"SD BACHAREL"
Ao analisar a Lei Complementar 116/2011 que dispõe sobre a prevenção e a punição do assédio moral na administração pública estadual. Fiquei estarrecido e embasbacado ao ver que a referida lei não poderia se aplicar à classe dos militares. E pude ver que no seu projeto era previsto sim que a mesma seria aplicada aos militares, porém o Governador VETOU parcialmente a lei e esse VETO foi rechaçado pela Assembléia Legislativa de Minas Gerais.
Vejamos o que seria Assédio Moral pela Lei Complementar 116/11 :
Art. 3° Considera-se assédio moral, para os efeitos desta Lei Complementar, a conduta de agente público que tenha por objetivo ou efeito degradar as condições de trabalho de outro agente público, atentar contra seus direitos ou sua dignidade, comprometer sua saúde física ou mental ou seu desenvolvimento profissional.
Como podemos o assédio moral seria um ato praticado por AGENTE PÚBLICO contra outro AGENTE PÚBLICO e seria ocasionado quando esse ato atentasse contra os direitos ou a dignidade do agente e que comprometesse sua saúde física ou mental ou seu desenvolvimento profissional. Não vejo como excluir os militares desse patamar.
Ai me indago... Qual o motivo de essa lei não ser aplicada aos militares do Estado de Minas Gerais ? Os Militares são agente públicos ou não ? A resposta não vem de minha cabeça e trago os dizeres de DI PIETRO e GASPARINI o que seriam agentes públicos.
Di Pietro (2006) agentes políticos; servidores públicos; militares; particulares em colaboração com o Poder Público.
Gasparini (2005) agentes políticos, agentes temporários, agentes de colaboração (por vontade própria, por compulsão e por concordância), servidores governamentais, servidores públicos (estatuários e celetistas) e agentes militares (federal, estadual e distrital).
Se os grandes mestres do Direito Administrativo não diferenciam a classe militar fora de um âmbito de garantias, como que uma lei complementar como essa com visível patamar preconceituoso o faria. Abaixo eu trago o que a lei diz o que são os agentes públicos.
Art. 2° Considera-se agente público, para os efeitos desta Lei Complementar, todo aquele que exerce mandato político, emprego público, cargo público civil ou função pública, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação ou sob amparo de contrato administrativo ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, no âmbito da administração pública.
Eu não consigo deixar de ver onde os militares não se encaixam nessa definição legal. Não consigo ver a motivação do veto em dizer que essa lei não se aplica aos militares.
Todas as garantias e proibições dadas aos militares foram feitas pela própria constituição e o que sair do âmbito constitucional é flagrante abuso contra o ser humano que veste uma farda, é dar tratamento desigual para aqueles que não são desiguais a ninguém. Ser regido por normas e estatutos próprios não significa estar fora de garantias dadas a um agente público. Agente Público é gênero do qual tem-se a espécie Militares, mas nem por isso deixam de ser agente públicos e nem por isso deixam de ser seres humanos dotados de garantias constitucionais.
Eu trago abaixo as razões dos veto dadas pelo senhor governador e também a ratificação pela assembléia legislativa, vejamos as matizes inconstitucionais.
Excelentíssimo Senhor Presidente da Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais,
Por derradeiro, esclareça-se a impropriedade de tratamento homogêneo a ser dispensado aos servidores civis e militares. Isso porque estes estão sob regime constitucional e legal diferenciado, submetidos ao e mesmo organizados segundo rígidos padrões de hierarquia, sustentáculo da caserna, ao passo que aqueles, servidores civis, estão amparados sob o regime jurídico administrativo comum. O regime castrense está a reclamar disciplina específica, que se amolde às disposições disciplinares e penais em vigor. Assim, oponho veto ao art. 12 da Proposição.
Antonio Augusto Junho Anastasia, Governador do Estado.
Abaixo trago a ratificação por parte da assembléia legislativa.
Sobre o tratamento homogêneo a servidores civis e militares, cabe manter o veto tanto porque a Constituição da República, ao separá-los em regimes jurídicos diversos, proíbe que a lei os iguale, quanto porque seria administrativamente contraditório assumir que categorias submetidas a organização, hierarquia, disciplina, direitos, prerrogativas, obrigações e proibições tão diferentes, pudessem ser equiparadas em tema tão caro ao funcionamento da administração como o assédio moral. É acertado, pois, o argumento desenvolvido pelo Governador do Estado, segundo o qual “o regime castrense está a reclamar disciplina específica, que se amolde às disposições disciplinares e penais em vigor”.
É de doer em um coração jurista como o meu tais afirmações, pois os mesmos estão querendo afirmar que há um mundo civil comum e um mundo militar, o que é totalmente falacioso. Na doutrina de MARTINS (1996, p. 33) me amparo para destruir esses dizeres, pois não é porque se tem certos princípios militares que toda uma ordem de direitos nos será tirada e com isso me compactuo com o doutrinador quando o mesmo diz que
A hierarquia e disciplina militares não podem ser avessas às realidades social e política vigentes, de sorte a gerar nos quartéis uma realidade artificial divorciada da vida em sociedade.
Esta condicionante tem um profundo caráter concreto e expressa a importância de se saber que o militar não é um ser fora da sociedade e sim retirado dela própria para que aja como militar, não é um ser que vive à margem da sociedade, mas nela. Segundo FOCAULT (1979) o objetivo central da disciplina é fabricar pessoas prontas para servir ao senhor, isto causa uma grande problemática social e um grande conflito individual confundindo-se o objeto com o humano.
Esqueceu-se o Governador e a Assembléia que as leis regulam atos e não pessoas. Estão retirando direitos de pessoas, não lhes estão dando a devida garantia constitucional de se defenderam de atos contra a moral. Estão fazendo uma ação de Direito Penal do Inimigo de Jakobs ao contrário, onde esta se pune que a pessoa é e estão retirando direitos dos militares pelos que eles são, ou seja, militares, ZAFFARONI E PIERANGELI (2006, p.105) :
"... o certo é que é um direito que reconheça, mas que também respeite a autonomia moral da pessoa, jamais pode penalizar o "SER" de uma pessoa, mas somente o seu "AGIR", já que o direito é uma ordem reguladora de conduta humana. Não se pode penalizar um homem por ser como escolheu ser, sem que isso violente a sua esfera de autodeterminação.
Não garantir alguns direitos como o de assédio moral para os militares é o mesmo que penalizar o "ser" de uma pessoa, apenas não foi garantido esse direito somente por ser militares em flagrante desrespeito a constituição e aos Princípios da Igualdade e da Dignidade da Pessoa Humana.
Podemos ver no caput do art. 5º da nossa Constituição Federal de 1988 que: "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (...)".
Temos elencado o Princípio da Igualdade, este que tem sede explícita no texto constitucional, sendo também mencionada inclusive no Preâmbulo da Constituição. Deste modo, é norma constitucional, pois estamos diante de um princípio, um direito e uma garantia, para o qual todas as demais normas devem obediência e nela se espelharem (SILVA, 1999), inclusive o Governador e a Assembléia em suas ações de legislar, como o caso aqui em tela.
Para o doutrinador português CANOTILHO (1995, p. 401) haverá igualdade:
O princípio da igualdade é violado quando a desigualdade de tratamento surge como arbitrária. Existe uma violação arbitrária da igualdade jurídica quando a disciplina jurídica não se basear num: (a) fundamento sério; (b) não tiver um sentido legítimo; (c) estabelecer diferenciação jurídica sem um fundamento razoável.
Não houve fundamento razoável, pois apenas foi dito que estamos sobre estatutos próprio e sobre legislação própria, mas esqueceram que isso é pra ser visto no âmbito punitivo e não no âmbito garantista e que dê direitos aos militares.
A igualdade é, portanto, o mais vasto dos princípios constitucionais, não havendo seara onde ela não seja impositiva. Perfilhando este mesmo entendimento, Carmem Lúcia Antunes Rocha, citada por DA SILVA (2011) assim se pronuncia
Igualdade constitucional é mais que uma expressão de Direito; é um modo justo de se viver em sociedade. Por isso é princípio posto como pilar de sustentação e estrela de direção interpretativa das normas jurídicas que compõem o sistema jurídico fundamental.
Além de tudo ofende-se o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, pois o artigo 5º da Declaração Universal de Direitos Humanos estabelece que ninguém deve ser submetido a torturas nem a penas ou tratamento cruéis, desumanos ou degradantes e eu não sei onde um assédio moral não pode ser aqui elencado. O princípio de humanidade é o que dita a inconstitucionalidade de qualquer consequência que crie um impedimento qualquer que seja e aqui em nosso caso seria o assédio moral, como também qualquer consequência jurídica indelével de sua não aplicação aos militares. Entende-se, portanto, que este princípio tem vigência absoluta e que não deve ser violado nos casos concretos, isto é, que deve reger tanto a ação legislativa como a ação judicial o que indicaria o legislador deve ter o cuidado de não violá-lo. PIERANGELI e ZAFFARONI (2006, p. 177) são dois defensores deste principio, sendo que dizem que "Do principio da humanidade deduz-se a proscrição das penas cruéis e de qualquer pena que desconsidere o homem como pessoa". E trazendo pra nosso campo, deve o legislador de se abster em não garantir direitos a todos igualmente.
Fica aqui nosso repúdio em não haver por nosso governador e nossa assembléia a garantia desses direitos aos militares que são pessoas iguais e dignas como qualquer cidadão comum, pois os militares são cidadãos comuns.
Fonte: Blog da Renata
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