A crise institucional iniciada pela aprovação da Proposta de Emenda à
Constituição (PEC) 33/2011, que dá ao Legislativo a palavra final sobre
as decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), se agravou ontem e, após
declarações fortes de integrantes dos Três Poderes, levou o presidente
da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), a suspender a tramitação do
projeto. Ontem, após reunião, Henrique Alves e o presidente do Senado,
Renan Calheiros (PMDB-AL), elevaram o tom e admitiram haver uma crise
entre o Legislativo e o Judiciário. Renan e Henrique chamaram de
“invasão” do STF no Congresso a decisão do ministro Gilmar Mendes de
suspender a tramitação do projeto que dificulta a criação de partidos.
Renan e Henrique entraram com um agravo regimental no Supremo contra a
liminar do ministro.
Com a reação imediata e negativa de várias instâncias da República em
relação à aprovação da PEC 33 na Comissão de Constituição e Justiça
(CCJ) da Câmara, Henrique Alves anunciou que, “enquanto não tiver uma
definição muito clara” sobre o assunto, está suspensa a criação da
comissão especial que analisaria a proposta. O ministro Gilmar Mendes
chegou a dizer que, se a medida for aprovada pelo Legislativo, será
melhor “fechar” a Suprema Corte. “A PEC é inconstitucional do começo ao
fim, de Deus ao último constituinte que assinou a Constituição. Eles
rasgaram a Constituição. Se um dia essa emenda vier a ser aprovada, é
melhor que se feche o Supremo Tribunal Federal”, recriminou.
Em Nova York, pouco antes de embarcar para o Brasil, o presidente do
STF, Joaquim Barbosa, afirmou ontem, por meio de sua assessoria de
imprensa, que uma eventual aprovação da PEC fragilizaria a democracia.
“Tem quase 80 anos a tradição já consolidada de se permitir que o
Supremo Tribunal Federal declare a invalidade jurídica de uma lei votada
pelo Congresso por violação de uma cláusula constitucional. Por que
alterar isso agora, em pleno século 21? Essa medida, se aprovada,
fragilizará a democracia”, criticou.
Apesar da suspensão da tramitação, tanto Henrique quanto Renan
mantiveram a tensão e subiram o tom do discurso. “A separação entre os
Poderes não pode se resumir a uma mera questão emocional”, respondeu,
referindo-se à possível retaliação da decisão de Gilmar Mendes. Os dois
passaram o dia ontem reunidos com outros parlamentares, traçando qual
seria o contra-ataque do Congresso.
“Da mesma forma que nós nunca influenciamos decisões do Judiciário, não
aceitamos que o Judiciário influa nas decisões legislativas. De modo
que consideramos isso uma invasão”, atacou Renan. “É inconcebível que
haja uma tentativa de influir no andamento do processo legislativo”,
completou.
O PSDB e o MD (fusão do PPS com o PMN) protocolaram ontem mandados de
segurança para que o Supremo impeça a tramitação da PEC 33. O autor da
proposta, deputado Nazareno Fonteles (PT-PI), disse que não esperava
tamanha repercussão com a aprovação do texto porque a proposta está
disponível há dois anos, desde que foi protocolada na Casa. Ao negar que
haja uma estratégia de retaliação ao STF após o julgamento do mensalão,
o parlamentar argumenta que, há exatamente um ano, uma PEC semelhante
foi aprovada no mesmo colegiado, também sob a relatoria do deputado
tucano João Campos (GO). “Como pode ser uma retaliação a algo que ainda
nem tinha acontecido (julgamento do mensalão)?” Ele classificou as
críticas como “desonestidade intelectual”.
Fonteles condenou ainda a decisão de Henrique Alves de não instalar a
comissão especial na Câmara para analisar a proposta. “Ele não tem esse
poder. Só tem a obrigação de criar a comissão especial e não pode fazer
um ato contra a CCJ, que já deliberou”, ressaltou. Em nota, o presidente
da CCJ, deputado Décio Lima (PT-SC), afirmou que a polêmica em torno da
aprovação da PEC 33 “não passa de tempestade em um copo d’água”.
Segundo ele, o debate entre os Três Poderes é normal e nenhum assunto é
proibido. O ministro do STF Dias Toffoli também tentou amenizar o debate
acalorado. “O ruim seria se o Congresso e o Judiciário não estivessem
atuando. Por isso, não há crise. O que há são os Poderes funcionando. E
que bom que estejam funcionando. Isso é melhor para a democracia”,
avaliou.
Já o vice-presidente da República, Michel Temer, criticou a aprovação
da PEC 33. “Eu lamento até dizer isso, mas acho que houve uma demasia. A
palavra última há de ser sempre a do Poder Judiciário, especialmente em
matéria de constitucionalidade e vinculação de uma determinada decisão
para os tribunais inferiores”, disse.
Mensaleiros
A participação de deputados condenados no julgamento do mensalão na CCJ
da Câmara — José Genoino (PT-SP) e João Paulo Cunha (PT-SP) — também é
motivo de crítica. O ministro do Supremo Marco Aurélio Mello observou
que nenhum integrante da comissão questionou o teor da PEC 33. “Não
houve discussão a respeito, ninguém levantou o dedo para suscitar uma
dúvida quanto ao objeto da proposta. E é sintomático que na comissão
tenhamos dois réus da Ação Penal 470 (mensalão)”, disse.
O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, alertou que os dois
parlamentares petistas não deveriam sequer estar na Câmara. Ele lembrou
que, no fim do passado, chegou a pedir a prisão de todos os 25
condenados. “Mas esse pedido não foi deferido. Então, essa participação
deles acaba ocorrendo, digamos, em razão disso”, destacou.
Fonte: Correio Braziliense - 26/04/2013
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