Jovens de diferentes Estados ouvidas pelo Terra relataram situações constrangedoras que passaram após utilizarem apps de serviço de táxi. São histórias de assédios, ofensas e até ameaças
Publicado por Fernanda F.
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Por Elisa Feres e Victoria Matsumoto
Não é difícil entender por que os aplicativos de celular se tornaram a primeira opção para quem costuma pegar táxis nas grandes cidades brasileiras. Além de serem mais rápidos e práticos (possibilitam, por exemplo, que o passageiro escolha a forma de pagamento no momento da solicitação), eles transmitem maior sensação de segurança. Ou pelo menos deveriam transmitir. Na última semana, oTerra obteve relatos de passageiras que foram assediadas, ofendidas e ameaçadas por motoristas que conseguiram seus contatos em bancos de dados supostamente sigilosos de duas grandes empresas do ramo.
Um desses casos, relatados por uma empresária de 28 anos de Porto Alegre (RS), aconteceu em outubro do ano passado. Naquele dia, era aniversário de sua filha, motivo pelo qual estava com pressa para voltar para casa. Como não tem carro, decidiu pedir um táxi através do EasyTaxi. O motorista veio rapidamente e o caminho foi bastante tranquilo. A surpresa aconteceu assim que ela chegou ao destino final e entrou em seu apartamento.
“Por que não tem foto tua no seu perfil? É tão bonita”, mandou o taxista, via WhatsApp, a seu celular. Assustada, a gaúcha não respondeu. “Eu sei que tu viu”, afirmou ele, segundos depois. “Gostei de ti” e “te achei sexy” foram alguns dos textos enviados em seguida.
A empresária bloqueou o número do celular do homem, contou o que havia ocorrido a seu namorado e fez um relato em um grupo do Facebook. Ela também pensou em ligar para a empresa e denunciar o caso, mas desistiu. Além de ficar com medo de possíveis represálias, achou que o máximo que a companhia poderia fazer seria demiti-lo – o que não resolveria o problema.
Dias depois, passou por mais um inconveniente com outro taxista cadastrado na EasyTaxi. Após cancelar uma corrida que havia solicitado devido à demora do motorista, recebeu mensagens com reclamações.
“Ele não me xingou nem ‘deu em cima’ de mim, então foi um aborrecimento menor, neste sentido. Só que novamente usou meu número de celular! Não respondi nenhuma das mensagens, mas fiquei preocupada. Eles tinham meu telefone, sabiam onde eu morava”, contou.
Mesmo com estes problemas, ela continua pegando táxis pela cidade – e continua usando o aplicativo para isso. Apesar de tudo, conhece a realidade do transporte público e sabe que esta – completamente inacessível para a maioria da população brasileira – ainda é, infelizmente, a alternativa mais “segura”.
“Estamos muito atrasados no Brasil na questão do machismo. Já morei em outros países em que eu tinha muito mais liberdade para tudo. Podia andar de saia no calor na rua e pegar qualquer tipo de transporte sem preocupação. Hoje ando apenas pelo meu bairro e é só chegar perto da entrada do trem que já começo a me sentir mal”, disse.
Outra jovem de 21 anos relatou à reportagem ter passado por problema semelhante com outro aplicativo do gênero, o 99Taxis. Jornalista de São Paulo, ela contou que solicitou o carro no último mês de dezembro, após sair da festa de final de ano da empresa em que trabalhava.
“Já era tarde, eu não tinha outro jeito de voltar para casa. Entrei no táxi, fui ‘batendo papo’ com o motorista e resolvi inventar uma história para não contar minha vida toda para ele. Ele foi perguntando e não falei nada verdadeiro. Menti que era gaúcha e estava de passagem por São Paulo. Três ou quatro dias depois recebi uma mensagem: ‘e ai, guria, já voltou para Porto Alegre?’”, contou.
A garota também não respondeu, excluiu a conversa e bloqueou o número, o que fez a “investida” do taxista acabar por aí.
“Fiquei meio assustada. Meu número deveria ser sigiloso, apenas para uso da empresa. Nunca dei permissão para usarem meu celular fora das corridas, muito menos para me mandarem mensagens assim. Não aconteceu nada demais, mas poderia ter chegado em outro nível. Eles deveriam ter algum mecanismo no próprio aplicativo para denunciarmos esse tipo de conduta”, completou.
A jornalista, que mora na zona leste da cidade, disse ainda que utiliza táxi somente em casos específicos, mas que seu transporte do diaadia é o público. Segundo ela, quando está a bordo de metrô ou ônibus ou quando caminha pela rua, a preocupação é ainda maior.
“Somos assediadas o tempo inteiro. Sempre me sinto invadida. Não ando por aí para verem como eu estou, ando porque preciso andar. A maioria das mulheres não gosta de receber ‘cantada’, então os homens não podem apostar em uma minoria que pode gostar. Muitos ainda propagam o discurso de que ‘deveríamos agradecer’ por receber ‘elogios’. Se você é homem e não sabe como é passar por essa situação, é melhor não falar nada. Deixa para quem passa por isso todo santo dia”, completou.
Das cantadas às ofensas
O caso de uma estudante paulista de 20 anos é um pouco diferente. Natural do interior do Estado, ela, que vive na capital, costuma usar o EasyTaxi praticamente toda semana – já que, por morar longe da família, tem medo de andar sozinha durante a noite.
Em novembro do ano passado, estava na casa de seu namorado, atrasada para ir trabalhar. Ao fazer a solicitação no aplicativo, percebeu que o motorista demoraria mais que o planejado: o tempo aproximado de chegada, que é mostrado na tela do celular, apenas aumentava ao invés de diminuir. Ela, então, cancelou aquela corrida e chamou outra no app.
“Uns 5 minutos depois, ele me ligou perguntando onde eu estava e eu contei que já havia entrado em outro táxi. Aí começaram os xingamentos. Achei estranho e desliguei, mas ele continuou me mandando mensagens por mais três dias me ofendendo. Chamou de vagabunda, vadia, otária. Disse que me bloquearia no aplicativo e que ia passar meu nome a todos os taxistas da região”, contou.
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