no serviço público, nunca havia passado por tal constrangimento”, afirmou.
Segundo o soldado, eles foram atender à solicitação de um funcionário do banco porque o servidor era estranho na cidade e estava próximo a um estabelecimento comercial que foi assaltado recentemente. “Mas chegamos com a arma apontada para o chão”, disse o policial, justificando que faz esse tipo de abordagem porque precisa defender sua própria vida e proteger sua família.
A explicação irritou o presidente da comissão, deputado Durval Ângelo (PT). O parlamentar lembrou que o juramento dos policiais militares é proteger o cidadão, e não, primeiramente, a sua família.
O advogado Cláudio Henrique Caldeira afirmou que chegou a ser preso e humilhado pelo cabo Rogério Mendes em setembro passado, ao visitar a cidade para o casamento de um amigo. Ele contou que, pouco antes de retornar a Belo Horizonte, resolveu passear na praça com suas duas filhas gêmeas de 4 anos, enquanto a esposa, Lílian, manobrava o carro. Ela estacionou o veículo na mão contrária à da rua e teria sido imediatamente abordada pelos dois policiais, que apontaram a arma para ela. “Era uma arma de grosso calibre”, denunciou.
Cláudio Caldeira disse o problema se agravou quando ele tentou convencer o policial de que poderia abaixar a arma porque não eram marginais. “Quando eu disse que era advogado, ele explodiu e passou a me destratar descontroladamente”. O cabo acabou algemando o advogado e levando-o para a delegacia de Curvelo, onde, segundo Cláudio, teria dito que tem prazer de registrar ocorrência contra advogado.
Outras denúncias apresentadas
O universitário Matheus Víctor Fernandes, filho de um ex-vereador de Felixlândia, também reclamou da truculência da dupla de policiais. Ele reclamou que foi tratado com violência no dia 25 de outubro, véspera da prova do Enem, quando ouvia música no carro, num bar na praça da cidade.
O estudante contou que primeiramente os policiais solicitaram que abaixassem o som, mas que quando foram entrar no carro para ir embora, o cabo Mendes bateu no carro do vidro com um fuzil para impedir que saíssem, sob alegação de que teriam bebido. “Outros colegas meus estavam bebendo, mas eu não, pois ia fazer prova no dia seguinte”, alegou.
Matheus disse que tentou ligar para o irmão no celular, mas o policial tomou o aparelho e o jogou no chão. Ele reclamou que foi chutado e revistado bruscamente, e ao reclamar sobre o abuso de autoridade, foi algemado, preso e levado à cela da delegacia de Curvelo por mais ou menos uma hora. Disse ainda que foi reconhecido pelo cabo, que teria dito que não faz trabalho corrupto como os políticos da cidade. Um colega teria filmado a ação, mas também teve o celular tomado pelo policial e ainda não o recuperou.
O soldado Almeida retrucou que o estudante ficou nervoso e teria tentado se impor à dupla policial, dizendo que eles não sabiam com quem estava mexendo. “Aí demos voz de prisão pelo desacato”, justificou.
Ao longo da audiência, vários outros moradores apresentaram denúncias de truculência contra os dois policiais. Uma delas foi apresentada pelo menor R.F.A, de 15 anos que mostrou marcas no corpo que teriam sido produzidas pelos dois policiais.
O menino disse que ambos estiveram em sua casa dizendo que ele ameaçava o filho do soldado e o espancaram, ameaçaram de morte, algemaram e levaram para a delegacia. De acordo com o menor, os dois sempre o ameaçam. “Eles já fizeram de tudo; já destravaram arma na minha cabeça, me enforcaram e sempre falam que vão me matar”, disse. O depoimento gerou indignação na plateia.
O soldado justificou que o adolescente e outros dois colegas maiores de idade estavam sondando a rotina de seu filho de 7 meses e ele teria feito a abordagem para saber o porquê. Afirmou que o menor é traficante, assim como seus dois irmãos que já estão presos.
Furto de verduras – Outro caso que provocou a ira do presidente da comissão foi apresentado pelo agricultor Valdir José de Lima, que foi acusado de furtar verduras de uma conhecida, de quem tinha aproveitado uma carona até Curvelo. Mesmo sob a negativa do agricultor, ele foi preso pela dupla, ao lado de sua esposa Rosilene e do filho de 2 anos.
Valdir disse que estava na rodoviária da cidade para voltar a Ibiriçu, localidade rural onde vive, quando foi abordado pelos policiais, também armados. “Foi muito vergonhoso, perto de todo mundo. Meu filho até hoje tem medo quando vê algum policial armado”. Na delegacia, tiveram a informação de que a denunciante, Preta Borba, havia esquecido suas verduras no próprio sacolão.
O deputado Durval Ângelo ficou ainda mais indignado quando o tenente Paulo César das Neves Costa, comandante do pelotão da cidade, tentou justificar a ação, alegando que eles estavam atendendo a uma denúncia de furto. “Colocar a arma na cabeça de dois agricultores por suspeita de roubar abóbora e pepino é intolerável”, respondeu o parlamentar.
Oficiais tentam justificar abordagens dos policiais
O comandante do 42º Batalhão de Polícia Militar em Curvelo, tenente-coronel Enicodemos Lopes do Nascimento, admitiu que a abordagem é uma estratégia estimulada pelo próprio comando. Ele explicou que somente no momento da abordagem o policial poderá saber se o suspeito é ou não um infrator. “O infrator não traz estampada sua intenção”, afirmou.
Ele também justificou o uso da arma, como uma forma de o policial se proteger durante a ação. “Ele (o policial) preserva a vida do cidadão em primeiro lugar; a dele próprio, em segundo; e a do infrator, em terceiro. Porque se ele não preserva a própria vida, pode ser morto”, afirmou.
Segundo o oficial, em função desta estratégia, a PM tem conseguido manter os índices de crimes na cidade em níveis toleráveis. Ele defendeu que o instrumento é eficaz e que o mais importante é reconhecer o poder que o policial tem de intervir contra um cidadão e até de tirar sua vida, em prol da coletividade. “Para se ter uma sociedade de paz, é preciso uma polícia forte”. Mas terminou por assegurar que se for detectado excesso, haverá apuração.
Providências - Diante da postura dos policiais, o deputado Durval Ângelo afirmou que irá pessoalmente ao governador Antonio Anastasia e ao secretário de Estado de Defesa Social, Rômulo Ferraz, para solicitar que uma equipe da Corregedoria da PM visite a cidade para apurar os casos apresentados. “Estou vendo que o problema não é só do cabo Mendes e do soldado Almeida; o problema é de todo o comando da cidade”, criticou.
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