Com o advento do Manual de Processos e Procedimentos Administrativos das Instituições Militares do estado de Minas Gerais (MAPPA), paralelamente, injetou-se na seara administrativa da caserna a observância do Direito Constitucional inerente a celeridade processual, sacramentado desde a edição da Emenda Constitucional nº 45, que pontuou no artigo 5º, LXXVIII da Lei Maior o dever administrativo referente à necessária razoabilidade temporal inerente aos processamentos e procedimentos deflagrados em face de acusados em geral, com especial enfoque neste curto teor dissertativo aos militares cá na Terra das Alterosas.
Em real verdade, de fato ocorria antes do vigorante MAPPA uma resistência administrativa militar em acatar os comandos sumulares inscritos nas Súmulas 1 e 3 do TJMMG (Tribunal de Justiça Militar do estado de Minas Gerais), as quais, estabeleciam, e, ainda estabelecem, prazos concretos inarredáveis para que a Administração miliciana concretize a pretensão punitiva administrativa que surge em virtude de fatos típicos transgressionais, ou seja, entre o evento típico transgressor e a ativação corporal da punição que advém daquele desvio funcional apurado deve a administração castrense se referenciar nos prazos abaixo descritos:
-dois anos para as infrações disciplinares que não acarretam exclusão da IME;
-quatro anos para a deserção;
-cinco anos para as demais transgressões que causem exclusão da IME.
Pois bem, ao nosso sentir o fator de a Administração Militar não se atentar à razoabilidade temporal antes da adoção do MAPPA, mesmo quando esta baliza de aprazamento era previamente aportada no artigo 5º, LVXXIII da Carta Magna, conduz-nos ao entendimento da violação administrativa ao discurso também constitucional descrito no artigo 37 magno, o qual aponta como norte administrativo o dever de eficiência com que deve se comportar o Administrador natural, e, indo além e para além, a insistência administrativa militar em não assumir prontamente o evento prescritivo, obrigando por muitas das vezes o militar vitimado por tal despropósito gestor a ingressar nas vias ordinárias judiciais, consubstanciava ilícito administrativo praticado pela Autoridade municiada de Poder Discricionário, tratável pelo artigo 14, II do Código de Ética e Disciplina dos Militares do estado de Minas Gerais, isso porque, as tais Súmulas 1 e 3 são dotadas de base legal suficiente a embalar a desídia impulsionada por descumprimento de norma, no caso, a Lei Estadual n. 869/52 a qual é alicerce da Súmula 1 do TJMMG.
Como dito alhures, atualmente, a própria Administração Militar assumindo postura mais adequada às disposições constitucionais apontadas acima neste resumo literário editou o MAPPA com previsão do fenômeno prescritivo a ser reconhecido ex oficio pelas Autoridades municiadas de discricionariedade natural, originando tal inovação revestida de ares de submissão pertinente da seara administrativa ao contexto constitucional emitido pelo legislador ordinário, ao passo que, invariavelmente no âmbito das forças de segurança estaduais são editadas diversas instruções, notas, resoluções que surgem de uma sobrenatural legislatura míope, senão anômala, encampada no seio das organizações militares estaduais, intentada em invasão clara de competência, como era o caso das prescrições de pretensões punitivas administrativas, em que, embora houvesse claro dispositivo legal adequado à espécie, sumulado por Tribunal competente, e, ainda assim, rebelava-se a Administração Pública contra tais disposições e entendimentos, sobretudo, sem tentar em tempo correto e célere sanear as causas intramuros que motivavam as enxurradas prescritivas cotidianamente observadas em tempo recente pretérito.
De nenhuma angulação a independência das instâncias administrativa e judiciária é prestável para justificar aquele entendimento da instância executiva pretérito ao MAPPA de que a prescrição se balizaria em cinco anos para meras transgressões que não acarretavam demissão, em detrimento às Súmulas do ETJMMG (Egrégio Tribunal de Justiça Militar do estado de Minas Gerais), pois que, a previsibilidade administrativa latente de que o Judiciário Especializado anularia tais punições nas vias ordinárias de litigiosidade, caso estimulado para além de sua inércia principiológica, desde que, ultrapassassem os prazos previstos nas Súmulas 1 e 3 do TJMMG, deveria conduzir a Administração Militar ao entendimento de que a insistência em afrontar algo sacramentado no Judiciário significaria violar por correlação os deveres de eficiência administrativa ou de menor onerosidade, já que, flagrantemente um simples aceno petitório ao Judiciário emitido do militar em abstrato que, em tese, fosse coagido administrativamente por negação ao marco prescritivo, deflagraria falibilidade da punição maculada pela tal prescrição temporal, nessa senda, evidentemente há sim um certo grau de interdependência nas instâncias, ao menos no caso de prazos prescricionais objetados nesta ilustração breve.
A inovação do MAPPA em relação às prescrições temporais administrativas surte entendimento no sentido de que em estados dotados de Tribunais de Justiça Militar (há diferencial de entendimento a ser explanado: Tribunais de Justiça Militar estaduais somente estão instalados em três unidades federativas, que são Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul, enquanto que, Justiça Militar coexiste em todos estados do Brasil, ressaltando-se, todavia, a validade do MAPPA somente nas Minas Gerais), realmente a especialidade da jurisdição acaba por sugestionar, senão, orquestrar a Administração Militar em determinados assuntos peculiares à caserna, isso porque, obviamente os Tribunais Militares na sua essência são dotados de militares, ressalvadas as previsões de engajamento de Juízes Civis, e, na segunda hipótese, ainda assim, são estudiosos focalizados nas áreas de sua competência jurisdicional, daí, as Súmulas e diretrizes dos Tribunais Militares prevalecem como dogmas no campo administrativo da caserna, e, prova maior disso são os artigos 508 a 510 e seus respectivos incisos do MAPPA que nitidamente significam a assimilação pela esfera administrativa dos ditames judiciais inscritos nas Súmulas 1 e 3 do TJMMG, senão vejamos a dicção do MAPPA:
Art. 508. A prescrição da pretensão punitiva da Administração Militar regula-se pela natureza da sanção disciplinar aplicada e observará os seguintes prazos:
I – 02 (dois) anos para as transgressões que não acarretam demissão ou reforma disciplinar;
II – 04 (quatro) anos para as sanções disciplinares que acarretam demissão ou reforma disciplinar, decorrente de deserção;
III – 05 (cinco) anos para as sanções disciplinares que acarretam demissão ou reforma disciplinar em consequência dos demais casos previstos no CEDM.
§1º. Independente da data em que, oficialmente, a Administração tome conhecimento da prática da transgressão disciplinar, o processo deverá ser findado e a sanção efetivada nos prazos especificados neste artigo, para surtirem os efeitos legais.
§2º. A instauração do Processo Administrativo Disciplinar (PAD/PADS) decorrente de deserção deverá ocorrer tão logo o militar seja capturado ou se apresente na Unidade.
Art. 509. A contagem do prazo prescricional inicia-se na data do cometimento da transgressão disciplinar e termina com a efetiva ativação da sanção administrativa, salvo nos casos de transgressões permanentes ou residuais a delitos permanentes ou de falsidade.
§1º. A contagem do prazo prescricional para as transgressões permanentes inicia-se na data em que cessar a permanência e nas residuais aos crimes de falsidade, da data em que o fato se tornou conhecido. Considera-se transgressão disciplinar permanente aquela em que o momento consumativo prolonga-se no tempo, ou cuja configuração depende da contínua atividade antijurídica do sujeito ativo, cuja cessação enseja o restabelecimento do bem.
§2º. A contagem do prazo prescricional para a transgressão decorrente de deserção inicia-se na data da instauração do processo administrativo demissionário.
Art. 510. Comprovada a incidência da prescrição da pretensão punitiva, independente da fase em que o processo/procedimento administrativo disciplinar se encontre, a autoridade militar deverá decidir pelo arquivamento dos autos, com fulcro no inciso VII do art. 7º deste manual.
Da simples leitura dos artigos extraídos do manual mineiro de diretrizes procedimentais e processuais administrativos militares acima postados emparelha-se a cognição da influência derramada pelas Súmulas 1 e 3 do TJMMG sobre o MAPPA, ou seja, a tal independência das instâncias administrativa e judicial não ultrapassa a uma análise mais acurada da matéria, pois que, nitidamente a regulação advinda do sistema de freios e contrapesos entre os Poderes tripartidos, outrora, enaltecido por Montesquieu, parece ter maior relevância em justiças especializadas, nas quais, com a veemência própria de uma via judiciária conhecedora com profundidade dos pormenores da Administração Pública, adicionando-se a isso o presumido lastro de conhecimento jurídico militar com que é dotada no caso a Justiça Militar, traz como resultante certeira a tal confrontação de Poderes, por conveniência velada diga-se de passagem, preponderando a ingerência cotidiana dos entendimentos do Poder Judiciário no âmbito da caserna; neste prisma, incontroversa a temática de que o trato das prescrições da pretensão punitiva administrativa prevista no MAPPA é mera releitura daquilo que o TJMMG há tempos regulou e sedimentou pela via sumular.
Doravante na era pós MAPPA, cabe ao administrador natural nas questões temporais prescritivas tão somente o papel de regulador da celeridade apropriada (leia-se razoável) no deslinde de feitos administrativos sob seus cuidados, não havendo margem de discricionariedade para além daqueles prazos previstos no artigo 508 e incisos do MAPPA, e, tal fatoração inovadora dispara no sentido de que, também os militares tem direito de serem processados dentro de um limite de razoabilidade temporal, tal qual, é preconizado no artigo 5º, LXXVIII, da Carta Republicana, assim sendo, há uma instalação dogmática no cerne das forças militares de segurança pública estadual, mormente na acepção de igualdade entre os acusados em geral, e, por generalidade leia-se acusados civis ou militares.
Em suma conclusiva: o simples fato de ser acusado de algo já é uma antecipação de pena ou sanção (ao menos para quem tem brio e honradez pessoal), e, é ultraje ao texto constitucional o prolongamento ad eternum deste quadro de instabilidade de Direito que aflige ao acusado ainda não sentenciado ou apurado administrativamente, daí, os parâmetros estabelecidos no artigo 558 do MAPPA e nas Súmulas 1 e 3 do TJMMG são sinônimo de avanço garantista deflagrado em favor dos militares mineiros, e, qualquer violação a estes dispositivos deverá ser entendido como violação ao artigo 14, II do CEDM, além de afronta ao artigo 324 do CPM, a serem imputados ao impulsionador das violações pautadas.
Vinícius Ganzaroli de Ávila é advogado inscrito na OAB/MG nº 84.861, pós-graduado e portador de especialização em Direito Militar pela UNIDERP, militante em Direito Militar com larga experiência na Justiça Militar e Processos Administrativos Militares, com atuação na PMMG, CBMMG, PMGO, PMBA, PMSP, entre outras forças de segurança pública; contatos no www.vinicius ganzaroli@hotmail.com
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