Publicado por João Paulo Morais
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Sabe o que eu achei mais engraçado nessas discussões que rolaram com pessoas se colocando como verdadeiros ~especialistas~ em Indonésia no caso do brasileiro executado por tráfico de drogas? O aplauso à correção e ao cumprimento das leis naquele país. Eu morei na Indonésia, e o pouco que eu sei e aprendi por lá é suficiente para achar essa ideia absurda.
“A Indonésia sim que é um modelo de correção e cumprimento às leis. Lá os criminosos não ficam impunes.” ─ Frase repetida milhares de vezes nos últimos dias por conta do fuzilamento de Marcelo Archer.
É mesmo?
Em uma das minhas entradas no país tive que dar meu telefone para o agente da imigração, que ameaçou retê-lo caso eu não liberasse o número. Vários amigos tiveram bolsas abertas na salinha da imigração. “Ah, brasileiro? Meu filho adora futebol. Vai gostar muito dessa camiseta do Ronaldo”. Pegavam, numa boa, e saíam fora. São muitas as histórias.
A corrupção é tão institucionalizada que, quando tu tá por lá, tu enxerga ela todos os dias. To-dos.
Diversas vezes me aconselharam a sair de casa com uma quantia mais significativa de dinheiro para “caso a polícia encrencar contigo”. E aí tem gente aplaudindo a Indonésia como um país ~que cumpre as leis e mostra como é que é quando alguém não as cumpre~.
Tentei muito sem sucesso expor esse ponto de vista em uma discussão nesse fim de semana. A lei sobreposta à vida dessa forma, sem questionamento, sem crítica, soberana apenas por ser lei acaba legitimando qualquer loucura — desde que seja proveniente de um legislador. “É lei”. Sim, é lei e é ótimo que as leis sejam cumpridas, mas tem tanta coisa ruim que se pode fazer dentro da lei…
Me disseram, também, que “as leis de um país refletem a cultura daquele país e a vontade das pessoas”.
Não sei o que é mais ingênuo: realmente acreditar que as leis refletem a vontade do povo ou crer que elas estão acima do bem e do mal pelo simples fato de serem leis.
Quando eu morava na Malásia, um morador do meu prédio me quis presa. O motivo: um amigo meu me encontrou no saguão. Ele chorava, desesperado, com um problema pessoal. Eu abracei o guri para consolá-lo. Um abraço, e o cara me queria na cadeia. As leis, as interpretações das pessoas, os absurdos.
Que mal eu causei com um abraço? Feri a moral & os bons costumes de uma sociedade majoritariamente muçulmana que acredita que isso possa ser uma afronta social.
Sem falar no fato de que ser homossexual é crime em alguns países e, por isso, se eu sou gay e tenho fascinação pelo Oriente Médio, que eu passe a vida sem conhecê-lo, porque, bueno, gosto de meninas? Você acha que gays devem levar chibatadas pelo fato de serem gays? Não faz nem um pouco de sentido.
Minha intenção aqui é só agregar uma única coisa ao debate: não, a Indonésia não é nenhum tipo de exemplo de correção (e mesmo se fosse, isso não faria com que as leis de lá fossem inabaláveis pelo simples fato de serem leis).
Mulher sendo preparada para um apedrejamento, culpada por “adultério”. Mas tudo bem, não é mesmo? Afinal, é a lei.
Publicado por Ana Becker em Medium
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