Publicado por Wagner Francesco
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Anteriormente rotulados de frios e dissimulados, os chamados psicopatas são alvo de novo estudo que indica que eles não entendem punições. Segundo a pesquisa, liderada pela Universidade de Montreal (Canadá) e realizada com o auxílio de ressonâncias magnéticas, essas pessoas têm anormalidades em partes do cérebro relacionadas à noção de castigo. As anomalias explicariam, segundo os cientistas, maiores taxas de reincidência em crimes e inadequação a programas de reabilitação. A ideia é que as conclusões possam ter utilidade no redesenho das estratégias de reinserção social.
- Muitas pesquisas mostram que os infratores com a síndrome de psicopatia cometem crimes mais violentos e reincidem mais rapidamente depois da saída da prisão que outros criminosos. Em nosso estudo, nós não olhamos para o comportamento, mas para ativações cerebrais. Descobrimos que, entre os criminosos violentos, aqueles com síndrome de psicopatia apresentaram reações cerebrais diferentes dos criminosos violentos sem psicopatia. Assim, o estudo nos ajuda a entender a especificidade desses criminosos - explica Sheilagh Hodgins, professora da Universidade de Montreal e do Instituto Universitário em Saúde Mental de Montreal, acrescentando que um em cada cinco infratores violentos seria psicopata.
Ao todo, 50 homens participaram do estudo: 12 criminosos violentos com transtorno de personalidade antissocial e psicopatia, 20 criminosos violentos com transtorno de personalidade antissocial, mas não psicopatia, e 18 não infratores saudáveis. Os infratores tinham sido condenados por crimes como assassinato, estupro, tentativa de homicídio e lesão corporal grave. Eles foram recrutados para a pesquisa no serviço de reinserção social da Grã-Bretanha.
A partir de experiências, os cientistas encontraram anormalidades estruturais, tanto na massa cinzenta do cérebro quanto na substância branca dos classificados como psicopatas. A matéria cinzenta é envolvida principalmente no processamento de informação e cognição, enquanto a branca coordena o fluxo de informações entre as diferentes partes do cérebro. Foram observadas, nos psicopatas, reduções nos volumes de matéria cinzenta no córtex pré-frontal rostral e nos polos temporais. Essas regiões do cérebro estão envolvidas na empatia, no raciocínio moral e no processamento de emoções sociais como culpa e vergonha. Na substância branca, as anomalias foram identificadas no cíngulo dorsal em uma região associada à falta de empatia. As mesmas áreas estão envolvidas na aprendizagem de recompensas e de punições.
- Criminosos psicopatas são diferentes dos criminosos regulares de muitas maneiras. Criminosos regulares são hipersensíveis a ameaças, irritadiços e agressivos, enquanto que os psicopatas têm uma resposta muito baixa a ameaças, são frios, e sua agressividade é premeditada - afirmou Nigel Blackwood, professor afiliado ao Kings College, de Londres, que também participou da pesquisa. - As evidências estão se acumulando para mostrar que ambos os tipos de infratores apresentam desenvolvimento do cérebro anormal, mas de formas diferentes, desde jovens.
Efeitos negativos descartados
Por meio de um jogo de imagens, os cientistas observaram que os criminosos violentos não mudavam de comportamento quando eram apresentados a sugestões de punições. Os cientistas explicam que o processo de decisão envolve a geração de uma lista de possíveis ações, pesando as consequências positivas e negativas de cada uma delas e a escolha do comportamento que possivelmente conduzirá a um bom resultado. Os psicopatas, no entanto, considerariam apenas os efeitos positivos de suas ações, sem levar em conta os negativos. Dessa forma, muitas vezes suas atitudes os levam à punição em vez de à recompensa que esperavam. O estudo relaciona tal atitude ao fato de alguns jovens persistirem em comportamentos violentos, ainda que sejam castigados por pais e professores durante a infância e até encarcerados na adolescência.
Muitas pesquisas mostram que a maioria das crianças com problemas de conduta se beneficia quando seus pais passam por programas de treinamento que os ensinam a recompensar comportamentos bons e adequados e a não sancionar comportamentos inadequados. No entanto, as evidências sugerem que o subgrupo de crianças com problemas de conduta que adicionalmente apresentam insensibilidade talvez não se beneficie de competências parentais ideais. Atualmente, muitas pesquisas estão em curso para identificar um tratamento para essas crianças - adianta Sheilagh.
Para a especialista em Direito Penal e autora de “Pena como retribuição e retaliação: O castigo no cárcere”, Betina Krause, psicopatas não respeitam regras, hierarquia e autoridades. Ela confirma que a reincidência entre criminosos com essas características é muito comum.
Eles não têm a capacidade de sentir culpa, tampouco remorso por seus atos. Se consideram mais espertos e inteligentes que as outras pessoas, que são vistas como meios de obtenção de vantagem. Praticam crimes sem qualquer sentimento de empatia, não reconhecem o sofrimento dos demais e possuem total discernimento, sobre o que é certo e errado, justo e injusto, mas não se importam com as convenções sociais. A reincidência criminal é muito comum, pela sensação de impunidade que ostentam. A pena não os atinge, pois não admitem sua autoridade. Não existe cura para a psicopatia - opina, citando o conhecido serial killer Ted Bundy, que inspirou vários filmes e livros, como um exemplo desse tipo de criminoso.
Professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a psicóloga e socióloga Vanessa Andrade de Barros, discorda. Segundo ela, a definição de psicopata é baseada em modelos de comportamento não aceitos, sem a ponderação de fatores que podem ter levado a um determinado ato, como um crime.
A pessoa é estigmatizada sem que seja considerada toda a sua história ou um problema mental. Cada caso tem suas singularidades, e elas normalmente não são consideradas nos programas de reabilitação - critica a especialista em psicologia jurídica e sociologia clínica. - Mesmo pessoas com problemas mentais podem ser estabilizadas por meio de um tratamento adequado. É muito complicado crer que é possível diagnosticar psicopatas desde a infância. Essas conclusões são perigosas, porque podem levar a ideias de higienização.
Fonte: O Globo
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