Em delação, suposto operador de esquema diz que empresas beneficiadas pelo BNDES deram dinheiro ao governador
POR JAILTON DE CARVALHO
BRASÍLIA — A situação do governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT), delicada desde que ele foi denunciado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, pode se complicar ainda mais com os novos desdobramentos da Operação Acrônimo, da Polícia Federal. Depois de uma arrastada negociação, o empresário Benedito Rodrigues de Oliveira Neto, o Bené, amigo e suposto operador do governador, fechou acordo de delação premiada com a Procuradoria-Geral da República e acusou Pimentel de receber propina de empresas beneficiadas com financiamentos do BNDES.
Num dos depoimentos da delação, Bené afirmou que só da Caoa, representante da Hyundai no Brasil, Pimentel teria sido destinatário de mais de R$ 10 milhões, segundo disse ao GLOBO uma fonte que conhece o caso de perto. Em linhas gerais, o empresário confirmou o conteúdo da denúncia formulada pela vice-procuradora-geral da República Ela Wiecko contra Pimentel, Bené e os dois principais executivos da Caoa, Carlos Alberto de Oliveira Andrade e Antônio dos Santos Maciel Neto, entre outros, no último dia 6, ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Bené ainda apontou irregularidades em negócios financiados pelo BNDES na Argentina e em Moçambique e que teria Pimentel entre os possíveis beneficiários. Na denúncia apresentada ao STJ a partir de um relatório da PF, Ela Wiecko acusa Pimentel de receber R$ 2 milhões em propina de Andrade e Maciel. O dinheiro teria chegado ao governador depois de passar pela Bridge e a Bro, duas empresas de Bené. A transação teria sido camuflada num contrato fictício de consultoria firmado entre Bené e os executivos da Caoa.
Na denúncia, Ela Wiecko sustenta que, no mesmo período do pagamento da suposta propina, a Caoa recebeu cerca de R$ 600 milhões em benefícios fiscais do Programa de Incentivo à Inovação Tecnológica e Adensamento da Cadeia Produtiva de Veículos Automotores (Inovar), do Ministério do Desenvolvimento. As vantagens tributárias estavam vinculadas a uma planta industrial da Caoa em Anápolis, Goiás. Confrontado com as acusações, Bené confirmou o conteúdo da denúncia e acrescentou novos detalhes.
Pelas contas do empresário, os desembolsos da Caoa em troca de benefícios fiscais foram superiores a R$ 10 milhões. Investigadores querem saber o destino do dinheiro. Bené também confirmou a acusação da vice-procuradora de que a consultoria que ele teria fornecido à Caoa era “fajuta”. As declarações de Bené podem deixar em apuros Andrade e Maciel. Quando o caso veio à tona, a defesa dos dois alegou que a consultoria era real e que até teria sido usada na Inglaterra.
BENÉ ATUOU NA CAMPANHA
As acusações de Bené são consideradas consistentes por investigadores. O empresário e o governador são amigos de longa data. Bené atuou na campanha de Pimentel ao governo de Minas em 2014 mesmo tendo sido um dos pivôs da crise que quase leva à derrota a presidente afastada Dilma Rousseff na campanha de 2010. O governador ignorou a ficha do empresário, pontuada por denúncias de desvio de dinheiro na Esplanada dos Ministério, e o manteve como um dos colaborares de sua última campanha.
As revelações do operador devem aumentar a pressão sobre Pimentel. Caberá ao ministro Herman Benjamin, relator da Operação Acrônimo no STJ, decidir se acolhe ou não a denúncia. No entendimento de setores do Ministério Público Federal, o relator pode acolher a denúncia por conta própria. Para o advogado Eugênio Pacelli, responsável pela defesa do governador, antes de deliberar sobre a denúncia, Benjamin precisa de autorização prévia da Assembleia Legislativa de Minas.
Pacelli sustenta que jurisprudência sobre o assunto foi firmada a partir do habeas corpus 80.511, relatado pelo ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, em favor do ex-governador de Minas Itamar Franco, já morto. Também ameaçado de afastamento, Itamar recorreu ao STF e se manteve no cargo. Pacelli entrou com um agravo de instrumento para que Benjamin nem mesmo notifique Pimentel sobre a denúncia antes de consulta à Assembleia. Com ponto de vista diferente sobre o assunto, o ministro teria expedido a intimação na sexta-feira.
Pacelli disse que desconhece a delação de Bené e nega que o governador tenha recebido dinheiro de empresas ou cometido qualquer irregularidade no período em que foi ministro do Desenvolvimento. Segundo ele, os benefícios concedidos à Caoa estão previstos em lei e a empresa não teria nenhum motivo para pagar propina. Ele argumenta que outras empresas, que preenchiam os requisitos legais, também receberam benefícios similares.
— Se ele (Benedito) falou isso (sobre pagamento de propina) falou o que o Ministério Público mandou ele falar. Não houve propina — afirmou.
O advogado criticou os métodos usados pelo MP para obter delação. Para ele, pessoas presas são capazes de dizer qualquer coisa para recuperarem a liberdade. O advogado José Roberto Batochio, responsável pela defesa de Andrade e Maciel, também criticou a delação. Para ele, delações viraram moeda de troca. O advogado negou que os executivos da Caoa tenham oferecido vantagens para Bené ou para Pimentel. Ele sustenta que Bené prestou consultoria à montadora.
— A consultoria era verdadeira. Não foi ninguém que a levou para os autos senão a própria Polícia Federal — disse.
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