A falta de transparência e de controle sobre o destino de armas de fogo apreendidas no Estado abre brechas para o comércio ilegal que abastece grupos criminosos, principalmente ligados ao tráfico de drogas. O TEMPO teve acesso, com exclusividade, a ocorrências que revelam a fragilidade do sistema que envolve as polícias Militar e Civil e o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), que deveriam impedir o retorno do armamento às ruas. A suspeita é que até mesmo policiais civis estariam contribuindo para o desvio dos arsenais apreendidos em Betim.
A suspeita surgiu em setembro deste ano, depois que uma pistola que pertencia a um policial militar da cidade – apreendida e entregue à Polícia Civil após uma troca de tiros, em 2010 – foi encontrada por militares com cinco traficantes de Ribeirão das Neves.
Na teoria, a pistola deveria estar sob a custódia da Polícia Civil de Betim, já que, no boletim de ocorrência, consta a entrega do armamento à corporação. Pelo procedimento correto, a arma deveria ser encaminhada para a perícia, na capital, e depois ficaria sob a guarda da Justiça, mas há indícios de que ela foi desviada. A reportagem esteve no Instituto de Criminalística, onde são realizados os exames de balística no Estado, e descobriu que a arma nunca passou pelo local.
Militares de Betim contam que não é a primeira vez que ocorrem extravios. “Isso acontece direto. Há um mês, prendemos um bandido que estava com uma arma ilegal. Fizemos o boletim de ocorrência na delegacia, ele foi liberado, e, no dia seguinte, o prendemos de novo na mesma situação”, conta um militar, que pediu anonimato por medo de represálias.
Já o delegado regional da cidade, Kleyverson Rezende, alega que desconhece qualquer denúncia de desvios de armas. “Eu não estava aqui em 2010. Pode ter acontecido um extravio? Pode. Mas acredito que isso não ocorra mais, pois temos um controle rígido por meio do nosso sistema”, destacou.
Falha. Uma maneira de saber se o que é apreendido chega ao TJMG seria por meio da comparação entre o número de armas recolhidas pela PM e o total recebido pela Justiça. Segundo a Secretaria de Estado de Defesa Social, os militares apreenderam 214 armas em Betim, entre janeiro e agosto passados. Já o tribunal não diz quantas armas recebeu no mesmo período. Em nota, afirma apenas que “não informa o número de armas apreendidas nem local de armazenamento, por questões de segurança”.
Na avaliação do professor Luis Flávio Sapori, coordenador do Centro de Pesquisas de Segurança Pública da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, o controle das informações é frágil e deveria haver prestações de contas à população. “A comunicação entre as instâncias é deficiente, e isso fragiliza o controle. A sociedade não tem noção do que ocorre com esse armamento apreendido. Há um ‘buraco negro’”.
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