Revista QAP
Há alguns meses escrevi um artigo que repercutiu num dos maiores portais de conteúdo jurídico do país. Com o título “Ordenamento penal brasileiro: faça o que eu mando, mas não faça o que eu faço!”, tentei trazer à tona o grande problema das penas no Brasil: o Direito Penal erroneamente utilizado como uma possibilidade legítima de fazer justamente aquilo que ele tipifica.
Como assunto polêmico que é, os comentário se dividiram entre a vertente que apoia a ideia de que os Direitos Humanos são para todos e que a restauração e ressocialização deveriam ser a verdadeira função das leis penais e das instituições carcerárias, e a outra que, sem meio termo, acredita que os defensores desses Direitos são insensíveis às ações dos ditos “bandidos” e “vagabundos”, e que bastaria estar cara a cara com um revólver ou ver um filho ou parente ser morto para mudarem de opinião. Santa ignorância!
Para aqueles que desconhecem os princípios mais fundamentais do ordenamento jurídico brasileiro, não há possibilidade de prisão perpétua. Quando um indivíduo é condenado a 100 ou 200 anos de prisão, esse tempo só é verificado quanto a benefícios, e ninguém, segundo o que determina a lei, ficará mais de 30 anos em cumprimento de pena, ou seja, pode ser o crime que for, pode o indivíduo estar muito pior que quando foi inserido na penitenciária: ele, obrigatoriamente, obterá sua liberdade. Agora imaginem essa pessoa, que passa pelo um dos maiores sistemas universitários (do crime) do mundo, de volta às ruas… Seria, de alguma forma, interessante?
Com esse argumento, estaria este autor se posicionando a favor das penas perpétuas? De forma alguma. Seja através da religião, da educação ou do trabalho, todos tem a possibilidade e a capacidade de mudar. Mas não se constrói uma casa a partir do telhado, da mesma forma que incentivar paliativos como as polícias mercenárias que invadem as favelas e as comunidades pobres, e instituições carcerárias utilizadas como o depósito do “lixo humano” nunca irá resolver os nossos problemas. É necessário que o Estado, enquanto ente garantidor da coesão social e dos Direitos individuais e coletivos, trabalhe no sentido da oferta das mesmas condições de desenvolvimento a todos, desde o nascimento, até o fim da vida, não entregando o peixe, mas promovendo a equivalência do acesso ao mar e às ferramentas de pescar.
Mesmo num Estado ideal que oferecesse essas oportunidades, poderiam haver situações em que fosse necessária intervenção de um Direito Penal? Com toda a certeza. Porém, isolar os indivíduos durante certo tempo e devolvê-lo ao convívio social totalmente transtornado e estimulado à prática de novos delitos não é a melhor das saídas. Deve-se oferecer, intensivamente, o estímulo à reabilitação e a promoção de uma reintegração pacífica e eficaz. Agora é a hora de os críticos de plantão classificarem nosso desejo como um conto de fadas. Pode até ser, mas a historinha que nós nos baseamos é, principalmente, o texto da Constituição, dos Códigos, da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que nós, através de nossos representantes, escrevemos ou julgamos pertinentes de adoção.
Quanto às vítimas dos delitos que acompanhamos no diaadia, nos sensibilizamos e muito, afinal, poucas são as vezes que quem promove ações concretas e que se dispõe a sair da zona de conforto da crítica pela crítica e ir a campo tentar mudar o mínimo que for não são defensores dos Direitos Humanos. E não me venham falar de protestos políticos, afinal querer de volta a ditadura é a mais terrível ignorância que já presenciei em minha vida.
É necessário que ações concretas sejam promovidas para tentar qualquer mudança. Não sou defensor de “bandidos”, sou defensor do ser humano, que, como tal, tem direitos e possibilidades inexploradas de mudança. Remédios paliativos não curam doenças. Tratamentos, sim!
Autor: Antônio Gabriel Oliveira
Diretor de Jornalismo da MBA Comunicações, acadêmico do curso de Direito da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Servidor Efetivo da Prefeitura Municipal de Vitória da Conquista e militante dos Direitos Humanos
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