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quarta-feira, 18 de maio de 2016

"Estamos caminhando para um Estado policial"


Entrevista – Marcelo Neves


Jurista afirma que, com Alexandre de Moraes no Ministério da Justiça, repressão deve ganhar força no governo Michel Temer
por Débora Melo — publicado 18/05/2016 04h36, última modificação 18/05/2016 05h47
Roberto Stuckert Filho/PR
Marcelo-Neves
Marcelo Neves: jurista foi um dos vários que fez parecer contrário ao pedido de impeachment
"Eu não diria que foram manifestações. Foram atos que não configuram uma manifestação porque não tinham nada a pleitear. Eles agiram como atos de guerrilha." Desta forma o então secretário da Segurança Pública de São Paulo, Alexandre de Moraes, reagiu aos protestos contra o impeachment de Dilma Rousseff, que no dia 10 de maio bloquearam vias importantes de São Paulo.
Na segunda-feira 16, recém-empossado ministro da Justiça e Cidadania do governo dopresidente interino Michel Temer (PMDB), Moraes disse à Folha de S.Paulo que nenhum direito é "absoluto". Com a mudança de governo, a pasta da Justiça passou a incorporar as atribuições do Ministério das Mulheres, Igualdade Racial, Juventude e Direitos Humanos.
Em entrevista a CartaCapital, o jurista Marcelo Neves, professor titular de Direito Público da Universidade de Brasília e doutor em Direito pela Universidade de Bremen (Alemanha), afirma que a fusão das pastas e a nomeação de Moraes indicam que os setores ligados às minorias e aos direitos serão fragilizados, ao passo que a repressão policial deve ganhar força.
Leia a entrevista:
CartaCapital: O que podemos esperar do Ministério da Justiça de Alexandre de Moraes?
Marcelo Neves: Se nós considerarmos os antecedentes, o passado dele, vemos que ele está mais ligado à postura da repressão. Repressão aos estudantes, aos movimentos sociais. A perspectiva, portanto, é que o foco nos direitos e na cidadania se perca, se enfraqueça, enquanto a dimensão mais repressiva e policial do Ministério da Justiça deve ganhar significado.
CC: Moraes disse à imprensa que os protestos contra o impeachment foram “atos de guerrilha” e que nenhum direito é absoluto, incluindo o direito à manifestação...
MN: Essas declarações indicam exatamente que estamos caminhando para um Estado policial. Para criar este Estado policial, não há melhor ministro que o Alexandre de Moraes. Ele é o mais adequado.
As garantias e os direitos dos cidadãos, principalmente das camadas mais pobres, das camadas subalternas e dos movimentos sociais, serão restringidos, serão alvo de fortes ataques e ofensas. Essa ideia de que o movimento social se confunde com guerrilha é muito perigosa, beira a posturas fascistas.
CC: Faz sentido incorporar as pastas das mulheres, da igualdade racial e dos diretos humanos ao Ministério da Justiça? Qual a consequência dessa fusão?
MN: A ideia de que a máquina estatal será reduzida ao reduzir o número de ministérios é totalmente falsa. Essa fusão vai, na verdade, fragilizar aqueles setores que são ligados às minorias, ligados aos direitos e, dessa maneira, torná-los secundários.
CC: O senhor tem alguma opinião a respeito da obra e do trabalho de Alexandre de Moraes, como constitucionalista e como advogado?
MN: O Ministério da Justiça não é indicado para um advogado que defendeu cooperativas suspeitas de realizarem lavagem de dinheiro para o PCC. É um advogado problemático para assumir a pasta. Não que os criminosos não tenham direito a defesa, mas, para a pasta da Justiça, ele não é adequado.
Como professor, ele é um professor mais superficial. Ele escreve livros para concurso, para o típico concurso brasileiro, que está dando errado. Os concursos brasileiros são de ‘decoreba’, não levam juízes e procuradores a refletir. Nós estamos criando uma geração de juízes e promotores totalmente alienados, sem capacidade reflexiva sobre os problemas jurídicos. Então esse tipo de manual para concurso é superficial, prejudica a formação daqueles que seguem as carreiras jurídicas.
Alexandre
Alexandre de Moraes já classificou protestos como 'guerrilha' (Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil)
CC: Ele também defendeu o Eduardo Cunha em uma ação.
MN: O advogado pode defender criminosos, e os criminosos merecem defesa, mas isso não quer dizer que ele pode se legitimar para um cargo político dessa dimensão. Não é adequado que o advogado de uma pessoa que está envolvida em vários escândalos de corrupção e que está fora do exercício por decisão do Supremo seja o ministro da Justiça. Não tem sentido, é totalmente inadequada e inoportuna essa escolha.
CC: O senhor acha que o Supremo ainda vai ser chamado no processo de impeachment?
MN: Eu acho que o Supremo pode ser chamado, mas, como tem tido uma postura muito parcial, a Corte tenderá a admitir tudo que for feito para a manutenção do impeachment. O Supremo já demonstrou que está perdido neste processo e que não está atuando corretamente. Seja pelas declarações e prejulgamentos, especialmente do ministro Gilmar Mendes, mas também de ministros como Celso de Mello.
No caso do Gilmar, as práticas são as mais diversas, terminando por dizer que o governo poderia ir "para o céu, o papa ou o diabo", que não ia resolver. O Celso de Mello legitimou os vazamentos ilegais quando respondeu que o STF não estava "acovardado".
Isso fere a questão das normas de suspeição. É muito grave essa situação de prejulgamento, de manifestações antecipadas. Se um juiz qualquer fizesse isso no plano municipal ou estadual, em relação a prefeitos e governadores, um juiz que não fosse graúdo seria com certeza punido.
É triste ver essa postura do Supremo, que mostra parcialidade e, em alguns momentos, posturas inexplicáveis, como a morosidade da decisão sobre Cunha, tomada depois que toda a obra conduzida por ele já tinha sido feita. Com isso vem o reconhecimento de que ele não teria condições de estar na presidência da Câmara, nem sequer como deputado. Isso mostra certas incoerências, mostra que o Supremo está perdido em incoerências.
CC: Estar perdido é um ato involuntário?
MN: É, em parte, voluntário. O Judiciário, especialmente o Supremo, está muitas vezes mais preocupado em dar uma resposta à grande mídia do que decidir, em termos jurídicos, temas relevantes.
CC: A fala do Lula sobre o STF “acovardado” pode ter influenciado ainda mais o comportamento dos ministros?
MN: É muito natural que, em conversas privadas, se fale algo que não deve ser posto publicamente. Isso não é crime. Isso é uma conversa privada que não deveria ser divulgada porque é irrelevante para a dimensão de qualquer elemento criminal.
A resposta [dada pelo ministro Celso de Mello] fortificou essa postura do Supremo por um tipo de corporativismo, por um tipo de vaidade injustificada pela qual os ministros estão tomados. Então isso realmente o tornou não só acovardado, mas capturado pelo projeto golpista. O Supremo está totalmente capturado pelo projeto golpista.
CC: O senhor defende algum tipo de punição para o juiz Sergio Moro por conta do episódio dos grampos?
MN: Sim, ele praticou um crime. Ele está enquadrado no artigo 325 do Código Penal e também no artigo 17 da resolução 59 do CNJ. Essa resolução foi aprovada na época do ministro Gilmar Mendes, que no CNJ atuou bem, foi um bom presidente.
O delegado Protógenes Queiroz foi condenado pelo artigo 325 exatamente por divulgar material sigiloso. A operação Satiagraha foi anulada por muito menos. Mas agora existem dois pesos e duas medidas. Esse juiz, no meu entender, praticou crime.
CC: Qual deve ser o futuro da Operação Lava Jato?
MN: Eu diria que existe uma probabilidade grande de que agora haja um controle da Polícia Federal e uma maior pressão sobre o Ministério Público para que todas essas operaçõessejam enfraquecidas.
Se elas forem ampliadas, elas tendem a encontrar muitos desses envolvidos com o governo. Então a tendência é que se retorne ao modelo de Fernando Henrique Cardoso na busca do engavetamento de casos, na busca de uma Polícia Federal obediente. Eles dizem que não, mas o potencial é muito grande. Temer e vários dos seus importantes ministrospodem ser alcançados e punidos, então é evidente que eles fiquem mais suscetíveis a criar barreiras para a operação.

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