PROPINA OFERECIDA
A 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região mandou reintegrar um policial rodoviário federal demitido em setembro de 2003, após denúncia de que sugeriu propina para não lavrar auto-de-infração. Com a decisão, a União de terá de pagar seus salários desde a data da demissão até a do retorno ao trabalho, devidamente corrigidos monetariamente.
A relatora da Apelação e Reexame Necessário, desembargadora federal Maria Lúcia Luz Leiria, manteve na íntegra a sentença que absolveu o policial no primeiro grau, por reconhecer as inconsistências do depoimento do acusador — filho de um procurador estadual aposentado —, como pela falta de acareação, como determina a Lei 8.112/90. Assim, não foi possível verificar com precisão como se passaram os fatos.
O diálogo teria se dado nos seguintes termos, segundo excerto do depoimento do acusador, que consta num dos processos que autor teve de responder em juízo: ‘‘Perguntei: ‘o senhor quer dinheiro?’; ele disse: ‘é o senhor que está dizendo isso’. A partir desse momento, entendi que ele estaria solicitando vantagem a fim de resolvermos a situação; perguntei se ele queria R$ 50, mas ele reafirmou que a multa seria de R$ 514 mais a apreensão da carteira; então, eu o indaguei se R$ 100 seriam suficientes; não tenho bem certeza, mas me lembro da quantia de R$ 120 como aquela que teria sido acordada para que a multa não fosse lavrada’’.
Nos dois graus de jurisdição, embora o veredito desfavorável no Processo Administrativo-Disciplinar (PAD), ficou claro que a União não conseguiu demonstrar a corrupção passiva, a improbidade administrativa e, tampouco, os motivos para aplicar a pena de demissão. Afinal, não houve certeza de que o policial valeu-se do cargo para tirar proveito pessoal, em detrimento da dignidade da função pública, como reza o inciso IX, do artigo 117, da Lei 8.112/90. A decisão da corte foi tomada no dia 7 de janeiro. Ainda cabe recurso.
O caso
O PAD, com base em Representação do procurador aposentado do Estado do Paraná, Rui Pinto, concluiu que o autor solicitou valores para não lavrar o auto-de-infração. A conduta foi reafirmada em depoimento prestado pelo seu filho, Luiz Felipe Pinto, que o acompanhava quando se deu a abordagem. Na ocasião, embora o procurador tenha chamado o policial de ‘‘achacador, sem-vergonha’’, não o encaminhou para lavratura de flagrante.
O juiz Antônio César Bochenek, da Vara Federal de Ponta Grossa (PR), num primeiro momento, disse que o PAD transcorreu dentro das normas exigidas e ofereceu ampla defesa ao contraditório. Observou, entretanto, que não houve acareação entre o filho do procurador — o acusador formal — e o autor, para esclarecer eventuais contradições. E os artigos 155 e 158, parágrafo 2º, da Lei 8.112/90, determinam a acareação, destacou o juiz. É que o acusador foi a única pessoa que presenciou a conversa considerada ilícita.
Para o juiz, também não ficou suficientemente esclarecido se Luiz poderia ter oferecido vantagem ao policial. Nesse caso, o acusador poderia ter sido o autor de uma conduta ilícita e não estaria obrigado a depor como testemunha, nem mesmo se manifestar sobre os fatos que pudessem incriminá-lo, de acordo a sistemática do Código Processo Penal (CPP). ‘‘Nesse sentido, a acareação seria inviável, assim como eventual imposição de pena de demissão subsidiada apenas no depoimento da testemunha Luiz’’, afirmou na sentença.
Bochenek advertiu que a regularidade do PAD não afasta a análise dos fatos pelo Judiciário, de acordo com os princípios e regras constitucionais e do ordenamento jurídico brasileiro. E, perante estas regras, o autor foi inocentado em duas ações ajuizadas contra si: uma ação penal por corrupção passiva e outra Ação Civil Pública por improbidade administrativa.
Em ambas as ações, conforme o juiz, Luiz Felipe assim se pronunciou: ‘‘Esclareço que o policial (...) em nenhum momento, de maneira expressa, exigiu ou solicitou dinheiro para que a multa não fosse lavrada; reafirmo mais uma vez que a conversação se deu na forma já citada’’. Ou seja, em resumo, ele teria apenas "entendido" que o policial estaria solicitando vantagem.
Clique aqui para ler a sentença.
Clique aqui para ler a decisão do TRF-4.
Jomar Martins é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.
Revista Consultor Jurídico
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Seu comentário é sua opinião, que neste blog será respeitada